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Um homem com os pés enlameados senta-se em frente a uma casa danificada por um deslizamento de terra na comunidade Jardim Monte Verde, bairro do Ibura, em Recife, Pernambuco, um dos locais mais castigados e com maior número de vítimas pela chuva extrema no Nordeste do Brasil. | BRENDA ALCANTARA/AFP/METSUL METEOROLOGIA

A chuva forte segue castigando áreas costeiras do Nordeste do Brasil, embora tenha diminuído nas regiões mais castigadas pelas inundações e deslizamentos de terra no Grande Recife. Dados do Centro Nacional de Previsão de Desastres mostram que a chuva apenas nas últimas 24 horas, até o começo da noite desta segunda-feira, passou dos 200 mm em pontos do litoral nordestino.

Conforme as medições do Cemaden, os volumes em 24 horas até 19h desta segunda foram mais altos no litoral de Alagoas com 212 mm em Coruripe (AL), 202 mm em Paripueira (AL), 135 mm em Feliz Deserto (AL) e 90 mm em Maceió (AL). No Grande Recife, choveu em vários momentos do dia de hoje e os mais altos acumulados se deram em Olinda com 51 mm.

De acordo com dados de estações oficiais, João Pessoa (PB) teve 317,2 mm entre 23 e 30/5 com 641,8 mm de 1º a 30 de maio. A média mensal histórica é de 287,7 mm. Maceió anotou 343,6 mm de 23 a 30 de maio com acumulado no mês até o dia 30 de 553,4 mm, sendo a média de maio é 294,7 mm. Em Recife, na estação de medição de Alto Mandu, foram 567 mm entre os dias 23 e 30 de maio, sendo que no mês o acumulado até o dia 30 foi de 731,4 mm, muitíssimo acima da média histórica de chuva de maio na capital pernambucana de 317,1 mm.

O pior da chuva já passou na maioria das áreas, entretanto durante toda esta semana seguirão ocorrendo as pancadas de chuva intercaladas com momentos de sol e que em algumas áreas serão por vezes fortes a intensas, inclusive na área mais castigada em Pernambuco. Recife, por exemplo, tem possibilidade de chuva todos os dias desta semana.

A chuva é consequência de um fenômeno denominado Ondas de Leste, áreas de perturbação atmosférica que avançam pela região tropical do continente africano em direção às Américas, muitas vezes dando origem às tempestades tropicais e furacões no Atlântico Norte. No caso do Nordeste do Brasil, as ondas de Leste não trazem furacões, mas muita chuva.

Estas ondas se formam na área de influência dos ventos alísios, perto da linha do Equador, em especial nos meses do outono e inverno do Hemisfério Sul. Quando estas ondas que cruzam o Atlântico chegam ao litoral brasileiro, causam chuva nas zonas costeiras da Região Nordeste do Brasil, principalmente na Zona da Mata, e às vezes até no Recôncavo Baiano e no litoral do Ceará.

Há um fator agravante para o excesso de chuva no caso das ondas de Leste, a temperatura da superfície do oceano. Quanto mais quente o mar, maior a energia da instabilidade. No caso de agora, a temperatura da superfície do mar está acima da média em toda a região costeira do Nordeste e nas áreas do Atlântico por onde avançam as ondas tropicais.

Mais de 100 mortos e desaparecidos

O governo de Pernambuco optou por não divulgar um novo balanço dos estragos causados pela chuva que vem castigando fortemente a Região Metropolitana do Recife e Zona da Mata. O número de desabrigados, entretanto, aumentou. São 6.170 pessoas fora de casa.

O balanço mais recente, divulgado pelo governo do estado no final da manhã desta segunda-feira, contabilizava 91 mortes e 26 desaparecidos, mas dois corpos foram encontrados em Jaboatão dos Guararapes e Camaragibe, elevando o número de vítimas para 93. Há mais de 20 pessoas desaparecidas.

“Não como nem durmo, porque foi uma dor muito forte”, disse à agência AFP Maria Lúcia da Silva, moradora de Jardim Monteverde, uma das áreas mais atingidas pelas chuvas torrenciais que mataram dezenas de pessoas em Pernambuco. Maria Lúcia foi evacuada a tempo no sábado para evitar ser soterrada por um deslizamento de terra nessa comunidade do Recife, mas seus vizinhos não tiveram a mesma sorte: 11 pessoas da mesma família morreram e outra está desaparecida.

