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Era uma vez um Papa chamado “O Papa Verde”. Ele ganhou o título tanto dos religiosos quanto dos seculares porque escrevia com frequência sobre o meio ambiente e pedia a todos os católicos que fossem melhores administradores da criação de Deus.

Sob o pontificado deste papa, o Vaticano se tornou o primeiro estado soberano do mundo a se tornar neutro em carbono, o que significa que todas as emissões de gases de efeito estufa do pequeno país são compensadas por energias renováveis e créditos de carbono, graças a árvores extras e painéis solares.

Ele também fez uso de um papamóvel parcialmente elétrico e mais eficiente em termos de energia. Não, “O Papa Verde” não é o Papa Francisco. É seu predecessor, o Papa emérito Bento XVI, o que pode ser uma surpresa para aqueles que acreditam que o legado de Bento foi seu firme conservadorismo.

O que não há dúvida é que Bento XVI, que hoje morreu aos 95 anos, foi progressista no que diz respeito ao meio ambiente, posicionando-se contra as mudanças climáticas, promovendo as energias renováveis e apelando a uma comunhão mais estreita entre os católicos e a natureza.

Dirigindo-se aos estudantes italianos em 2011, ele os convocou a se tornarem “guardiões da natureza” e seguirem os passos de São Francisco de Assis, padroeiro da ecologia. “Hoje, mais do que nunca, ficou claro que o respeito ao meio ambiente não pode esquecer o reconhecimento do valor da pessoa humana e sua inviolabilidade em todas as fases e condições da vida”, afirmou.

“Respeito pelo ser humano e respeito pela natureza são um só, mas ambos podem crescer e encontrar sua justa medida se respeitarmos no ser humano e na natureza o Criador e sua criação. Nisso, queridos jovens, creio encontrar em vocês aliados, verdadeiros “guardiões da vida e da criação”, disse.

Antes da Conferência do Clima de Copenhague de 2009, Bento XVI convocou os líderes mundiais a “promover um desenvolvimento conjunto baseado na dignidade humana e para o bem comum”. Lamentou atitudes “egocêntricas e materialistas” predominantes na sociedade, apontando para a crise financeira global como prova de que a humanidade havia perdido o rumo.

Transformação do Vaticano

Em seu exercício, o papa emérito não mediu esforços para levar ações de sustentabilidade à Igreja. Conhecido entre os ambientalistas como “Papa Verde”, o líder católico publicou textos sobre a preservação do meio ambiente e tocou no assunto durante várias pregações, considerando a degradação da natureza um pecado da atualidade, uma vez que, para a Igreja, a conservação do planeta para as futuras gerações é uma obrigação moral dos homens.

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Não foi só nas pregações que o cardeal Joseph Ratzinger se uniu à sustentabilidade. O Papa conseguiu tornar a sede da Igreja livre de emissões de carbono e ordenou a instalação de sistemas de energia fotovoltaica, transformando o Vaticano no Estado mais verde do mundo.

Até o Papamóvel entrou na onda ecologicamente correta. O carro do papa emérito era híbrido e seguido por batedores que conduziam dois veículos elétricos. Durante seu exercício, Ratzinger organizou um encontro científico para abordar o aquecimento global e as mudanças climáticas. Além disso, o líder católico publicou “O Meio Ambiente”, livro que aborda os desafios da preservação ambiental.

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No entanto, o Papa Emérito não foi o primeiro líder católico a levar em consideração o desenvolvimento sustentável do planeta: a Igreja Católica começou a prestar atenção na sustentabilidade nos anos 1990, quando o papa João Paulo II reforçou a importância da preservação do meio ambiente para evitar desastres naturais. Ao longo de seu papado, o polonês Karol Wojtyla pronunciou-se publicamente na conferência Rio 92 e durante a Rio + 10, ocorrida em 2002.

