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Um evento meteorológico extraordinário terá lugar neste fim de semana e no começo da semana no Sudoeste dos Estados Unidos. Em uma situação extremamente rara, o Sudoeste norte-americano e o estado da Califórnia serão atingidos por um ciclone tropical, o furacão Hillary agora junto à costa de Baja Califórnia (México). Embora não seja um fato inédito na região, trata-se de um evento excepcionalmente incomum do ponto de vista histórico.

CIRA/CSU

Por que este ciclone tropical é espantoso do ponto de vista histórico? São muitas as razões. Desde 1939, o estado norte-americano da Califórnia não é atingido por um ciclone tropical. Já ciclones extratropicais são comuns costa californiana. Hillary gerou o primeiro alerta de tempestade tropical na Califórnia desde que as práticas modernas de alertas de furacões começaram na década de 1950.

O ciclone tropical vai atingir as cidades de Los Angeles e San Diego, que não possuem qualquer registro deste fenômeno na história recente, enquanto nenhuma tempestade tropical atingiu ainda neste ano áreas costeiras dos Estados Unidos acostumadas a este tipo de fenômeno como a costa do Golfo do México ou a Flórida.

Hillary, ademais, deverá provocar chuva em acumulados extraordinários no Sul da Califórnia e, em especial, nas áreas desérticas do Sudoeste dos Estados Unidos, entre a Califórnia e Nevada, com volume de precipitação equivalente à chuva de um ano ou até anos em apenas um dia.

A tendência é que Hilary, ontem um furacão categoria 4, avance para Norte-Noroeste e acelere sobre águas excepcionalmente quentes na costa da Baja Califórnia (México) neste fim de semana, permitindo que mantenha força suficiente para trazer condições de tempestade tropical para partes do Sul do estado norte-americano da Califórnia na noite de domingo e na manhã de segunda-feira.

Embora à primeira vista possa parecer não ser nada demais para a Califórnia ter tempestade tropical, fenômeno que na Flórida não gera alarme por ser bastante comum, nesta região dos Estados Unidos é diferente. Primeiro, é absurdamente raro. Dois, a presença de altas montanhas reforçará muito a chuva e o vento de Hilary.

Assim, é muito diferente das típicas tempestades atlânticas no Golfo do México e no Sudeste dos Estados Unidos, onde o terreno é relativamente plano. Além disso, as chuvas mais pesadas de Hilary cairão em áreas desérticas e o fluxo de ar no sentido anti-horário em torno da tempestade levará a chuva mais extrema para encostas a Leste das montanhas. São áreas mais secas, já que normalmente as precipitações se dão nas encostas das montanhas voltadas para o Oeste, na direção do Pacífico.

Hilary não é uma tempestade tropical comum. Carrega quantidade incrível de umidade para o Norte e a quantidade de vapor d’água na atmosfera pode se aproximar dos recordes históricos em alguns locais no seu caminho. Os impactos da tempestade provavelmente serão graves e altamente danosos no Sudoeste dos Estados Unidos. Espera-se que Hilary traga algumas das chuvas de verão mais pesadas já registradas para o Sul da Califórnia, bem como para partes de Nevada, Oeste do Arizona e talvez o Sudoeste de Utah.

O Centro de Previsão do Tempo do Serviço Nacional de Meteorologia dos Estados Unidos emitiu um incrivelmente raro aviso de risco “alto” de chuvas excessivas, levando a inundações repentina, para partes do deserto do extremo Sul da Califórnia, onde podem ser esperados até 250 mm ou mais de chuva com volumes superiores em áreas montanhosas. A discussão no texto da previsão alertou para “volume de chuva único em cem anos”.

Último ciclone tropical em 1939 causou destruição

Em 25 de setembro de 1939, uma violenta tempestade atingiu o Sul da Califórnia, afundando barcos, inundando resorts nas montanhas e matando quase 100 pessoas. Foi o último ciclone tropical a atingir a região.

Agora, mais de 80 anos depois, o furacão Hilary está avançando em direção ao Sudoeste dos Estados Unidos, ameaçando despejar chuva suficiente para causar inundações repentinas e outros “impactos raros e perigosos”, disse o Centro Nacional de Furacões.

