Um violento tornado atingiu no fim da tarde de sexta-feira (7) o município de Rio Bonito do Iguaçu, no Centro-Sul do Paraná, causando devastação e destruindo bairros inteiros da cidade em um dos mais graves episódios de tempo severo da história recente do país.

Tornado devastou a pequena cidade de Rio Bonito do Iguaçu | DANIEL CASTELLANO/AFP/METSUL
Oficialmente, autoridades do governo do Paraná confirmaram deixou cinco mortes por efeito do tornado em Rio Bonito do Iguaçu. As vítimas fatais foram três homens com idades de 49, 57 e 83 anos, e duas mulheres, com idades de 14 e 47 anos. Mais de 750 pessoas ficaram feridas na cidade, algumas com gravidade, possivelmente o número mais alto de pessoas lesionadas até hoje em um episódio de tempo severo no Brasil.
O tornado na cidade paraense é o mais trágico no Brasil da história recente e o mais grave no Paraná em 66 anos. Conforme registros em levantamento histórico da MetSul, trata-se do maior número de fatalidade por um tornado desde a tragédia de Antônio Prado, na Serra Gaúcha, em dezembro de 2003. O risco do fenômeno no Paraná foi alertado pela MeSul Meteorologia na véspera e ainda foi reforçado horas antes.
O tornado que atingiu Rio Bonito do Iguaçu deixou ao menos 1.000 pessoas desalojadas e cerca de 28 desabrigadas na cidade, segundo levantamento prévio da Coordenadoria Estadual de Defesa Civil do Paraná. Ao menos metade das construções da cidade de 15 mil habitantes sofreu danos severos e parte da cidade foi dizimada pelo tornado.
Tornados ocorrem todos os anos no Sul do Brasil e a maioria se dá em áreas rurais de baixa densidade populacional ou campo aberto, sem provocar vítimas. Tanto que muitos se dão em campo aberto, sem danos, e sequer entram na estatística. Quando tornado atravessa a área urbana de uma cidade, o que é muito menos comum, o potencial de destruição e vítimas cresce e muito.
O nível de destruição em extensas áreas de Rio Bonito do Iguaçu variou entre severo e absoluto. Quarteirões inteiros foram dizimados com construções sólidas totalmente destruídas pela intensidade extraordinária do vento, a ponto de somente restar o piso de algumas moradias de alvenaria.
Os danos foram catastróficos na faixa de terreno de centenas de metros de diâmetro por onde atravessou o tornado, incluindo a área central da cidade. Carros foram virados e alguns até arremessados contra as construções durante a passagem do fenômeno pela localidade.
Além das construções, o tornado teve um grande impacto na vegetação local. Árvores tiveram seus troncos decepados e grande parte da vegetação perdeu as folhas, o que somente se observa em eventos de grande poder destrutivo.
Rio Bonito do Sul pode ter sido atingido por um tornado raro no Brasil
Conhecido termo entre os experts em tornados nos Estados Unidos, um “wedge tornado” (tornado de cunha) é um termo informal usado por caçadores de tempestades para descrever tornados que parecem mais largos que altos, com uma base visualmente muito extensa. A MetSul Meteorologia acredita que um tornado desta natureza tenha atingido o município de Rio Bonito do Sul pela extensão dos danos severos na faixa de terreno atingida.
Tecnicamente, nenhum tornado é realmente mais largo que alto — já que a circulação se estende por até 10 a 12 quilômetros dentro da nuvem —, mas a parte visível abaixo da base da tempestade pode dar essa impressão.

