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As águas do Mar Mediterrâneo registraram temperatura superficial recorde na segunda-feira. O superaquecimento das águas do mar entre o Sul da Europa e o Norte da África acompanha um padrão atmosférico que traz temperatura extremamente elevada com onda de calor brutal que assola países como Grécia e Itália.

ICAT

Segundo cientistas do Instituto de Ciências do Mar (ICM) de Barcelona, ​​​​a temperatura média diária da superfície do mar no Mediterrâneo atingiu 28,71ºC na segunda-feira, um nível nunca antes registrado.

A temperatura do ar no Sul da Itália alcançou 48ºC na Sicília, desencadeando onda de incêndios na região de Palermo. A Grécia, com temperaturas de até 45ºC, sofre atualmente graves incêndios florestais. A temperatura se aproximou também de 50ºC no Norte da África.

Na Itália, ao menos cinco pessoas morreram devido aos fortes incêndios na Sicília e tempestades violentas no Norte, o que levou o governo a declarar estado de emergência nas áreas mais afetadas. Os corpos carbonizados de dois idosos foram encontrados dentro de uma casa destruída pelas chamas e uma mulher de 88 anos morreu perto de Palermo, informou a imprensa local nesta terça.

Na Croácia, um incêndio foi declarado ontem perto da turística localidade de Dubrovnik. Na ilha francesa de Córsega, os bombeiros combateram um incêndio na noite de terça, mas a situação melhorou.

Já na Argélia, as chamas que se propagavam no Nordeste do país foram extintas, mas provocaram 34 mortes. Também houve incêndios em Portugal, na orla do Atlântico, onde oito bombeiros ficaram feridos e centenas trabalhavam nos arredores de Sintra, popular destino de férias ao Noroeste de Lisboa.

O aquecimento das águas superficiais do Mar Mediterrâneo tem fortes impactos nos equilíbrios marinhos, sublinha Delphine Thibault, investigadora do Instituto Mediterrâneo de Oceanologia, com sede em Marselha, que conversou a agência AFP.

Este recorde anunciado é o símbolo do inevitável aquecimento do Mediterrâneo?

Thibault: Desde o ano passado vemos o aquecimento do Mediterrâneo. Comparamos as curvas de temperatura da água de superfície entre o ano passado, que foi realmente um ano de onda de calor, e este ano, e a tendência parece estar se repetindo, (mesmo que) seja difícil dizer na escala do Mediterrâneo todo.

A temperatura da água depende da temperatura do ar, mas também depende do movimento das correntes marítimas e tivemos condições meteorológicas bastante particulares com correntes de Sul que tendiam a trazer de volta as águas quentes e a reaquecer localmente. Então parte dela está certamente ligada às alterações climáticas e também a essas alterações das correntes que se podem observar nas águas superficiais do Mediterrâneo, mas também no Atlântico.

Quais são os impactos já registrados e esperados sobre a biodiversidade?

Thibault: A onda de calor marinha em julho e agosto do ano passado trouxe temperatura alta na superfície, mas também na profundidade, até trinta e quarenta metros, que foi muito alta e que levou à mortalidade em massa de organismos como vermelho gorgônias (espécie de coral) que estão muito impactados. Estamos com 85% a 90% de mortalidade dessas gorgônias no Mediterrâneo ocidental. Isso aumentará as mortalidades do ano passado? Certamente se as temperaturas permanecerem muito altas.

O Mediterrâneo é aquilo a que se chama um “hotspot” de biodiversidade, um mar muito, muito rico em espécies, mas também uma região fortemente impactada pelas espécies invasoras que podem vir do Mediterrâneo oriental ou do Sul do Mediterrâneo, mas também de além, do Mar Vermelho, por exemplo. E sabemos que o aumento das temperaturas favorecerá a chegada dessas espécies à paisagem mediterrânea francesa e que muito rapidamente elas poderão se acostumar, se estabelecer, até suplantar as espécies locais e modificar o funcionamento de nossos ecossistemas.

Infelizmente o oceano é um sistema tridimensional onde não podemos intervir, as espécies são transportadas pelas correntes ou vêm sozinhas se tiverem capacidade de nadar, não podemos colocar barreiras. Todo o sistema oceanos, atmosfera e terra deve recuperar um funcionamento muito mais equilibrado.

Paradoxalmente, na região de Marselha a água está fria no momento. Por quê?

Thibault: O Mediterrâneo é complicado, existem várias áreas diferentes. E a zona de Marselha está sujeita ao Mistral (vento seco vindo do Norte), e mesmo que não seja muito bom para o risco de incêndio, é muito bom para ambientes marinhos porque vai expulsar as águas quentes para o mar e trazer de volta as águas frescas. Em dois dias se passou de uma temperatura de 25ºC à superfície para 17ºC e isso é bom, porque vai dar vida a estas espécies marinhas que estão bastante habituadas a estas variações de temperatura e vão poder evoluir em temperaturas mais favorável a elas