Enorme nuvem escura da tempestade de areia avançou sobre cidades do interior do estado de São Paulo e do Triangulo Mineiro | REPRODUÇÃO

Uma tempestade de areia de grandes proporções atingiu entre a tarde e a noite de ontem (26) diversas cidades do Centro e Norte do estado de São Paulo e do Triângulo Mineiro com uma enorme nuvem escura que assustou a população e com transtornos em algumas localidades como queda de árvores. As rajadas de vento foram muito fortes em diferentes pontos e, no caso do aeroporto de Ribeirão Preto, passaram dos 92 km/h.

Por que a tormenta de poeira, fenômeno conhecido em muitos países como haboob, foi tão intensa? A resposta não está no que aconteceu exclusivamente com o tempo ontem. Foi um evento meteorológico que se criou ao longo de meses. Como? Em razão da falta de chuva prolongada e precipitações muito abaixo dos padrões históricos na região.

Região onde se formou a tempestade de areia tem seca extrema a excepcional | ANA

Uma tempestade em construção por meses

Os meses de inverno, tradicionalmente, são da temporada seca no Centro-Oeste e no Sudeste do Brasil. É a época do ano em que menos chove. Quando a chuva começa a retornar entre os meses de setembro e outubro com temporais de vento, tempestades de areia costumam quando há ventania ocorrer porque o solo está tomado de areia e poeira pelo período seco. A dimensão da tempestade de areia de ontem é que fugiu ao comum porque a escassez de chuva dos últimos meses na região em que se produziu o haboob também desviou do normal.

O último mapa de seca do Brasil divulgado pela Agência Nacional de Águas (ANA) mostra que a região em que se originou a tempestade de areia é a que apresenta o quadro mais grave de seca no Brasil.

Com efeito, não foi coincidência que a grande tormenta de poeira e terra tenha ocorrido na área. Conforme se observa no mapa, a zona compreendida entre o Noroeste paulista e o Triângulo Mineiro era a única em agosto com seca na categoria excepcional. Todo o Centro-Norte do estado de São Paulo estava na categoria de seca extrema.

Choveu muitíssimo pouco na região nos últimos meses. Em Franca, de onde vieram as imagens mais impressionantes da tempestade de areia, a precipitação acumulada na estação do Instituto Nacional de Meteorologia em maio foi de apenas 18,6 mm. Em junho, a precipitação somou 32,1 mm. Em julho, mísero 0,4 mm. No mês de agosto, por sua vez, novamente 0,4 mm. E agora em setembro, antes de ontem, apenas 8,5 mm. Ou seja, Franca teve nos últimos 90 dias ínfimos 10 mm de precipitação.

Mapa de chuva acumulada no Brasil nos últimos 90 dias mostra escassez de precipitação na região em que se formou a tempestade de areia| INSTITUTO NACIONAL DE METEOROLOGIA

Com a falta de chuva e muitos dias de calor, alguns com máximas perto ou até acima de 40ºC na região nas últimas semanas, houve uma significativa perda de umidade do solo. Com isso, acumulou-se uma grande quantidade de areia em superfície.

Isso explica que tempestades de areia, como a que se viu ontem na região Sudeste do Brasil, sejam muitos comuns em áreas de deserto ou que passam por processos de desertificação em diferentes continentes do planeta. Com o déficit de chuva da última década, algumas áreas do território brasileiro, como o Semiárido, enfrentaram um rápido processo de desertificação.

As nuvens carregadas de temporal de natureza convectiva que se formaram durante a tarde do domingo com o forte calor que se registrava no interior paulista acabaram, assim, sendo o “gatilho” para que o vento forte na base destas nuvens levantasse toda esta areia acumulada para a atmosfera, gerando as imagens que impressionaram o Brasil nas últimas horas.

Haboob ou tempestade de areia

O que se testemunhou em São Paulo e Minas Gerais é que se denomina mundialmente de haboob. Um haboob é um tipo de tempestade de poeira ou areia que se forma a partir de uma tempestade comum de chuva e vento. Eles geralmente são muito grandes e podem ter milhares de metros de altura e até 160 quilômetros de largura.

Durante as tempestades tradicionais, o ar frio desce para o solo e se espalha radialmente no que é conhecido como downdraft ou movimento descendente de uma nuvem de temporal. Era o caso do interior de São Paulo na tarde de domingo com muitas nuvens de desenvolvimento vertical na região que geraram ventania com o forte calor que se registrava.

Quando este processo ocorre em uma região árida ou semiárida, o vento pode levantar poeira, formando um haboob. Estes haboobs se formam muito rapidamente. Em questão de segundos, eles podem reduzir drasticamente a visibilidade. Isso significa que representam uma ameaça para os motoristas. É importante estar alerta durante um haboob porque os ventos fortes podem derrubar árvores e romper linhas de energia. Estas tempestades de areia geralmente acabam em algumas horas.