Tornado do tipo wedge nos Estados Unidos | NOAA
Segundo o Serviço Nacional de Meteorologia dos Estados Unidos (NWS), apenas um ou dois em cada mil tornados chegam a ter mais de 1,6 km de diâmetro — embora esse número possa ser maior em casos de tempestades envoltas por chuva, onde os limites do vórtice são difíceis de definir.
Os chamados “megawedge” tornadoes são os ainda mais raros, com largura superior a 2,4 km. O NWS registrou oficialmente apenas cerca de 30 casos entre mais de 84 mil tornados catalogados. O maior já observado foi o de El Reno, Oklahoma, em 31 de maio de 2013, com impressionantes 4,2 km de diâmetro.
Tornado pode ter sido um EF-4 na avaliação da MetSul
Recentemente, em 6 de outubro, o Serviço Nacional de Meteorologia dos Estados Unidos (NWS) revisou e elevou a categoria de um tornado que atingiu em junho a cidade do Enderlin, no estado da Dakota do Norte para EF-5 que é o mais alto da escala dos tornados. O último tornado EF5 no país tinha sido o de Moore, em Oklahoma, em 20 de maio de 2013.
O tornado de Enderlin, Dakota do Norte, em 20 de junho de 2025, foi reclassificado como EF5, o nível máximo na escala de intensidade, pelo escritório do Serviço Nacional de Meteorologia (NWS) de Grand Forks após novas análises de campo e consultas com especialistas de diferentes países em danos por vento que realizaram estudos forenses que perduraram por meses.
A classificação da intensidade de um tornado, portanto, é uma questão complexa e por demais intricada que não pode ser feita horas depois do fato sem extensa avaliação de campo dos danos e estudos forenses de classificação de danos a partir de critérios objetivos estabelecidos.
Nesse sentido, o centro meteorológico paranaense indicou preliminarmente que Rio Bonito do Iguaçu foi atingida por tornado “classificado preliminarmente com o índice F2 – o que equivale a ventos entre 180 km/h e 250 km/h” com “fortes indícios de que o tornado pode, em alguns pontos da cidade, ter ultrapassado os 250 km/h, o que mudaria a classificação para F3”.
Esta foi uma avaliação muitíssimo preliminar, feita ainda sem imagens aéreas e avaliação de campo, que muito provavelmente será revista pelo centro paranaense. A resposta definitiva deve tardar semanas ou meses após estudos mais aprofundados de avaliação dos danos, como deve ser conduzido pelo grupo de estudos em tempo severo da Universidade Federal de Santa Maria (PREVOTS).
Preliminarmente, com base em mais de uma centena de fotos e dezenas de vídeos em terra e feitos do ar por drone, a MetSul Meteorologia estima a partir da extensão e da magnitude dos danos que o tornado de Rio Bonito do Iguaçu deve ser classificado no limite superior da categoria EF3 ou mesmo na categoria F4 na Escala Aprimorada de Fujita com vento em 3 segundos entre 250 km/h e 300 km/h.
Fizemos análise comparativa de danos observados em tornados recentes nos Estados Unidos classificados como EF3 e EF4 com as imagens dos impactos no município de Rio Bonito do Iguaçu e os estragos e sua severidade apresentam enorme semelhança com eventos classificados como EF4 em território norte-americano.
Como referência, utilizamos para estudo de caso tornados que atravessaram nos Estados Unidos áreas urbanas de cidades de pequena a médio porte, e o que teve maior grau de semelhança de severidade e extensão dos danos foi um ocorrido na cidade de Mayfield (população de 9805 habitantes), no estado do Kentucky, em 10 de dezembro de 2021.
O tornado de Mayfied, que foi apelidado de “A Besta” em seminário do GSFC da NASA, matou 57 pessoas e deixou 519 feridos. Foi o tornado mais mortal já registrado nos Estados Unidos em dezembro e o mais letal desde o tornado de Joplin, no Missouri, em 22 de maio de 2011. Foi classificado como um EF-4 pelo Serviço Nacional de Meteorologia dos Estados Unidos com vento de 310 km/h, mas alguns dos maiores especialistas forenses em tempo severo da comunidade meteorológica norte-americana defenderam publicamente que o tornado poderia ser reclassificado para EF-5, o mais alto nível da escala.
Você vai ver a seguir comparação fotos em terra e aéreas dos danos observados em Rio Bonito do Iguaçu (sem classificação definitiva ainda de intensidade) e em Mayfield (tornado classificado como EF-4 na Escala Aprimorada de Fujita).
IMAGEM AÉREA

RIO BONITO DO IGUAÇU | JONATHAN CAMPOS/AEN

MAYFIELD (EUA) | SCOTT OLSON/GETTY IMAGES NORTH AMERICA/AFP/METSUL
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RIO BONITO DO IGUAÇU | JONATHAN CAMPOS/AEN

MAYFIELD (EUA) TAYFUN COSKUN/ANADOLU AGENCY/AFP/METSUL
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RIO BONITO DO IGUAÇU | ARI DIAS/AEN

MAYFIELD (EUA) | SCOTT OLSON/GETTY IMAGES NORTH AMERICA/AFP/METSUL
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RIO BONITO DO IGUAÇU | ARI DIAS/AEN

MAYFIELD (EUA) | SCOTT OLSON/GETTY IMAGES NORTH AMERICA/AFP/METSUL
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RIO BONITO DO IGUAÇU | ARI DIAS/AEN

BRANDON BELL/GETTY IMAGES NORTH AMERICA/AFP/METSUL
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RIO BONITO DO IGUAÇU | DANIEL CASTELLANO/AFP/METSUL

