Praia da Guarita em Torres (RS) | GABRIEL ZAPAROLLI

A poluição luminosa, gerada pelo excesso de luz artificial, está aumentando rapidamente e em alguns lugares o número de estrelas percebidas a olho nu no céu caiu pela metade em menos de 20 anos, segundo um estudo apresentado ontem.

Os pesquisadores, cujas descobertas foram publicadas na revista Science, afirmaram que o aumento da poluição luminosa foi muito maior do que o medido por satélites à noite na Terra.

Para estudar como o brilho do céu muda globalmente em função da luz artificial, os pesquisadores usaram avistamentos estelares de 2011 a 2022 feitos por mais de 51 mil “cientistas cidadãos” em todo o mundo.

Os participantes do projeto Globe at Night (A Terra à Noite), administrado pelo Laboratório Nacional de Pesquisa em Astronomia Óptica e Infravermelha dos Estados Unidos (NOIRLab), receberam mapas estelares e foram solicitados a compará-los com o céu noturno de sua localização.

A mudança no número de estrelas visíveis foi equivalente a um aumento anual de 9,6% no brilho do céu, com base na localização dos participantes, disseram os pesquisadores. Durante um período de 18 anos, dada tal mudança na luminosidade do céu noturno, um local que tivesse 250 estrelas visíveis teria reduzido esse número para 100.

A maioria das estrelas percebidas a olho nu foi relatada na Europa e nos Estados Unidos, declarou Christopher Kyba, um dos autores do estudo, embora também houvesse bons avistamentos no Uruguai, África do Sul e Japão.

“A tendência global de poluição luminosa que medimos possivelmente subestima a tendência em países que têm um desenvolvimento econômico de crescimento mais rápido, já que a taxa de mudança de emissão de luz é maior lá”, explicaram os pesquisadores.

O estudo coincidiu com a substituição de muitas luzes externas pela tecnologia LED (diodo emissor de luz), mas os pesquisadores dizem que seu impacto na poluição luminosa não é claro.

“Alguns pesquisadores previram que isso seria benéfico; outros afirmam que seria prejudicial devido às mudanças espectrais e ao efeito rebote, no qual a alta eficácia luminosa dos LEDs leva à instalação de luzes mais brilhantes ou a ficarem ligadas por mais horas”, acrescentaram.

De acordo com o estudo, o mercado global de LED para novas luzes cresceu de menos de 1% em 2011 para 47% em 2019. “A visibilidade das estrelas está se deteriorando rapidamente, apesar (ou talvez por causa) da introdução de LEDs na iluminação externa”, disse o estudo. “As luzes policiais atuais não estão impedindo o aumento da poluição luminosa, pelo menos não em escala continental ou global”.

Kyba, físico do Centro Alemão de Pesquisa em Geociências, disse à AFP que, embora a equipe tenha conseguido avaliar a erosão na visibilidade de uma estrela devido à poluição luminosa, poucas pesquisas abordaram seu impacto ecológico.

“Há toneladas de pesquisas sobre o efeito do excesso de luz diretamente em animais e plantas”, disse ele. “Mas é muito difícil fazer experimentos sobre o impacto da poluição visual”.  “Você não vai conseguir fazer algo como simplesmente desligar a cidade de Nova York e ver o que acontece no East River”.

Ciência à parte, a poluição luminosa mudou o caráter dos céus noturnos. “Ao longo da história da humanidade, quando as pessoas saíam à noite, elas davam de cara com o cosmos, pelo menos nas noites sem Lua, lembrou Kyba.

“Você saía e lá estavam as estrelas, a Via Láctea. Estava lá brilhando sobre você.” “E agora essa é uma experiência realmente incomum”, acrescentou. “Isso certamente faz diferença para nós quando há pessoas que não tiveram essa experiência, que costumava ser muito universal”, concluiu. A campanha Globe at Night possui um mapa de dados interativo no site globeatnight.org e procura voluntários para coletar mais avistamentos em 2023.