Bombeiros procuram vítimas ou sobreviventes entre os escombros de casas destruídas após um deslizamento de terra em Las Tejerias, estado de Aragua, na Venezuela. Ao menos 36 pessoas morreram e mais de 50 ainda estão desaparecidas após o transbordamento de um rio que causou um deslizamento de terra no mais recente desastre mortal a atingir o país. | MIGUEL ZAMBRANO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

O deslizamento em Las Tejerías, Venezuela, o maior em décadas no país, que deixou 36 mortos e 56 desaparecidos, é consequência de um período longo de chuvas, provocadas pelo fenômeno La Niña, somado à falta de uma política que evite construções perto de barrancos e cursos d’água, afirmam especialistas.

“As mudanças climáticas estão nos açoitando”, disse à AFP o gerente-geral do Instituto de Meteorologia (Inameh), Ángel Custodio, para explicar este ano “atípico”, em que convergiram chuvas intensas. O fenômeno La Niña está afetando o país desde o começo do ano e por causa dele choveu durante a temporada de seca (janeiro a março).

As precipitações se intensificaram em abril, quando começou a temporada chuvosa e a elas se somaram depressões atmosféricas, tempestades e a passagem próxima de furacões, como o Júlia.

Especialistas do Departamento de Meteorologia da Universidade Central da Venezuela (UCV) avaliam, ainda, que este ano será o “quinto ou sexto” mais chuvoso dos últimos 70 anos. Em setembro, por exemplo, choveu 157,9 mm, 80% mais do que os índices de todos os meses de setembro registrados até agora e muito acima da média mensal, de 111,2 mm.

O deslizamento ocorrido no sábado em Las Tejerías foi provocado por um “processo natural” da montanha, explica o professor da UCV e especialista em ameaças geológicas, Feliciano de Santis. Quando as chuvas são contínuas, a cordilheira tem queda de rochas e sedimentos, detalha De Santis. “Mas, o que acontece quando isso desce? O que alcança? Um povoado” instalado em áreas vulneráveis. Acontece o “desastre”, afirma.

 

Na Venezuela, vilarejos instalados em áreas montanhosas e cercados de florestas costumam ter casas perto das margens de barrancos e rios, construídas sem a distância necessária da água ou com as obras hidráulicas requeridas, afirma De Santis. E têm sido feitas “milhões” de avaliações sobre a vulnerabilidade das áreas, afirma o especialista, mas há pouca regulamentação governamental.

Em Las Tejerías, por exemplo, socorristas coincidem em que as casas destruídas no entorno de barrancos não deviam estar ali, mas “a necessidade” das pessoas as leva a construir moradias em áreas como esta.

Um homem com sua bicicleta passa na frente de carros empilhados pela inundação numa montadora de veículos após um deslizamento de terra durante fortes chuvas em Las Tejerias, estado de Aragua, Venezuela | YURI CORTEZ/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Os deslizamentos ocorrem após dias de chuvas intensas. “Não sabemos nem quando, nem como, mas é possível mitigá-los”, lembra o especialista hidrológico e engenheiro civil e de planejamento, José María de Viana.

O maior deslizamento da história recente da Venezuela é conhecido como a “Tragédia de Vargas”, em dezembro de 1999, quando cerca de 10 mil pessoas morreram. Cerca de 100 morreram em 1987 em El Limón, também em Aragua, e no ano passado, 20 no estado andino de Mérida.

“Sabemos que vai acontecer de novo” e “há necessidade de levá-lo a sério e estudá-lo”, alerta De Viana, dando como exemplo as políticas de planejamento urbano em países como o Japão, onde se registra o maior número de deslizamentos do mundo.