Cientistas estão preocupados que o aquecimento acelerado e sem precedentes dos oceanos que se observa em 2023 possa ser um novo normal com graves consequências para a vida marinha e a cadeia alimentar oceânica | OLIVIER MORIN/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Cientistas alertam para graves consequências ambientais em consequência do aquecimento fora do normal que atinge os oceanos do planeta neste momento e que tende a prosseguir com a instalação de um evento de El Niño na segunda metade deste ano que pode atingir o patamar de um Super El Niño.

Dados do Instituto de Mudanças Climáticas da Universidade do Maine mostram que, desde meados de março, a temperatura média da superfície do mar em todo o mundo, entre as latitudes de 60º N e 60º S – tem sido mais alta desde que os satélites começaram a fazer registros em 1981.

Por volta de meados de março, os dados de monitoramento da temperatura oceânica mostram que as temperaturas médias da superfície da água ultrapassaram 21ºC na média planetária, excluindo as águas polares, pela primeira vez desde pelo menos 1981, quando o conjunto de dados teve início. Isso é mais quente do que o que os cientistas observaram nesta época do ano em 2016, quando um muito forte El Niño levou o planeta a registrar grande aquecimento.

Anomalia de temperatura média diária dos oceanos supera a do Super El Niño de 2016 mesmo sem um El Niño ainda presente e que pode piorar o aquecimento nos próximos meses | BERKLEY EARTH

As condições são surpreendentes e alarmantes para alguns meteorologistas e cientistas do clima, embora digam que é muito cedo para assumir que um ano recorde de calor oceânico ou planetário está por vir. Os dados sugerem, pelo menos, que o planeta está entrando em um período esperado de aquecimento acelerado.

As temperaturas atingiram uma média global de 21,1ºC nos primeiros dias de abril. O recorde anterior de 21ºC foi estabelecido em março de 2016. Ambos estão mais de um grau acima da média global entre 1982 e 2011, que gira em torno de 20,4ºC nesta época do ano, de acordo com dados da Universidade do Maine.

O aquecimento acelerado, brusco e em níveis sem precedentes deixou os cientistas do clima estupefatos e muitos até chocados e temerosos do que pode vir. “Isso deixou os cientistas coçando a cabeça. O fato de estar esquentando tanto é verdadeira surpresa e muito preocupante. Pode ser um extremo de curta duração, ou pode ser o começo de algo muito mais sério”, disse Mike Meredith do British Antarctic Survey, do Reino Unido. “Isso está ficando absurdo”, resumiu Robert Rohde da Universidade de Berkeley (Estados Unidos).

Se essas tendências continuarem, o aumento das temperaturas oceânicas pode ter grandes e graves impactos em muitas espécies marinhas em todos os níveis da cadeia alimentar. “Vai afetar muitas formas de vida e especialmente os produtores primários que vivem na superfície, pois dependem da luz solar para fixar o CO2”, disse Thomas Mock, microbiologista marinho da Universidade de East Anglia, no Reino Unido, à revista Newsweek.

“Os produtores primários nos oceanos são principalmente algas de tamanho microscópico. Para fixar eficientemente o CO2 atmosférico, eles precisam de nutrientes. No entanto, se o oceano esquentar, a mistura vertical é reduzida porque uma camada quente basicamente como uma tampa fica sobre topo do oceano. Chamamos isso de estratificação do oceano.

Isso limita o fluxo de nutrientes para onde estão os produtores primários (camadas superficiais). Portanto, a produtividade é potencialmente reduzida, levando a um ciclo de feedback positivo, pois menos CO2 está sendo fixado. É como um ciclo em que dióxido de carbono antropogênico leva ao calor, e isso leva a mais CO2 remanescente na atmosfera por causa da absorção reduzida pelos produtores primários oceânicos.

O aumento das temperaturas oceânicas também pode levar ao branqueamento dos corais, que ocorre quando os corais estressados pelo calor expulsam as algas que vivem dentro deles e fotossintetizam a luz do sol para eles, tornando os corais brancos.

A Grande Barreira de Corais da Austrália sofre com branqueamento “generalizado” por temperaturas acima da média do oceano no Nordeste da Austrália que ameaçam o já em dificuldades patrimônio mundial. | GLENN NICHOLLS/AFP/METSUL METEOROLOGIA

“O calor também induz estresse em organismos marinhos que não conseguem regular a temperatura corporal”, disse Mock. “Essas ondas de calor marinhas se tornam mais comuns. Assim, apenas sobreviverão as espécies que podem lidar com o calor ou que evoluem com rapidez suficiente como micróbios.

A consequência do aumento das temperaturas é a migração em direção aos polos (Ártico e Antártico) de organismos marinhos para fora das zonas de calor oceânico, nos trópicos e nos subtrópicos, se puderem. Já existem evidências disso e de muitos grupos de organismos no oceano e na terra.

As temperaturas oceânicas vêm aumentando desde a década de 1880, de acordo com dados da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA). Esse aumento vem se acelerando nas últimas décadas e agora pode se tornar crítico para a vida marinha em partes do mundo com um El Niño de maior intensidade.