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Aquecimento sem precedentes nos oceanos do planeta causou alarme entre cientistas nas última semanas. A temperatura média dos oceanos atualmente está em níveis jamais vistos na era de observação dos satélites, superando as marcas do Super El Niño de 2015 e 2016, e antes mesmo da instalação de um evento clássico de El Niño mais tarde neste ano.

As temperaturas oceânicas da Terra subiram tão rapidamente nas últimas semanas que um indicador mostra que as águas superficiais já atingiram as temperaturas mais altas já registradas, um sinal preocupante antes de um padrão climático previsto de El Niño que poderia acelerar ainda mais o aquecimento planetário.

Por volta de meados de março, os dados de monitoramento da temperatura oceânica mostram que as temperaturas médias da superfície da água ultrapassaram 21ºC na média planetária, excluindo as águas polares, pela primeira vez desde pelo menos 1981, quando o conjunto de dados teve início. Isso é mais quente do que o que os cientistas observaram nesta época do ano em 2016, quando um muito forte El Niño levou o planeta a registrar grande aquecimento.


As condições são surpreendentes e alarmantes para alguns meteorologistas e cientistas do clima, embora digam que é muito cedo para assumir que um ano recorde de calor oceânico ou planetário está por vir. Os dados sugerem, pelo menos, que o planeta está entrando em um período esperado de aquecimento acelerado.

As observações da temperatura oceânica coincidem com o lançamento de relatório do Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (IPCC), afirmando que uma ação drástica é necessária para retardar o aquecimento global. As temperaturas da Terra estão em uma clara trajetória ascendente, já subindo pelo menos 1,1ºC desde que os humanos começaram a queimar combustíveis fósseis.

As temperaturas atingiram uma média global de 21,1ºC nos primeiros dias de abril. O recorde anterior de 21ºC foi estabelecido em março de 2016. Ambos estão mais de um grau acima da média global entre 1982 e 2011, que gira em torno de 20,4ºC nesta época do ano, de acordo com dados da Universidade do Maine.

Os dados oceânicos se originam de rede de boias, navios e satélites dos quais a Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera dos Estados Unidos (NOAA) coleta dados diários sobre os primeiros metros de profundidade do oceano. O banco de dados – conhecido como NOAA 1/4° Daily Optimum Interpolation Sea Surface Temperature – mostra uma tendência de aquecimento constante na superfície da água do mar desde a década de 1980, com cada um dos últimos anos de classificação de dados bem acima de todos os dados mais antigos.

E mostra que 2023 está a caminho de, pelo menos, ser mais um ano entre os mais quentes já registrados para os oceanos. As temperaturas da superfície do mar podem variar de acordo com o clima, mas em todas as profundidades, os oceanos da Terra estão se aquecendo gradualmente a cada ano, à medida que absorvem cada vez mais o calor do planeta.

“As temperaturas globais da superfície do mar atingiram um território desconhecido nos registros modernos e provavelmente muito mais tempo”, escreveu Mika Rantanen, pesquisador do Instituto Meteorológico Finlandês, na rede social Twitter.

Mas não só pelo Pacífico que aquece rapidamente passa o aquecimento anormal dos oceanos da Terra nas últimas semanas. As águas do Atlântico Norte estão com temperatura nunca antes vistas nesta época do ano no momento.

Os cientistas do clima ainda estão tentando desvendar como o aquecimento dos oceanos alterará o ciclo típico de La Niña e El Niño, mas o consenso atual é que os extremos em ambas as direções se tornarão maiores e mais frequentes. Os principais El Niños e as altas temperaturas da superfície do mar que os acompanham no Pacífico podem se tornar duas vezes mais comuns até o final do século 21, disse Michael McPhaden, oceanógrafo do Laboratório Ambiental Marinho do Pacífico da NOAA, em Seattle. Isso significaria que, em vez de ocorrer aproximadamente a cada 20 anos, os eventos de El Niño podem ocorrer a cada dez anos.

A previsão é que as temperaturas da superfície do mar aumentem ainda mais, pelo menos no Oceano Pacífico, já que os modelos de previsão sugerem uma alta probabilidade de um evento de El Niño a partir da metade do ano e que marcaria o segundo semestre. O El Niño está associado a temperaturas da superfície do mar acima da média no Pacífico equatorial e o evento do fenômeno neste ano pode ser moderado a forte. A projeção do modelo climático norte-americano CFS da NOAA mostra os oceanos do planeta assustadoramente quentes no segundo semestre deste ano, o que traria consequências climáticas de grande impacto no planeta.

O El Niño pode acelerar o aumento constante das temperaturas globais porque as águas quentes do Pacífico se traduzem em aumento da evaporação, o que leva ao aumento da cobertura de nuvens, que impede que a luz solar atinja a superfície da Terra e estimula o aprisionamento do calor na atmosfera. O fenômeno é conhecido por diminuir a formação de furacões no Atlântico, mas por desencadear secas extremas e inundações em outros lugares. No Brasil, agrava-se o risco de seca no Norte e Nordeste e de chuva extrema no Sul.

A recente tendência de aumento da temperatura do oceano é “provavelmente o começo de uma transição para o El Niño da influência relativa de resfriamento de La Niña”, disse Gavin Schmidt, climatologista e diretor do Instituto Goddard de Estudos Espaciais da NASA. A La Niña, que é marcada por águas superficiais equatoriais mais frias do que o normal no Pacífico, persistiu os últimos três anos, mas terminou em fevereiro.

Boyin Huang, um oceanógrafo da NOAA que se concentra na análise da temperatura da superfície do mar, disse que mesmo que o El Niño traga águas mais quentes do Pacífico, outros oceanos podem contrabalançar essa tendência. Isso significa que é muito cedo para tirar conclusões sobre o calor recorde hoje da superfície do mar. Existem outros fatores em outras regiões”, disse Huang.

“Eu não esperaria necessariamente que isso significasse que 2023 será um ano recorde”, disse Schmidt, embora tenha acrescentado que “obviamente estará entre os 10 primeiros” para o calor da superfície do mar. Se um El Niño chegar este ano, como é provável, os cientistas do clima esperam que um recorde em 2024 possa ocorrer.

“Durante o El Niño, uma faixa de oceano que se estende por cerca de 10 mil quilômetros a Oeste da costa do Equador aquece por meses seguidos, normalmente entre 1ºC e 2ºC. Alguns graus podem não parecer muito, mas naquela parte do mundo é mais que suficiente para reorganizar completamente os padrões de vento, chuva e temperatura em todo o planeta”, observa o cientista Dillon Amaya, da NOAA.

Os impactos do aquecimento se sentem no ecossistema marinho. “Por exemplo, alguns peixes aumentam tanto seu metabolismo em águas quentes que queimam energia mais rápido do que podem comer e podem morrer. O bacalhau do Pacífico diminuiu 70% no Golfo do Alasca em resposta a uma onda de calor marinha. Outros impactos incluem branqueamento de corais, proliferação generalizada de algas nocivas, algas dizimadas e aumento do encalhe de mamíferos marinhos”, observa Amaya.

Como as temperaturas da superfície do mar aumentaram nos últimos meses, também aumentou a temperatura média em toda a superfície da Terra. A temperatura média do planeta aumentou de cerca de 0,2ºC acima da média de 1991-2020 em janeiro para cerca de 0,6ºC acima da mesma normal climatológica março. As condições do tempo têm sido especialmente quentes na Ásia, no Leste da América do Norte e na Groenlândia.

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