A atmosfera de todo o planeta é uma só e que o ocorre numa parte do globo terrestre acaba por repercutir em locais distantes. Uma cadeia de eventos extremamente complexa acaba por ter desdobramentos por todo o mundo. E isso tem muito de Matemática e se explica pelo que se chama de teoria do caos.
No ano de 1961, o meteorologista dos Estados Unidos Edward Lorenz trabalhava em um modelo matemático para a previsão do tempo. Para isso, ele introduziu no seu computador dados como temperatura, umidade, pressão e direção do vento e observou os resultados. Em seguida, introduziu novamente os mesmos dados para conferir os resultados.
Com os mesmos dados, nos dois testes que fez, a segunda previsão do tempo foi muito distinta da primeira. Inicialmente, as duas previsões se assemelhavam, entretanto à medida que o modelo avançava no tempo com mais dias, as diferenças entre os dois resultados aumentavam.
Isso ocorreu porque na segunda vez o computador havia arredondado os dados e considerou algumas casas decimais a menos. Assim se percebeu que algumas poucas casas decimais aparentemente insignificantes, ao longo do tempo, podem ocasionar enormes alterações. Para Lorenz, era como dizer que o vento que causa o bater de asas de uma borboleta no Brasil pode ocasionar um tornado no Texas, nos Estados Unidos.
Assim nascia a teoria do caos com seu efeito borboleta, indicando que variações muito pequenas podem parecer insignificantes, mas gerarão enormes mudanças ao longo do tempo, provocando uma sensação de caos.
Então, a atmosfera opera exatamente assim. Veja que a intensa massa de ar frio que chegará ao Brasil no começo de novembro será favorecida por duas condições relativamente distantes do território brasileiro: o comportamento de ventos perto do Polo Sul com uma queda da Oscilação Antártica e o resfriamento das águas equatoriais do Oceano Pacífico, a famosa La Niña.
Um desdobramento do frio do começo de novembro no Brasil e outros países pode ser algo que normalmente não poderia ser esperado, um ciclone tropical no Caribe. A massa de ar frio de enorme intensidade e abrangência que avançará pela América do Sul com pressão atmosférica muito acima da média induzirá uma diminuição da pressão atmosférica em parte do Atlântico Norte, no Caribe, ao Norte da América do Sul, gerando maior instabilidade.
A conexão foi estabelecida numa publicação em suas redes sociais pelo meteorologista norte-americano Eric Webber. De acordo com ele, o grande centro de alta pressão sobre a América do Sul com valores de pressão atmosférica muito acima da média pode induzir a formação do que se denomina de uma Onda Kelvin atmosférica acoplada à convecção sobre o Caribe que pode levar à formação de um ciclone tropical entre o começo e a metade de novembro na região.
Classic South America cold/pressure surge triggering a convectively coupled Kelvin wave in the tropical Atlantic later in week 2. Perhaps this opens the door for (another ?) late-season tropical cyclone in early-mid Nov
I’m honestly mad at myself I didn’t see this sooner pic.twitter.com/va3olnn2Vm
— Eric Webb 🇺🇦 🇺🇸 (@webberweather) October 28, 2022
Mas não para por aí. Na avaliação do meteorologista norte-americano Eric Webber, a Onda Kelvin atmosférica anômala que vai se formar no Atlântico Norte em consequência da grande massa de ar frio de alta pressão pode alterar o comportamento do bloqueio atmosférico na Escandinávia, levando a uma mudança no padrão de circulação de ventos no Atlântico Norte e alterando o comportamento das primeiras massas de ar frio de inverno no Hemisfério Norte daqui a três ou quatro semanas em verdadeira efeito-cascata.
Ondas Kelvin atmosféricas acopladas à convecção são perturbações atmosféricas tropicais que no caso do Atlântico Norte e da África se propagam. Variações na nebulosidade associadas a estas ondas ocorrem em latitudes da climatologia da chamada Zona de Convergência Intertropical, uma faixa que circunda grande parte do planeta com maior instabilidade ao redor da linha do equador, em regra entre 5ºN e 15ºN e que se posiciona mais ao Norte ou ao Sul de acordo com a estação do ano.
À medida que uma onda Kelvin atmosférica acoplada à convecção se move ela aumentará a instabilidade, gerando mais convecção, ou seja, a formação de mais nuvens que trazem chuva ou tempestades por conta do ar quente e úmido. Maior convecção é o ambiente favorável nas regiões tropicais do Atlântico Norte para que uma onda na atmosfera se organize em um centro de baixa pressão fechado e evolua no ambiente convectivo para um ciclone tropical, seja uma tempestade tropical ou mesmo um furacão nos casos mais extremos.
Por isso, os meteorologistas prestam muita atenção nas ondas tropicais que deixam a África e avançam para Oeste. Uma das áreas que mais recebe atenção responde pela sigla MDR. O período da climatologia entre agosto e outubro, com as águas mais quentes, marca o auge da temporada de furacões e ciclones tropicais são bastante frequentes no Atlântico Norte.
Vários fatores contribuem para o aumento sazonal dos ciclones tropicais que começa em agosto: Primeiro, as ondas de Leste que surgem da África são mais organizadas e fortes, em regra servindo como o ponto de partida para a formação de tempestades tropicais e furacões no Atlântico Norte.
As que mais preocupam são as que surgem perto de Cabo Verde na chamada Main Development Region (MDR), uma área em que as ondas (áreas de menor pressão atmosférica) costumam dar origem a alguns dos mais intensos furacões que depois alcançam a América Central e os Estados Unidos.