MAYFIELD (EUA) | TAYFUN COSKUN/ANADOLU AGENCY/AFP/METSUL
IMAGEM AÉREA

RIO BONITO DO IGUAÇU | DANIEL CASTELLANO/AFP/METSUL

MAYFIELD (EUA) | AFP/METSUL
IMAGEM AÉREA

RIO BONITO DO IGUAÇU | DANIEL CASTELLANO/AFP/METSUL

MAYFIELD (EUA) | CHANDAN KHANNA/AFP/METSUL
COLAPSO ESTRUTURAL TOTAL

RIO BONITO DO IGUAÇU | DANIEL CASTELLANO/AFP/METSUL

MAYFIELD (EUA) | BRENDAN SMIALOWSKI/AFP/METSUL
COLAPSO ESTRUTURAL TOTAL

RIO BONITO DO IGUAÇU | DANIEL CASTELLANO/AFP/METSUL

MAYFIELD (EUA) | SCOTT OLSON/GETTY IMAGES NORTH AMERICA/AFP/METSUL
COLAPSO ESTRUTURAL TOTAL

RIO BONITO DO IGUAÇU | DANIEL CASTELLANO/AFP/METSUL

MAYFIELD (EUA) | SCOTT OLSON/GETTY IMAGES NORTH AMERICA/AFP/METSUL
COLAPSO ESTRUTURAL TOTAL

RIO BONITO DO IGUAÇU | DANIEL CASTELLANO/AFP/METSUL

MAYFIELD (EUA) | SCOTT OLSON/GETTY IMAGES NORTH AMERICA/AFP/METSUL
CARROS VIRADOS

RIO BONITO DO IGUAÇU | REPRODUÇÃO

MAYFIELD (EUA) | BRENDAN SMIALOWSKI/AFP/METSUL
É fundamental enfatizar que o padrão de construções nos Estados Unidos não é o mesmo do Brasil, sendo mais vulnerável a danos por vento que as casas de alvenaria utilizadas comumente pelos brasileiros. A maioria das residências nos Estados Unidos é construída com estrutura leve de madeira, um padrão que combina custo relativamente baixo, rapidez na execução e facilidade de manutenção, mas que apresenta grande vulnerabilidade diante de tornados.
Em tornado, as conexões por pregos e parafusos leves se rompem facilmente, permitindo que o vento levante o telhado ou derrube paredes inteiras. Muitas casas não têm o que engenheiros chamam de “caminho contínuo de carga”, ou seja, um sistema de amarração que transfere as forças do vento do telhado até a base da estrutura. Assim, quando o telhado se desprende, o colapso das paredes ocorre em seguida.
As chamadas “mobile homes”, comuns em áreas rurais e estados do Sul norte-americano, são ainda mais vulneráveis. Construídas sobre uma base metálica e presas ao solo por amarrações simples, podem ser arrancadas ou viradas até por tornados de intensidade moderada. Por isso, a vulnerabilidade habitacional é um dos principais fatores que explicam o alto número de feridos e mortes em tornados nos Estados Unidos, especialmente nas regiões do “Corredor dos Tornados” e nos estados do Sul, onde esse tipo de construção predomina.
A escala dos tornados
A Escala Fujita Aprimorada, ou Escala EF, que entrou em operação em 1º de fevereiro de 2007 nos Estados Unidos, é usada para atribuir uma classificação a um tornado com base nas velocidades estimadas do vento e nos danos associados.
Quando os danos causados por um tornado são analisados, eles são comparados a uma lista de Indicadores de danos (Damage Indicators – DIs) e Graus de Dano (Degrees of Damage – DoD), o que ajuda a estimar melhor a faixa de velocidade dos ventos provavelmente produzidos pelo tornado. A partir disso, é atribuída uma classificação de EF0 a EF5.
O que é um tornado
Os tornados são fenômenos meteorológicos extremos e destrutivos caracterizados por colunas de ar em rotação intensa que se estendem da base de uma tempestade para a superfície da Terra.
Esses redemoinhos violentos são conhecidos por sua capacidade devastadora, capaz de causar grande destruição em segundos a minutos. A escala Fujita, frequentemente usada para classificar a intensidade de tornados, varia de F0 a F5, sendo F5 o mais poderoso.
Os tornados geralmente se formam em áreas onde massas de ar quente e úmido encontram massas de ar frio e seco, criando condições ideais para o desenvolvimento desses vórtices.
Tornados ocorrem em muitas partes do mundo, incluindo Austrália, Europa, África, Ásia e América do Sul. Até a Nova Zelândia relata cerca de 20 tornados por ano. Duas das maiores concentrações de tornados fora dos Estados Unidos são nas latitudes médias da América do Sul e em Bangladesh.
Cerca de 1.200 tornados atingem os Estados Unidos anualmente. Como os registros oficiais de tornados datam apenas de 1950, não se sabe o número médio real de tornados que ocorrem a cada ano. Além disso, os métodos de detecção e relato de tornados mudaram muito nas últimas décadas, o que significa que a estatística hoje considera tornados que no passado não entrariam na contabilidade. O Brasil não possui um banco de dados robusto sobre estas ocorrências no país ao longo da história e projetos de verificação e contabilidade de eventos são incipientes.
Com produção e edição de Alexandre Aguiar

