Artigo publicado em jornal de Porto Alegre há seis anos (“Mudanças atenuam o inverno gaúcho”, em Zero Hora, 29 de abril de 2007, pg. 50) sustentava que o aquecimento global havia atenuado o inverno gaúcho e que a tendência era de temperatura ainda mais alta a ponto de se plantar café (!!) aqui no Estado. “O progressivo aumento da temperatura mundial vem provocando mudanças facilmente perceptíveis no clima do Rio Grande do Sul. Nos últimos cinco anos, um dos efeitos do calor galopante no planeta foi o aquecimento sem precedentes no inverno dos gaúchos”, escreveu-se à época. “Entre 2002 e 2006 os meses de inverno registraram temperatura acima da média histórica. As variações climatológicas começam a alterar até mesmo os padrões agrícolas dos gaúchos. Muitos agricultores vêm adotando o hábito de antecipar o plantio para aproveitar o período de calor que começa cada vez mais cedo, antes da chegada do verão. A tendência é de que produtos típicos de temperatura mais elevada, como o café, também ganhem cada vez mais espaço no Rio Grande do Sul”, afirmava o material.


O que aconteceu depois do artigo ? Vamos ao fact-check ! Meses após, ainda em 2007, o Rio Grande do Sul registrava inverno gélido e que parecia não ter fim, já que fez muito frio até no mês de novembro. Mais ao Sul, a cidade de Buenos Aires teve entre os dias 8 e 9 de julho sua maior nevada desde 1918 (foto acima). E de 2007 a 2013, em seis anos, ao contrário do que se previa no material publicado no final de abril de 2007, os invernos ficaram mais frios que a média do século XX. Levantamento da MetSul com apoio do setor de banco de dados do Oitavo Distrito de Meteorologia mostra que a temperatura média de junho, julho e agosto em Porto Alegre (estação do Jardim Botânico) de 2007 a 2013 foi de 14,4ºC. Valor menor que a do trimestre na série histórica 1961-1990 (14,7ºC) e ainda inferior à média do trimestre até da série 1931-1960 (14,9ºC).


Rio Grande do Sul passou a enfrentar uma sequência de invernos mais rigorosos – Pedro Revillion/Arquivo Correio do Povo

De 2007 até 2013, comparando-se às médias 1961-1990, junho foi 0,2ºC mais frio e julho 0,8ºC mais gelado que as médias mensais da série histórica de 30 anos ainda usada pelo Instituto Nacional de Meteorologia. Já agosto, segundo o levantamento, foi 0,2ºC mais quente entre 2007 e 2013, muito em razão do peso de 2012, quando o oitavo mês foi absurdamente quente com média na Capital de 19,1ºC (3,8ºC acima). Na comparação com a série histórica 1931-1960, junho entre 2007 e 2013 foi 0,9ºC mais frio e julho 0,7ºC também mais frio. Já os meses de agosto foram 0,2ºC mais quentes.


O artigo publicado em 2007 que considerou os invernos quentes de 2002 a 2006 como uma referência para o futuro não citou que os invernos mais brandos naquele período se deram com predominância de Pacífico Equatorial mais quente que a média, e episódios do fenômeno El Niño. Entre 2007 e 2013, contudo, houve uma maior frequência de eventos frios no Pacífico (episódios de La Niña até fortes como em 2008), o que acabou sendo determinante para invernos de frio mais rigoroso aqui no Rio Grande do Sul. Esta diferença gritante entre os 5 anos (2002-2006) precedentes ao artigo e os 6 anos posteriores (2007-2013) fica muito evidente acima no gráfico de anomalia de temperatura da superfície do mar (TSM) na região Niño 3.4.


O retorno dos invernos mais rigorosos ao Rio Grande do Sul, e também das nevadas, está em linha com o que acontece em padrão global. Nas últimas semanas, dois artigos sobre a evolução da temperatura do planeta sacudiram a comunidade climatológica. A palavra “hiato” passou a ser a mais comentada em espaços de discussão sobre clima. Isso porque os estudos comprovaram o que já se sabia. Que a Terra parou de aquecer. Há, pelo menos, 15 anos a curva de aquecimento do planeta se estabilizou (gráfico acima do Scripps Institute mostra relação entre o aumento do CO2 no observatório de Mauna Loa e a temperatura da Terra). Estes recentes trabalhos científicos mostraram que esta pausa no aquecimento do planeta ocorreu em razão do comportamento justamente do Oceano Pacífico que passou a apresentar mais frequentes eventos de resfriamento.