A chuva não para e atinge volumes extraordinários no litoral do estado de São Paulo. Em menos de 24 horas, os acumulados de precipitação somam mais de 500 mm em alguns pontos e até se aproximam de 700 mm em alguns locais. A área mais atingida por chuva extrema se concentra entre o Guarujá e Bertioga, atingindo praias famosas da região como Juquehy e Barra do Uma.

A chuva até 7h da manhã deste domingo em 24 horas somava 663 mm em Bertioga, 613 mm em São Sebastião, 371 mm no Guarujá, 335 mm em Ubatuba, 334 mm em Ilhabela, 234 mm em Caraguatatuba: 234 mm, 209 mm em Santos, 189 mm em Praia Grande, 178 mm em São Vicente. Um milímetro de chuva equivale a um litro de água por metro quadrado. Os dados são do Centro Nacional de Previsão de Desastres.

Volumes na magnitude de 500 mm ou mais em poucas horas têm potencial de gerar massivos escorregamentos de encostas com partes de morros inteiras vindo abaixo.  Neste patamar de precipitação, nos Estados Unidos, o Serviço Nacional de Meteorologia emite raro alerta de emergência por inundações repentinas, o mais alto da escala de severidade por precipitação, em que adverte para “inundações catastróficas”.

Os volumes de chuva das últimas horas no litoral de São Paulo estão entre os mais altos já vistos no Brasil em curto período e possivelmente entre os mais elevados no mundo em instabilidade não decorrente de ciclone de natureza tropical, fenômeno conhecido por gerar chuva extraordinária.

Os volumes extremos confirmam as projeções dos modelos de alta resolução da MetSul que ao longo da semana que passou indicavam acumulados de precipitação de até 500 mm ou mais na área mais afetada pela chuva, o que levou à emissão de um alerta na sexta de que o fim de semana poderia ter chuva excepcional da região entre a costa e a Serra do Mar.

Na sexta à noite, as projeções dos nossos modelos computadorizados aumentaram a chuva para até 700 mm e em um segundo alerta se advertia para volumes possíveis de até 500 mm a 700 mm, ponderando-se que em se tratando de chuva orográfica (associada ao relevo) não raro acaba chovendo até mais que o indicado pelo modelos numéricos.

Na sequência, no começo da madrugada deste domingo, com a chuva extrema já se registrando, uma terceira advertência da MetSul de que o cenário era excepcionalmente grave e que o quadro deveria piorar ainda mais com mais intensas precipitações.

A chuva extrema ocorre por uma área de baixa pressão no litoral de São Paulo e Sul fluminense, onde também pode chover muito forte em alguns pontos. O cenário é muito pior, entretanto, para o litoral paulista. A tendência é seguir chovendo muito intensamente nas próximas horas, entre a madrugada e a manhã do domingo, em parte do litoral paulista com tendência de gradual diminuição no decorrer do domingo.

Não se tem ainda uma dimensão exata das consequências da chuva por ser domingo muito cedo, mas as primeiras informações e imagens que nos chegam por redes sociais dão conta que a área mais castigada registra inundações catastróficas com água até o telhado das casas e deslizamentos de terra. Precipitação de quase 700 mm, sendo em que alguns locais da região choveu 400 mm em menos de seis horas, é chuva na escala de catastrófica.

Chuva segue neste domingo e ainda deve ser forte

A MetSul Meteorologia alerta que a chuva seguirá forte no decorrer deste domingo no litoral de São Paulo e será localmente forte a torrencial, elevando os volumes ainda mais. Os mapas abaixo mostram a projeção de chuva de três em três horas do modelo meteorológico alemão Icon até o final deste domingo.

Observa-se a tendência de a chuva ser extrema numa área geograficamente muito pequena nas proximidades da Baixada Santista. Até o final do dia persiste a chuva na região e por vezes com muito forte intensidade em alguns pontos. Atente ainda que a área de chuva excessiva quase não se desloca, permanecendo praticamente na mesma região o dia inteiro, o que é excepcionalmente preocupante.

A perspectiva de seguir chovendo e ainda com forte a torrencial intensidade por vezes eleva ainda mais as nossas preocupações com inundações e, sobretudo, com deslizamentos de terra. Mesmo se parasse de chover o risco geológico de deslizamentos seria extremo pelo que já choveu, mas com em persistindo a chuva o cenário é absolutamente crítico para escorregamento de encostas.

A previsão é que nesta segunda a área de baixa pressão evolua para o Sul do Brasil e a chuva tenha uma diminuição maior e até pare por algumas horas no litoral de São Paulo, mas da tarde para a noite vão ocorrer pancadas de verão, algumas localmente fortes, o que com o solo saturado pode levar a novos deslizamentos.

Chuva orográfica traz acumulados extremos

A chuva orográfica que atinge a região é a precipitação induzida pelo relevo. Umidade que vem do oceano, trazida por vento frio que vem do oceano que estã com águas mais quentes do que o normal, movimento do ar gerado por uma massa de ar frio que atua no Sul do Brasil, ao encontrar a barreira do relevo da Serra do Mar, ascende na atmosfera e encontra temperatura mais baixa à medida que ascende na atmosfera com camadas mais frias.

Observe nos mapas como o vento avança do mar para a costa, encontrando a Serra, carregado de umidade. As águas mais aquecidas do que o normal agravam ainda mais o transporte de umidade marítima. A intensa massa de ar frio no Sul do Brasil piora ainda mais a situação com ar frio avançando para a região tropical. Os mapas ainda mostram excessiva água precipitável indo do mar para a costa entre as áreas de Santos e Ilhabela, o que explica a chuva extrema.

Isso leva à condensação e à ocorrência de chuva induzida pelo relevo. Em um exemplo bem didático e simples de entender. O que acontece se você chega na frente de um espelho e soltar ar da sua boca? O espelho que tem uma superfície mais fria vai ficar embaçado (úmido) e molhado. Com a chuva orográfica ocorre o mesmo.

O ar mais úmido e quente (analogia com ar que sai da boca) encontra um obstáculo físico que é o relevo (como o espelho) e ao chegar nesta barreira que são os morros sobe na atmosfera e encontra temperatura mais baixa, condensando-se o vapor de água e formando chuva.

Episódios de chuva orográfica são de alto risco porque costumam trazer acumulados de precipitação localmente muito altos e que não raro até acabam superando as projeções dos modelos numéricos. Os litorais de Santa Catarina, São Paulo e Rio de Janeiro são os de maior risco de eventos de chuva extrema de natureza orográfica no Brasil.