Soldados, bombeiros e moradores buscam vítimas um dia após deslizamento de terra na comunidade Jardim Monte Verde, bairro do Ibura, em Recife, Pernambuco. | BRENDA ALCANTARA/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Dezenas de deslizamentos atingiram a região do Grande Recife e foram responsáveis pela maior parte das vítimas do evento de chuva extrema em Pernambuco com várias moradias soterradas ou destruídas| DIEGO NIGRO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Vários deslizamentos de terra foram registrados durante o sábado em Recife e cidades da área metropolitana como Jaboatão dos Guararapes e mataram dezenas de pessoas | DIEGO NIGRO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Defesa Civil orientou sobre risco de deslizamentos em áreas de risco e população recebeu por SMS mensagens advertindo para o alto risco da chuva extrema | DIEGO NIGRO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Alagamentos e inundações impediram por horas a chegada de equipes da Defesa Civil em pontos de deslizamento e os próprios moradores realizaram as buscas pelos desaparecidos nos vários escorregamentos de encostas em Recife e região metropolitana | DIEGO NIGRO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Militares se juntaram a bombeiros, Defesa Civil, polícia e voluntários nas operações de buscas e retiradas de corpos da terra e da lama nas áreas mais castigadas | DIEGO NIGRO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Buscas por pessoas desaparecidas nas áreas que sofreram deslizamentos prosseguiram mesmo durante a noite e contam com ajuda de iluminação especial e cães farejadores | DIEGO NIGRO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

As imagens do Grande Recife evocam o drama ocorrido em fevereiro em Petrópolis, no estado do Rio de Janeiro, onde 233 pessoas morreram devido a chuvas torrenciais e deslizamentos de terra. Segundo especialistas, tragédias desse tipo se devem, além das fortes chuvas, à topografia e à existência de grandes bairros com moradias precárias no Brasil, muitos deles construídos ilegalmente, em áreas de risco acentuado.

Chuva na região de Recife passou de 200 mm em poucas horas, atinge 500 mm em apenas uma semana e alcança 700 mm no mês de maio com o dobro da média histórica de precipitação | DIEGO NIGRO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Equipes de emergência tiveram dificuldades para acessar alguns dos locais mais castigados pela chuva extremo no Grande Recife | DIEGO NIGRO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Chuva extrema deixou rastro de destruição em Pernambuco com inundações, transbordamento de rios e córregos, alagamentos generalizados, deslizamentos de terra, queda de barreiras e colapso de moradias | DIEGO NIGRO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Vários pontos de Recife e outras cidades ficaram sem luz com a chuva extrema e o vento que derrubou árvores | DIEGO NIGRO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Um homem caminha na lama no local de um deslizamento de terra na comunidade Jardim Monte Verde, bairro do Ibura, em Recife. | SÉRGIO MARANHÃO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

“Foi muito triste, foi como perder minha família. Moro aqui há 40 anos, eram pessoas que eu via desde pequenas”, conta a dona de casa, 56 anos. “Encontraram 11, serão enterrados, e falta uma moça de 32 anos, ainda não encontraram o corpo”, acrescenta, emocionada.

Em Jardim Monteverde, bairro carente localizado em uma ladeira entre Recife e o município de Jaboatão dos Guararapes, dezenas de bombeiros continuavam buscando hoje os 20 desaparecidos. No topo do morro, restam algumas casas de pé, mas, alguns metros adiante, pode-se ver o abismo recém-aberto, quase vertical, com uma espessa camada de lama que varreu tudo em seu caminho. Aos seus pés, uma pilha de escombros, pedaços de tijolos, roupas, brinquedos e outros objetos pessoais das vítimas do desabamento.

O aposentado Mario Guadalupe, 60 anos, também escapou por pouco do desastre. O deslizamento “quase chegou à minha casa, vi tudo o que aconteceu”, contou à AFP. “Houve um primeiro deslizamento de terra. Achávamos que não cairia muito mais, mas, em seguida, veio uma nova torrente, que foi como um tsunami, arrastou tudo pelo caminho”, acrescentou Guadalupe, que mora há 40 anos no local.

A casa modesta do aposentado, milagrosamente preservada, é usada agora para armazenar alimentos distribuídos às vítimas. “Não foi uma tragédia anunciada, porque isso nunca havia acontecido.” “O que entendemos é que é um fenômeno típico do aquecimento global, porque nunca caiu tanta chuva em tão pouco tempo”, continuou. “É um grande aviso para o próximo inverno”, disse.

Grave situação em Alagoas

Já passa de 18 mil o número de pessoas desabrigadas e desalojadas pelas chuvas em Alagoas, segundo informou a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil na tarde desta segunda. A chuva que castiga o estado desde a última semana já provocou três mortes. O relatório apontou 33 municípios em situação de emergência, 2.576 pessoas desabrigados e 15.542 desalojados. As fortes chuvas em Alagoas têm provocado inundações, desabamentos de casas, queda de árvores e deslizamentos de barreiras.