Tais eventos são extremamente incomuns na região porque o ar seco, a água fria no litoral e as condições do vento na costa da Califórnia tendem a dispersar os furacões. Mas, no caso de Hilary, as águas um pouco mais quentes causadas pelo El Niño estão ajudando a enfraquecer a tempestade mais lentamente, e enorme bolha de calor de alta pressão no Centro dos Estados Unidos faz com que a tempestade se movimente para Norte.

A tempestade de 1939, que atingiu Long Beach, Califórnia, castigou o condado de Los Angeles e arredores, destruindo casas costeiras, cortando energia e interrompendo o tráfego ferroviário e rodoviário, de acordo com um artigo publicado no The New York Times no dia seguinte.

Quase 100 pessoas foram mortas pelo ciclone incomum. Algumas das vítimas morreram afogadas no mar, enquanto outras morreram em inundações. Mais de uma dúzia de barcos foram declarados desaparecidos, e os destroços de um iate de 80 pés apareceram perto de Huntington Beach, um local de surfe geralmente pitoresco.

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Cerca de 200 pessoas tiveram que ser resgatadas de barcos de lazer e pesca naufragados. Vinte e três pessoas morreram afogadas quando um barco de pesca esportiva virou a apenas 150 metros de um píer em Point Mugu, nas proximidades de Oxnard. E vários corpos foram recuperados da água, incluindo os de um homem e uma mulher que deram à costa.

Em Los Angeles, 137 mm de chuva caíram em 24 horas, a chuva mais forte de setembro na história da cidade na época. Um dilúvio no Coachella Valley destruiu os trilhos do trem e destruiu 70% da safra de tâmaras da região.

A destruição foi impressionante no Sul da Califórnia. No entanto, não podia competir com a notícia de que milhares de civis estavam morrendo em Varsóvia durante a invasão da Polônia. Como observou um artigo do The New York Times à época: “A natureza em seus humores mais raivosos dificilmente pode esperar competir com a destruição decretada pelo homem”.

Outras tempestades tropicais trouxeram ventos com força de tempestade tropical para o Sudoeste dos Estados Unidos, mas apenas duas atingiram a Califórnia. Além da tempestade de 1939, a única outra tempestade tropical a alcançar o estado foi em 2 de outubro de 1858, quando um furacão sacudiu San Diego, danificando casas, arrancando árvores e causando inundações no interior.

Destruição em 1976

Em 1976, o Sudoeste dos Estados Unidos não foi atingido por um ciclone tropical, mas por um sistema remanescente. Foi em 10 de setembro de 1976, com os remanescentes do furacão Kathleen, o sistema de maior impacto na região desde a tempestade tropical que atingiu San Diego em 1939.

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Kathleen era apenas um furacão de categoria 1 e tocou terra duas vezes na Baja California, muito ao Sul de San Diego no início de 10 de setembro. Kathleen passou pelos desertos do Sudeste da Califórnia, movendo-se a Oeste de Las Vegas (Nevada) antes de se dissipar. Kathleen foi classificada pelo National Hurricane Center como uma depressão tropical ao longo de sua trajetória na Califórnia e Nevada, mas seus ventos eram notavelmente mais fortes.

Yuma, Arizona, experimentou ventos sustentados de 90 km/h, solidamente na faixa de tempestade tropical, e rajadas de vento de até 122 km/h. Um estudo pós-tempestade do Serviço Nacional de Meteorologia atribuiu a força incomum de Kathleen principalmente à sua rápida taxa de movimento e temperaturas da superfície do mar acima da média.

A precipitação total do furacão Kathleen e seus remanescentes incluiu quantidades generalizadas de 25 mm a 75 mm no Sul da Califórnia e Nevada, com áreas de 75 mm a 180 mm. O pico de chuva de Kathleen em 1976 foi de 374 mm em San Gorgonio, nas montanhas da Califórnia, ao Norte de Los Angeles que também pode ser duramente atingida por Hilary.

Seis mortes foram relatadas em grandes inundações repentinas em Ocotillo, Califórnia, onde muitas casas foram inundadas. As perdas de Kathleen na Califórnia, incluindo a maior parte da safra do ano, chegaram a US$ 100 milhões em 1976, ou mais de meio bilhão em dólares em valores de 2023.