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Petrópolis é hoje uma cidade arrasada após precipitações em poucas horas que alcançaram até 260 milímetros e que causaram enorme número de deslizamentos de terra e o maior número de mortos em um evento de chuva desde a catástrofe de 1988 | CARL DE SOUZA/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Muitas famílias, algumas com lágrimas nos olhos, desciam nesta quarta-feira do bairro de Alto da Serra levando consigo o pouco que conseguiram salvar de seus pertences após a chuva devastadora que atingiu a cidade histórica de Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro.

“É uma coisa que ninguém esperava. Foi desesperador, muito triste”, afirmou Elisabeth Lourenço, carregando duas grandes bolsas nas quais colocou o máximo de roupa possível, enquanto descia com cuidado uma ladeira no bairro, escorregadia por conta da lama trazida pela chuva.

Como todos os outros moradores do bairro, esta manicure de 32 anos teve que abandonar sua casa diante do temor de novos deslizamentos. “Na hora da chuva, desceu muito barro lá de cima e os galhos das árvores caíram em cima da parte de trás da minha casa”, disse Lourenço à AFP.

A poucos metros dali a imagem é de caos. Uma enorme parte da encosta está coberta de barro misturado com escombros de casas e restos de telhado. Segundo as autoridades, a tragédia deixou pelo menos 78 mortos, um balanço atualizado no fim da tarde pelo governador do Rio, Claudio Castro, e que pode aumentar.


As equipes de resgate removem a lama e os escombros para tentar encontrar sobreviventes, enquanto os moradores observam a cena, incrédulos, se assustando cada vez que ocorre um barulho mais alto, como a passagem de helicópteros. “Eu estava jantando quando começou a tempestade. Meu irmão veio me buscar e me disse: ‘temos que ir, o morro está descendo'”, explicou Jerônimo Leonardo, de 47 anos, cuja casa, que ficou relativamente conservada, fica ao lado da ladeira soterrada pelo deslizamento de terra.

Todos os moradores de Alto da Serra, um bairro popular erguido na encosta de um morro a poucos minutos do centro histórico da cidade, foram obrigados a deixar suas casas. O destino deles: a igreja de Santo Antônio, a dez minutos de caminhada dali, no alto de outro morro.

Da praça desta pequena igreja colonial com fachada azul-celeste é possível ver a dimensão da destruição causada pela avalanche de terra, em meio à neblina e à possibilidade de novas chuvas. A igreja recebe dezenas de famílias desabrigadas, carregando bolsas e malas, e muitos voluntários que vêm com doações.

“Foi logo depois da tragédia, da queda da barreira, […] que as pessoas começaram chegar aqui”. “Creio que quase umas 150, 200 pessoas, famílias com crianças, chegaram”, explicou o padre Celestino, responsável pela paróquia. Atrás da igreja, foram colocados colchões no chão da sala principal da paróquia para atender aos desalojados.

“Não dormi nada durante toda a noite”, explicou Yasmin Kennia Narciso, uma assistente escolar de 26 anos, enquanto amamentava Luana, sua bebê de nove meses, sentada em um colchão. A jovem, que vive com outra filha de 6 anos e seus avós, não pôde sair de sua casa antes das 23h. “Tentamos sair antes, mas tinha muita pedra no meio do caminho e estava tudo inundado. A água estava na cintura e tivemos que esperar o nível baixar”, contou a jovem. “Não tenho notícias de vários vizinhos, uma senhora mais velha e seus três filhos pequenos que moravam alguns metros mais acima ficaram soterrados pelo barro”, disse.

Nas instalações da igreja, Yasmin só conseguiu trocar as fraldas de sua filha com as doações que chegaram de madrugada. Na praça do templo religioso, diversos voluntários descarregavam garrafas de água de uma caminhonete, enquanto outros separavam as roupas. “Você pode me dar um tênis?”, perguntou um menino, descaço, e com as roupas sujas de lama. As vítimas agora ficarão em compasso de espera para saber se algum dia poderão retornar para suas casas, caso elas ainda estejam de pé.

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