Uma mulher se refresca mergulhando os pés na fonte da Trafalgar Square, no centro de Londres, nesta segunda-feira, enquanto o país passa por uma onda de calor extrema. A Grã-Bretanha pode atingir 40ºC pela primeira vez com forte impacto em um país despreparado para calor extremo que as autoridades disseram estar colocando vidas em risco. | NIKLAS HALLE’N/AFP/METSUL METEOROLOGIA

O noticiário sobre a onda de calor extremo na Europa, que deixou ao menos mil mortos só na Espanha e Portugal, e que agora castiga Reino Unido e França, gerou alguns comentários com comparações ao calor que faz habitualmente no Brasil. Alguns desinformados como “calor de 40ºC não mata ninguém” ou curiosos como “por que há emergência por 40ºC lá se aqui temos estas temperaturas rotineiramente”.

Ondas de calor, como a que atingiu o Rio Grande do Sul no último mês de janeiro, provocam mortes. A diferença é que não conhecemos os números porque as autoridades de saúde não fazem tais levantamentos, como ocorre em países mais avançados. Somente o município gaúcho de São Borja reportou um excesso de mortalidade por altas temperaturas de 60 pessoas no mês de janeiro. Em nível estadual, as vítimas da onda de calor foram muito superiores.

Temperaturas de 40ºC na França ou Reino Unido são muito piores de serem enfrentadas que no Brasil. Há poucos dados sobre quantas casas na Inglaterra têm unidades de ar condicionado instaladas, mas as melhores estimativas apontam para menos de 5% das casas, de acordo com um relatório de 2021 do Departamento de Energia Empresarial e Estratégia Industrial da Grã-Bretanha. A maior parte do ar condicionado em uso vem de unidades portáteis, com ar central raramente encontrado fora de alguns apartamentos sofisticados em Londres.

Embora alguns dias no verão sejam tipicamente desagradáveis, muitos britânicos dirão que simplesmente não há dias e noites quentes o suficiente no clima geralmente ameno para tornar o ar condicionado um investimento digno. Muitos também consideram desnecessário e prejudicial ao ambiente, com um ventilador virado para a cama considerado ideal por algumas noites por ano.

Além disso, as residências do Reino Unido não foram projetadas para extremos de calor. “Somos um país dominado pelo aquecimento, não um país dominado pelo resfriamento”, disse Tadj Oreszczyn, professor de energia e meio ambiente do Instituto de Energia da Universidade do College London ao jornal New York Times.  “Nós não projetamos nossas casas historicamente para lidar com o superaquecimento. Nós os projetamos para nos mantermos aquecidos”, disse.

Em alguns prédios ingleses mais antigos, os canos que passam pelos corredores que fornecem água quente podem não estar devidamente isolados, disse ele, então o uso de água quente para um banho pode fazer com que o calor se espalhe por todo o apartamento. Se ótimo para os meses frios, ruim durante uma onda de calor.

O ar condicionado é mais comum fora de casa. Cerca de metade da demanda de refrigeração na Inglaterra vem de escritórios, seguidos por lojas e hospitais, de acordo com o relatório do governo. Houve pequeno aumento na demanda nos últimos anos por sistemas de refrigeração em residências, impulsionado em parte pelo aumento do uso de escritórios domésticos durante a pandemia de coronavírus, segundo o relatório.

As temperaturas previstas para esta terça no Reino Unido são 4ºC mais altas que em qualquer dia das décadas de 70 e 80, logo muito mais altas que as máximas de 1976, sempre lembrado pelos ingleses pelo calor. O ano de 1976 está nas estatísticas como o do segundo verão mais quente já registrado na Inglaterra, mas a maior marca daquele verão foi de 35,9°C. Agora, a previsão é de mais de 40ºC.

Nove dos dez dias mais quentes da história do Reino Unido ocorreram desde 1990. O ranking tem 38,7ºC (28/7/2019); 38,5ºC (10/8/2003); 37,8ºC (31/7/2020); 37,1ºC (3/8/1990); 36,7ºC (1/7/2015); 36,7ºC (9/8/2011); 36.6ºC (2/8/1990); 36,5ºC (19/7/2006); 36,4 ºC (7/8/2020); e 36,4ºC (6/8/2003).