O Ministério Público do Rio Grande do Sul, na sequência dos vários desastres naturais por chuva e vento que atingiram o estado desde o mês de junho, com quase oitenta vítimas fatais, realizou seminário entre ontem e hoje dedicado às mudanças climáticas e os desafios das alterações no clima para a sociedade e o trabalho dos promotores de justiça.
O evento intitulado “Realidade das Mudanças Climáticas: os desafios da Governança e da Reconstrução”, que teve início ontem, na sede do Ministério Público estadual, com a presença do Procurador-Geral de Justiça Alexandre Saltz, não teve entre os painelistas nenhum profissional especializado em previsão do tempo do estado e que tenha atuado em prognósticos dos vários eventos extremos deste ano no Rio Grande do Sul.
A ausência de profissionais gaúchos de Meteorologia, que possuem o conhecimento de previsão de eventos severos, e que acumulam experiência em fenômenos ocorridos no estado, causou espanto e até manifestação pública de irresignação de meteorologistas gaúchos.
“É como se o Ministério Público tivesse realizado um seminário para debater a crise de saúde na pandemia no Rio Grande do Sul e não tivesse convidado nenhum médico do estado da linha de frente”, disse a meteorologista da MetSul Estael Sias, mestre em Meteorologia pela Universidade de São Paulo (USP) com estudos sobre tempestades severas.
“Temos no setor público do Rio Grande do Sul meteorologistas no IRGA, Secretária da Agricultura, Secretaria do Ambiente, no Instituto Nacional de Meteorologia e em duas universidade federais com faculdades de Meteorologia, mas ninguém habilitado em previsão do tempo do nosso estado foi ouvido”, destacou Estael. “O maior especialista em tempo severo do Brasil, o professor Ernani Nascimento, por exemplo, é da UFSM”, pontuou.
“O seminário do Ministério Público convidou profissionais que são estudiosos do clima com grande reputação, mas não da Meteorologia operacional do Rio Grande do Sul, os que todos os dias do ano estão gerando a previsão e os alertas para a população aqui do estado”, acrescentou a meteorologista da MetSul.
O meteorologista Douglas Lindemann, doutor em Meteorologia e professor da ciência na Universidade Federal de Pelotas, expressou a sua contrariedade com a nominata de convidados. Ele utilizou a rede social X (antigo Twitter) para protestar contra a não presença de meteorologistas.
“O Rio Grande do Sul tem duas faculdades de Meteorologia, com profissionais capacitados, mas na hora de fazer um seminário sobre “Realidade das mudanças climáticas” o Ministério Público não chama ninguém para falar. Detalhe para uma das temáticas: “ciência do clima e prognósticos”, escreveu o professor da UFPEL.
O professor de Meteorologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Vagner Anabor também se mostrou espantado com a ausência de meteorologistas gaúchos no evento, no que descreveu como uma situação de “invisibilidade”.
“Autoridades públicas gaúchas ignoram o histórico das faculdades de Meteorologia do estado, em Pelotas e Santa Maria, que formaram os profissionais que hoje atendem as Defesas Civis de estados como Santa Catarina, Paraná e até a Funceme, no Ceará”, disse Anabor. “Isso ajuda a explicar o atual estágio do estado e as tragédias”, assinalou.
Procurado pela MetSul Meteorologia, o Ministério Público do Rio Grande do Sul divulgou nota informando que o evento era aberto ao público e contou com a presença do meteorologista José Marengo, do Centro Nacional de Monitoramento de Desastres.
Leia a nota do MP-RS:
“O evento, que era aberto ao público, tinha como tema “Realidade das Mudanças Climáticas: Os desafios da Governança e da Reconstrução”. O foco era discutir políticas públicas de Estado para minimizar os efeitos dos fenômenos naturais. Sendo assim, fizeram parte das discussões membros de instituições públicas ligadas ao tema, como especialistas da UFRGS, Defesa Civil, Ibama, CEMADEN, prefeitos de municípios atingidos pelas enchentes e promotores da área do meio ambiente. O cientista José Marengo, coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), tem formação em Meteorologia e foi um dos palestrantes do seminário”.