Granizo caiu em grande quantidade e chegou a acumular em pontos do município gaúcho de Vacaria no final da quarta-feira | GLÁUCIO ZINGALLI

O inverno começou na terça-feira e seu principal protagonista neste início de estação é o gelo. Não o da neve ou da geada com temperatura muito baixa, mas o granizo que atingiu dezenas de cidades do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina no primeiro e no segundo dia da nova estação com danos em algumas localidades pelo tamanho das pedras. Em algumas cidades o granizo caiu com tanta intensidade que chegou a acumular.

Na terça, o granizo afetou grande número de municípios do Noroeste e o Norte do Rio Grande do Sul e diversas regiões de Santa Catarina, como o Oeste, o Meio-Oeste, o Planalto Sul, o Alto Vale do Itajaí e a área da Grande Florianópolis. No município catarinense de Chapecó, o granizo chegou a ter médio a grande tamanho, o que resultou em danos em mais de 300 residências. O município decretou situação de emergência pela tempestade.

Já ontem, o fenômeno foi mais observado no território gaúcho com ocorrências principalmente do Centro para o Norte do estado a partir de fortes áreas de instabilidade que se formaram da tarde para a noite. Caiu granizo em cidades do Centro gaúcho, dos vales, Grande Porto Alegre, Serra, Aparados, Planalto Médio e no Noroeste.

O granizo ocorre a partir de nuvens de maior desenvolvimento vertical e que foram abundantes entre terça-feira e ontem nos estados gaúchos e catarinense. Muitas células de tempestade se formaram nos dois dias com registro de temporais que não apenas causaram granizo, mas que também trouxeram vendavais com danos e ainda muita chuva com volumes acima de 150 mm em algumas cidades, o que levou a alagamentos e cheias de rios.

A resposta para a pergunta sobre o porquê de tanto granizo neste começo de inverno está, na maior parte, no perfil de temperatura da atmosfera. Como se sabe, ar quente é “combustível” para instabilidade. No último fim de semana, o Sul do Brasil estava sob influência de uma massa de ar frio que trouxe as menores mínimas do ano em Porto Alegre e no interior no domingo com quase 7ºC abaixo de zero na Serra do Sudeste.

Aí, o que aconteceu? Ar muito quente em altitude começou a avançar para o Sul do Brasil entre segunda e terça, trazido por uma corrente de jato (vento) em baixos níveis da atmosfera que se originou na Bolívia e no Centro-Oeste. O ar quente, ao encontrar a massa de ar frio, formou o que se chama de frente quente, fenômeno comum em junho. Frentes quentes tradicionalmente resultam em temporais e, principalmente, de granizo. E foi exatamente o que ocorreu!

Como o ar frio sobre a Argentina, o Uruguai e o Sul gaúcho não conseguiu avançar, e ar quente seguiu avançando para a Metade Norte gaúcha, o contraste entre as duas massas de ar tornou a formar nuvens carregadas de tempestades com muitos raios e granizo na quarta-feira. Ontem, para se ter uma ideia, enquanto cidades do Sul gaúcho tiveram uma tarde com 13ºC, cidades do Médio Uruguai do Rio Grande do Sul anotaram até 25ºC e no Sudoeste do Paraná chegou a fazer 30ºC na área de Foz do Iguaçu.

Modelos numéricos conseguiram antecipar com precisão o alto risco de granizo. Entre as muitas variáveis do modelo de alta resolução WRF da MetSul, disponível ao assinante na nossa seção de mapas, está a probabilidade granizo hora a hora para até 72 horas. Os dados apontavam a probabilidade de granizo do Centro para o Norte do Rio Grande do Sul na tarde de quarta-feira, o que acabou por se confirmar.

Hoje, ar mais frio começa a avançar até o Centro gaúcho, o que vai reduzir o risco de queda de granizo na maior parte do Rio Grande do Sul. A possibilidade do fenômeno, embora menor que nos últimos dois dias, se concentrará mais hoje em Santa Catarina e de forma muito isolada a partir de células de instabilidade que podem se formar com a temperatura mais alta.

Há referências históricas que na atuação do fenômeno La Niña, como é o caso deste inverno com Pacífico muito mais frio que o normal para esta época do ano, que há um aumento das ocorrências de granizo no Sul do Brasil pela atmosfera resfriada. Esta influência da La Niña na ocorrência de granizo é especialmente documentada em meses do final do inverno e da primavera com danos às vezes expressivos para a agricultura.