Olhares atentos à geleira San Rafael, na região de Aysen, Sul do Chile, que teve o derretimento que é um fenômeno natural acelerado significativamente pelas mudanças climáticas | PABLO COZZAGLIO/AFP/METSUL METEOROLOGIA

O ritmo de derretimento das geleiras no Sul do Chile assusta os cientistas. Uma rachadura atravessa a frente da geleira San Rafael e um bloco de gelo do tamanho de um prédio de dez andares desaba no lago em mais um dia de degelo na região. No Sul do Chile, as geleiras são um “excelente indicador” do efeito das mudanças climáticas.

Centenas de blocos de gelo flutuam à deriva na lagoa San Rafael, cuja superfície é um exemplo visível do aumento desproporcional do derretimento das 39 geleiras que emanam do Campo de Gelo do Norte, na região Sul de Aysén. Juntamente com o Campo de Gelo do Sul, eles formam a terceira maior massa de gelo do mundo, atrás apenas da Antártida e da Groenlândia.

Os 3,5 mil quilômetros quadrados de superfície congelada do Campo de Gelo do Norte, somados aos 11 mil quilômetros quadrados do Campo de Gelo do Sul representam 63% da superfície glacial do Chile. Há 150 anos, a língua da geleira andina San Rafael se estendia em forma de cogumelo cobrindo dois terços da lagoa, mas agora a frente que se rompe (a parede da geleira) retrocedeu 11 quilômetros em direção ao interior do vale e não aparece mais no lago.

Este é um fenômeno que também ocorre em praticamente todas as 26.000 geleiras do país, apenas duas cresceram, explica Alexis Segovia, de 42 anos, glaciologista da Unidade de Glaciologia e Neve da Direção Geral de Águas (DGA) do Chile. “As geleiras são um indicador por excelência das mudanças climáticas porque são gelo e reagem a temperaturas mais altas”, diz o especialista. Além disso, essas superfícies “devolvem muita radiação que chega à Terra” e, se continuarem diminuindo, o planeta “aquecerá mais rápido”, afirma.

No lado oposto do Campo de Gelo do Norte, a geleira Exploradores encolhe irremediavelmente, explica à AFP Andrea Carretta, uma italiana de 45 anos que é guarda florestal nesta área há cinco anos. “Está piorando a cada dia porque a geleira está recuando e no verão está perdendo 13 centímetros por dia de gelo. No inverno está perdendo entre 2 e 3 centímetros”, explica.

“Não tem como voltar”, lamenta diante da enorme extensão de gelo de cinco quilômetros de largura e 22 quilômetros de comprimento – e que todo dia amplia sua moreia – algo como os “restos” da geleira quando derrete e acumula pedras. Seu gelo está derretendo rapidamente. As geleiras “são um termômetro, instrumentos onde vamos perceber logo após os efeitos das mudanças climáticas”, diz Carretta. –

O derretimento de uma geleira é um fenômeno natural que a mudança climática acelerou “significativamente”, declarou à AFP Jorge O’Kuinghttons, de 45 anos, chefe da Unidade Regional de Glaciologia da DGA. A menor precipitação e o aumento da temperatura devido às mudanças climáticas levam ao derretimento do gelo nas laterais da geleira.

Com isso, formam-se lagos que aumentam em número e volume com o passar do tempo. Represadas pelo gelo, as lagoas acabam sendo descarregadas abruptamente, gerando uma imensa inundação chamada ‘inundação por transbordamento do lago glacial’ (‘GLOF’), explica o cientista.

No início de 2010, um ‘GLOF’ gerado na geleira Exploradores desencadeou um transbordamento de água que causou uma inundação de 10 metros de altura e, embora não tenha deixado vítimas, acabou inundando casas, plantações e gado. No Peru, na década de 1950, um fenômeno semelhante ocorreu na geleira Blanco, deixando aproximadamente 5 mil mortos.