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Nuvens estratosféricas polares apareceram nos últimos dias na cidade austral da Argentina de Uhuaia e surpreenderam os moradores | SERVIÇO METEOROLÓGIGO NACIONAL/DIVULGAÇÃO

O Sul da Argentina da Argentina e a Patagônia tiveram um mês de julho muito frio e com marcas nos termômetros em alguns dias perto de 20ºC abaixo de zero, como se observou na cidade de Maquinchao, na província de Rio Negro, onde os termômetros indicaram -19,9ºC. O mês mais ao Sul do continente foi marcado ainda por abundante precipitação de neve, fenômeno que fez a alegria dos turistas e trouxe muito inconvenientes para a população local e os transportes.

Isso em superfície porque no alto da atmosfera estava ainda mais frio no Sul da América do Sul, em latitudes perto do polo, o que resultou em um outro fenômeno que jamais vimos aqui nas latitudes médias do Centro da Argentina, Uruguai, e Centro-Sul do Brasil. Nuvens estratosféricas apareceram na Patagônia.

Nos últimos dias, moradores da província da Terra do Fogo, a mais ao Sul da Argentina, puderam observar a presença de nuvens iridescentes (coloridas) no céu, fenômeno visual muito atraente, mas que contém uma ameaça ao meio ambiente porque afeta a camada de ozônio, o que o Serviço Meteorológico Nacional da Argentina (SMN) descreveu como “perigoso”, embora estas nuvens não causem chuva ácido e tampouco representem risco para as pessoas na superfície.

As condições muito especiais para a sua formação tornam as nuvens nacaradas um fenômeno raro de alta latitude. Escandinávia, Islândia e o Norte do Canadá são os lugares favoritos para vê-las. Avistamentos aqui no Hemisfério Sul são ainda mais raros porque há tão pouca terra ao Sul, exceto a Antártida.

Por isso, imagens deste tipo de nebulosidade são muito comuns em países do Norte europeu e poucos frequentes aqui na América do Sul. Quando aparecem, não deixam de chamar atenção e são um espetáculo no céu. A grande frequência de nebulosidade e tempo instável associada ao cinturão de baixas pressões no entorno da Antártida é outro complicador para a observação destas nuvens.

Nuvens nacaradas em Rio Grande, Terra do Fogo, Argentina, em julho de 2013 | GERARDO CONNON/NASA

Mas não é a primeira vez que elas aparecem ou são registradas. Em 2013, também na segunda metade de julho, nuvens estratosféricas proporcionaram imagens deslumbrantes na Patagônia. Elas foram registradas por Gerardo Connon e publicada em site da NASA. As nuvens foram avistas à época na cidade de Rio Grande, também na província da Terra do Fogo.

Como se formam as nuvens estratosféricas

As nuvens normalmente não se formam na estratosfera devido à sua extrema secura. Durante o inverno em altas latitudes, no entanto, a temperatura estratosférica às vezes se torna baixa o suficiente para promover a formação de nuvens. A aparência colorida dessas nuvens é causada porque elas contêm pequenas partículas de tamanho semelhante, cada uma das quais defracta a luz solar de maneira semelhante.

As nuvens geralmente permanecem totalmente iluminadas por cerca de vinte minutos após o pôr do sol no solo por causa de sua alta altitude, resultando em uma aparência espetacular do céu crepuscular. São melhor visualizadas antes do nascer do sol e após o pôr do sol, quando o Sol está entre cerca de 1° e 6° abaixo do horizonte.

Chamadas de “madrepérola” pelos escandinavos devido à sua aparência iridescente, essas nuvens são compostas por misturas de água natural e ácido nítrico trihidratado (alpha-NAT o a-NAT). As reações químicas que ocorrem na superfície dessas nuvens resultam em uma notável transformação da composição estratosférica.

A tonalidade das cores muda dependendo da altura do sol em relação ao observador. A iridescência se intensifica quando está vários graus abaixo do horizonte, ou seja, ao amanhecer ou ao anoitecer. No caso de nuvens estratosféricas polares compostas de ácido nítrico e água, elas aparecem mais opacas.

As nuvens formadas só por gelo são chamadas de nacaradas. Aquelas que se formam acima do ponto de sublimação do gelo (transição direta da fase sólida para vapor) são o resultado da condensação de ácido nítrico e água. Se estiverem abaixo, serão compostas principalmente de gelo.

O cloro, que é fornecido à estratosfera principalmente de fontes industriais, é convertido de formas relativamente não reativas para outras formas que são altamente reativas com o ozônio. Nuvens estratosféricas polares ocorrem apenas em regiões de alta latitude durante o inverno, ou perto do inverno, quando as temperaturas na estratosfera inferior e média caem abaixo de cerca de -78°C.

Durante o inverno, um vórtice se forma nos polos. Este vórtice é uma massa de ar em forma de coluna ou espiral com rotação ciclônica. Consequentemente, quando esse vórtice se forma, a região fica “isolada”, e concentra ar muito frio em toda a área. Isso favorece a condensação acima da troposfera e permite o desenvolvimento destas nuvens.

Por que as nuvens apareceram?

Para se analisar o porquê de nuvens desta natureza terem aparecido justamente agora é preciso verificar não o que ocorre na atmosfera inferior, na troposfera, região que costumamos trabalhar para a previsão do tempo. É preciso olhar para partes mais altas, onde se formam as nuvens nacaradas (gelo) ou de ácido nítrico.

Os dados são reveladores. Atentem no gráfico acima que mostra a evolução da temperatura no nível de pressão de 10 hPa em 2021 e 2022 entre 65ºS e 90ºS. Observem que neste momento a temperatura em 10 hPa está muito abaixo da média histórica, logo com temperatura em grande altitude que favorecem estas nuvens.

Efeitos no ozônio

A ciência comprovou que as nuvens estratosféricas polares estão associadas à destruição do ozônio. O primeiro grande artigo sobre o tema, intitulado “The Hole Story” e escrito por Gabrielle Walker, apareceu na edição de 25 de março de 2000 da revista New Scientist.

Os cientistas descobriram recentemente que as nuvens estratosféricas polares, há muito conhecidas por desempenhar um papel importante na destruição do ozônio da Antártida, estão ocorrendo com frequência crescente também no Ártico.

Tais nuvens de alta altitude que se formam apenas em temperaturas muito baixas ajudam a destruir o ozônio de duas maneiras: fornecem uma superfície que converte formas benignas de cloro em formas reativas e destruidoras de ozônio e removem compostos de nitrogênio que moderam o impacto destrutivo do cloro.

Nos últimos anos, a atmosfera acima do Ártico tem estado mais fria do que o normal, e as nuvens estratosféricas polares têm durado até meses da primavera. Como resultado, os níveis de ozônio vêm diminuindo. Em 2020, um raro e grande buraco de ozônio se abriu na região do Ártico.