A mensagem de Ano Novo de 2010

Um dos mais conhecidos pronunciamentos (leia a íntegra) sobre o ambiente de Bento XVI ocorreu em 2010. Durante a celebração do Dia Mundial da Paz em 2010, o Papa Bento XVI escolheu o tema “Se você quer cultivar a paz, proteja a criação”. As palavras do pontífice sobre a preservação do planeta e o clima foram duras e contundentes.

“Como ficar indiferente perante problemas como as alterações climáticas, a desertificação, a degradação e perda de produtividade de vastas áreas agrícolas, a poluição de rios e aquíferos, a perda de biodiversidade, o aumento das condições climatéricas extremas e a destruição de florestas de áreas equatoriais e tropicais?” ele perguntou.

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“Como ignorar o crescente fenômeno dos chamados ‘refugiados ambientais’, ou seja, pessoas que, devido à degradação ambiental, têm que sair – muitas vezes junto com seus pertences – em uma espécie de deslocamento forçado, para escapar dos riscos e o desconhecido? Como não reagir aos conflitos já em curso, bem como aos potenciais novos, ligados ao acesso aos recursos naturais?”

“São todas questões – disse Bento XVI – que têm um impacto profundo no exercício dos direitos humanos, como o direito à vida, à alimentação, à saúde e ao desenvolvimento”, afirmou o pontífice que hoje morreu aos 95 anos após longos anos de problemas de saúde.

Cardeal Ratzinger e dupla de papas

O papa emérito Bento XVI, um teólogo alemão que surpreendeu o mundo ao renunciar ao seu pontificado em 2013, faleceu neste sábado, anunciou o Vaticano. “Com pesar informo que o Papa Emérito Bento XVI faleceu hoje às 9h34, no Mosteiro Mater Ecclesiae, no Vaticano. Assim que possível, serão enviadas novas informações”, disse o diretor do serviço de imprensa da Santa Sé, Matteo Bruni, em um comunicado.

O Vaticano também anunciou que o Papa Francisco presidirá o funeral, em 5 de janeiro. Será a primeira vez na história milenar da Igreja Católica que um papa em exercício enterrará outro papa. Dezenas de milhares de pessoas são esperadas, incluindo chefes de estado e líderes de outras religiões, ao funeral do 265º papa da história.

O corpo de Bento XVI estará exposto a partir de segunda-feira, dia 2, na Basílica de São Pedro para receber o último adeus dos fiéis. Pouco antes das 11h locais (7h em Brasília), os sinos da basílica tocaram pela morte de Bento, enquanto centenas de pessoas foram à praça para recordar a figura de Joseph Ratzinger, um refinado teólogo ultraconservador que escolheu o nome de Bento XVI depois de ter sido nomeado chefe da Igreja Católica, em 2005.

Sua saúde se deteriorou nos últimos dias, embora o Vaticano tenha dito, na sexta-feira, que ele se encontrava em condição “estável” e que havia participado, na véspera, de uma missa celebrada em seu quarto no mosteiro vaticano.

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Sua morte põe fim à inusitada coexistência de dois papas, ambos de batina branca: o alemão Ratzinger, um brilhante teólogo ultraconservador e pouco popular entre as multidões; e o argentino Jorge Bergoglio, um jesuíta que quis construir um papado dedicado aos pobres e aos migrantes.

Ratzinger, o primeiro papa alemão da era moderna, substituiu em 2005 o carismático João Paulo II, de quem havia sido braço direito por um quarto de século como chefe da Congregação para a Doutrina da Fé, o antigo Santo Ofício da Inquisição. Seu pontificado de oito anos foi marcado por escândalos e intrigas dentro da Igreja.

Depois de renunciar, Bento XVI prometeu manter uma aposentadoria absoluta, sem fazer sombra a seu sucessor, o Papa Francisco. Esteve, no entanto, envolvido — em alguns casos, involuntariamente, segundo observadores — nas campanhas dos setores ultraconservadores que veem com maus olhos as aberturas do pontífice argentino no campo social.