Vulcão Maua Loa entrou em erupção no Havaí depois de 38 anos e interrompeu a coleta de dados das concentrações de dióxido de carbono na atmosfera que são referência mundial para a comunidade científica | USGS

A erupção do Mauna Loa, no Havaí, o maior vulcão ativo do mundo, que se iniciou na segunda-feira, interrompeu o aceso um importante local para a ciência climática que é usado para monitorar as concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera.

“O equipamento de medição de dióxido de carbono que mantém o famoso registro da Curva de Keeling perdeu energia às 18h30 em 28 de novembro e atualmente não está registrando dados”, disse a Universidade da Califórnia no Scripps Institution of Oceanography de San Diego em um comunicado.

O local, selecionado pelo falecido cientista Charles David Keeling como um local ideal para medir o CO2 devido ao seu relativo isolamento e paisagem sem vegetação, registra as concentrações atmosféricas do gás que aquece o planeta desde o final da década de 1950.

A Curva de Keeling, um gráfico que mostra o aumento constante de carbono na atmosfera nas últimas décadas, conforme as medições feitas no observatório de Mauna Loa, é considerada uma evidência científica simples, embora importante, de que as atividades humanas estão transformando o clima da Terra.

“É uma grande erupção e está em um lugar ruim”, disse o filho de Keeling, o geocientista Scripps Ralph Keeling, em um comunicado na terça-feira sobre os fluxos de lava em Mauna Loa, localizado no coração da Ilha Grande do Havaí.

O pesquisador descreveu as perspectivas para futuras leituras de CO2 da estação como “muito preocupantes”. De acordo com o Instituto Scripps, a lava “está fluindo perto do observatório” e que as medições provavelmente seriam encerradas.

Uma porta-voz da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica, que faz medições complementares de CO2 com a Oceanografia do Scripps em Mauna Loa, disse que a lava da erupção cruzou uma estrada de acesso ao observatório e destruiu as linhas de energia do local. Todos os funcionários da NOAA no observatório estão seguros, informou a agência, porém a instalação não é acessível.

As medições atmosféricas de CO2 são mantidas em vários pontos ao redor do globo, do Polo Sul ao Alasca, embora o local em Mauna Loa tenha o registro mais conhecido e contínuo do mundo. Com isso, a comunidade científica não ficará sem dados.

A interrupção atual não é a única vez que as medições no local enfrentaram uma interrupção. O Scripps destacou que houve “momentos ocasionais” em que as medições não estavam disponíveis devido à variabilidade excessiva nas leituras horárias.

Houve também “períodos sustentados sem medições” em 1964, quando cortes orçamentários nas agências federais levaram à suspensão das operações em Mauna Loa por vários meses, disse. E uma erupção anterior no vulcão em 1984 cortou a energia, deixando o observatório sem leituras de 26 de março a 29 de abril daquele ano, quando um gerador chegou e as operações foram retomadas.

As medições em Mauna Loa ao longo dos anos mapearam o profundo impacto das atividades humanas, principalmente a queima de combustíveis fósseis. No verão passado, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas descobriu que o dióxido de carbono na atmosfera aumentou para níveis não vistos em 2 milhões de anos.

Os níveis de CO2 medidos em Mauna Loa

O dióxido de carbono medido no Mauna Loa Atmospheric Baseline Observatory da NOAA atingiu seu pico de concentração neste ano em 421 partes por milhão em maio, levando a nossa atmosfera planetária a um território não visto por milhões de anos, anunciara cientistas da NOAA e Scripps Institution of Oceanography.

Níveis de CO2 são medidos há décadas em Mauna Loa | NOAA

As medições de dióxido de carbono da NOAA no observatório no topo da montanha na Ilha Grande do Havaí tiveram uma média de 420,99 partes por milhão (ppm), um aumento de 1,8 ppm em relação a 2021. Cientistas do Scripps, que mantém um registro independente, calcularam uma média mensal de 420,78 ppm.

“A ciência é irrefutável: os humanos estão alterando nosso clima de maneiras que nossa economia e nossa infraestrutura devem se adaptar”, disse o administrador da NOAA, Rick Spinrad. “Podemos ver os impactos das mudanças climáticas ao nosso redor todos os dias. O aumento implacável de dióxido de carbono medido em Mauna Loa é um forte lembrete de que precisamos tomar medidas urgentes e sérias para nos tornarmos uma nação mais pronta para o clima”.

Concentração de CO2 nos últimos 60 anos medida em Mauna Loa | NOAA

A poluição por CO2 é gerada pela queima de combustíveis fósseis para transporte e geração elétrica, pela fabricação de cimento, desmatamento, agricultura e muitas outras práticas. Juntamente com outros gases de efeito estufa, o CO2 retém o calor irradiado da superfície do planeta que, de outra forma, escaparia para o espaço, fazendo com que a atmosfera do planeta aqueça constantemente.

