Corpo de Bombeiros e a Defesa Civil de Tubarão realizaram dezenas de resgates de moradores feitos com botes nas ruas da cidade durante a grande enchente no Sul de Santa Catarina na primeira semana de maio. | MAURICIO VIEIRA/SECOM/GOVERNO DE SANTA CATARINA

O outono meteorológico inteiro foi influenciado pelo fenômeno La Niña, no Pacífico Equatorial, e o inverno meteorológico começa com a “Menina” atuando ainda no maior oceano do mundo. De acordo com o último boletim da Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera (NOAA), dos Estados Unidos, o Pacífico Equatorial Central (região Niño 3.4) registrou na última semana anomalia de temperatura da superfície do mar de -1,0ºC, exatamente no limite entre La Niña fraca e moderada.

O Pacífico Equatorial não apresentava anomalias tão negativas durante o outono desde 1999, ou seja, há mais de 20 anos não se tinha um evento de La Niña com tamanha força nesta época do ano. Normalmente, os eventos de La Niña chegam ao fim entre abril e maio, mas em 2022, ao contrário, ao invés de chegar ao fim no outono, a fase fria do Pacífico se intensificou.

Todos os trimestres desde julho a setembro do ano passado apresentaram valores de La Niña no denominado Oceanic Niño Index (ONI), mas a fase fria do Pacífico começou antes. Houve um breve intervalo com valores de neutralidade nos trimestres de maio a julho e junho a agosto de 2021, entretanto os valores trimestrais do ONI foram todos de La Niña entre o trimestre de julho a setembro de 2020 a abril a junho de 2021. Assim, desde o inverno de 2020 predominam no Pacífico Equatorial condições de La Niña.

A última vez em que se observou um período tão longo de fase fria no Pacífico Equatorial foi entre o inverno de 2010 e o outono de 2012. Antes, entre o inverno de 2007 e o outono de 2009. Na virada do século, houve um período muito prolongado de Pacífico frio com La Niña entre o inverno de 1998 e o verão de 2001 que se seguiu ao Super El Niño de 1997/1998.

Mapa de anomalia de temperatura da superfície do mar do começo de junho mostra a “língua” de águas mais frias do que a média clássica de La Niña atuando no Oceano Pacífico Equatorial em prolongado e atípico episódio do fenômeno que se intensificou durante o outono | NOAA

Então, muitos associam La Niña à seca no Sul e chuva no Nordeste, mas o fenômeno não impede de ocorrer chuva extrema e acima da média no Sul do Brasil. O risco de estiagem com La Niña aumenta entre o final da primavera e o começo do outono, mas entre o fim do outono e o começo da primavera o regime de chuva no Sul não é dependente de pancadas isoladas geradas por calor e umidade, como no verão, e atuam muitos sistemas de maior escala como frentes frias e quentes ou centros de baixa pressão (alguns com status de ciclone).

Com isso, ocorrem eventos de chuva extrema no Sul do Brasil e muitas áreas acabam anotando precipitação acima da média mesmo com o clima sendo influenciado pela La Niña. Nos últimos trinta dias, os três estados do Sul sofreram com inundações e enchentes. Milhares ficaram fora de casa por cheia dos rios Quaraí e Ibirapuitã. A Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul está na sua segunda cheia em 30 dias. O Vale do Taquari sofreu com cheia em maio. No começo de maio, Santa Catarina teve três mortes pela chuva e mais de 40 mil pessoas afetadas pela chuva que deixou cidades em emergência. E, agora, no começo de junho o Paraná tem inundações.

Chuva acumulada no Brasil nos últimos 15 dias e 30 dias | INMET

No Rio Grande do Sul, o mês de maio teve volumes muito altos de precipitação em diversos municípios da Metade Norte. Vacaria, Lagoa Vermelha, Soledade, Passo Fundo, Serafina Correa, Bento Gonçalves e Cambará do Sul tiveram em maio o mês mais chuvoso do ano até agora. Os acumulados somaram duas e três vezes a média histórica do mês. Em Vacaria, o volume foi excepcional com mais de 5 vezes o volume normal.

Vacaria em maio teve 427,5 mm (561% da média). Lagoa Vermelha terminou o mês com 380,1 mm ou 354% da normal histórica. Passo Fundo somou 374,2 mm, assim 243% da média de maio. Serafina Correa registrou 315 mm ou 379% da normal histórica de precipitação mensal. Soledade encerrou maio com 297,8 mm ou 194% da média. Bento Gonçalves acumulou 294,8 mm, o que corresponde a 278% da média. Por fim, Cambará do Sul somou 288,4 mm, dado que é 244% da média mensal de chuva de maio.

Em Lagoa Vermelha, por exemplo, o município teve o maio mais chuvoso desde 1931, logo em 91 anos. O acumulado se deu em 16 dias (considerando chuva diária superior a 5 mm). Os maiores volumes diários ocorreram no dia 1° com registro de 80,6 mm, no dia 3 com 75,7 mm e no dia 29 com 67,2 mm. Passo Fundo teve o segundo mês de maio mais chuvoso desde 1961, perdendo apenas para maio de 1992, quando o total mensal foi de 386,7 mm segundo dados oficiais.

Bento Gonçalves igualmente registrou o segundo mês de maio mais chuvoso desde 1961. Em 2017, o total mensal foi de 345 mm.  O total de chuva se distribuiu em 13 dias de precipitação, cujo maior acumulado diário ocorreu no dia 3 com 64,6 mm em 24 horas. Em Soledade, o segundo mais chuvoso desde o começo das medições em 2008. Em 2017, o município registrou 314 mm. Vacaria teve o maio mais chuvoso desde o começo das medições em 2008. Serafina Correa igualmente anotou o maio mais chuvoso desde o início dos registros em 2008.