O efeito é desencadear uma cascata de impactos climáticos, incluindo episódios de calor extremo, seca e atividade de incêndios florestais, bem como como precipitação mais intensa, inundações e atividade de tempestades tropicais.

Os impactos nos oceanos do mundo devido aos gases de efeito estufa incluem o aumento da temperatura da superfície do mar, aumento do nível do mar e aumento da absorção de carbono, o que torna a água do mar mais ácida, leva à desoxigenação do oceano e torna mais difícil a sobrevivência de alguns organismos marinhos.

Antes da Revolução Industrial, os níveis de CO2 estavam consistentemente em torno de 280 ppm por quase 6.000 anos de civilização humana. Desde então, os humanos geraram cerca de 1,5 trilhão de toneladas de poluição de CO2, grande parte da qual continuará a aquecer a atmosfera por milhares de anos.

Os níveis de CO2 são agora comparáveis ao Óptimo Climático do Plioceno, entre 4,1 e 4,5 milhões de anos atrás, quando estavam próximos ou acima de 400 ppm. Durante esse tempo, o nível do mar estava entre 5 e 25 metros mais alto do que hoje, alto o suficiente para cobrir muitas das maiores cidades modernas do mundo. As temperaturas então eram em média 3,5ºC mais altas do que nos tempos pré-industriais, e estudos indicam que grandes florestas ocupavam a atual tundra ártica.

Por que o observatório está junto ao vulcão?

O observatório da NOAA, situado no alto das encostas do vulcão Mauna Loa, é o local de referência global para monitorar o CO2 atmosférico. A uma altitude de 3.395 metros acima do nível do mar, o observatório coleta amostras de ar não perturbadas pela influência da poluição ou vegetação local e produz medições que representam o estado médio da atmosfera no Hemisfério Norte.

Charles David Keeling, um cientista da Scripps Institution of Oceanography, iniciou medições in loco de CO2 na estação meteorológica da NOAA em Mauna Loa em 1958. Keeling foi o primeiro a reconhecer que os níveis de CO2 no Hemisfério Norte caíam durante a estação de crescimento da vegetação e aumentavam com a perda das folhas no outono. Ele documentou tais flutuações anuais no que veio a ser conhecido como a Curva de Keeling. Também foi o primeiro a reconhecer que, apesar da flutuação sazonal, os níveis de CO2 aumentavam a cada ano.

Instalações da NOAA no Observatório de Mauna Loa | NOAA

A NOAA, a agência climática do governo dos Estados Unidos, começou as medições em 1974, e as duas instituições de pesquisa fizeram observações complementares e independentes desde então. O filho de Keeling, o geoquímico Ralph Keeling, dirige o programa Scripps em Mauna Loa.

Os dados de Mauna Loa, juntamente com medições de estações de amostragem em todo o mundo, são incorporados pelo Laboratório de Monitoramento Global da NOAA na Rede Global de Referência de Gases de Efeito Estufa, um conjunto de dados de pesquisa fundamental para cientistas climáticos internacionais e uma referência para formuladores de políticas que tentam abordar as causas e impactos das mudanças climáticas.

Saiba mais sobre o vulcão Mauna Loa

Mauna Loa, que cobre metade da ilha do Havaí, entrou em erupção 33 vezes desde 1843, a primeira “erupção histórica bem documentada” do vulcão, de acordo com o Serviço Geológico dos Estados Unidos. O vulcão entrou em erupção pela última vez em 1984, tornando o período de calma mais prolongado da história registrada do vulcão.

Trata-se do maior vulcão da Terra em volume. Seu nome significa “Montanha grande” e ele cobre metade da Ilha Grande e é maior que as outras ilhas do Havaí juntas. Os flancos submarinos do vulcão se estendem ao longo de vários quilômetros até o leito oceânico que, por sua vez, está deprimido pela enorme massa do Mauna Loa, o que faz com que seu cume esteja a cerca de 17 quilômetros acima de sua base, segundo o USGS.

A cratera do cume de Mauna Loa fica a cerca de 34 quilômetros a Oeste de Kilauea, um vulcão menor cuja erupção ao longo de meses em 2018 expeliu lava no bairro de Leilani Estates, destruindo mais de 700 casas e desalojando moradores. A sua atividade sísmica aumentou de cinco para dez terremotos por dia desde junho de 2022 para cerca de 10 a 20 terremotos por dia em julho e agosto, de acordo com o USGS.

Mauna Loa é um dos cinco vulcões que juntos compõem a Grande Ilha do Havaí, que é a ilha mais ao Sul do arquipélago havaiano. Mauna Loa, com pico de 4.169 metros acima do nível do mar, é o vizinho muito maior do vulcão Kilauea. A sua lava pode fluir muito mais rápido.

Durante uma erupção de 1950, a lava da montanha viajou 24 quilômetros até o oceano em menos de três horas. Na erupção mais recente, em 1984, que durou 22 dias e produziu fluxos de lava, o magma chegou a apenas sete quilômetros de Hilo, cidade onde atualmente moram cerca de 44.000 pessoas.