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O Bureau de Meteorologia da Austrália declarou que um episódio de La Niña está atualmente em curso no Oceano Pacífico. O anúncio do BoM ocorreu um mês depois que a Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera (NOAA), dos Estados Unidos, fez anúncio idêntico.

Por que os australianos apenas um mês depois identificaram a presença do fenômeno La Niña no Pacífico? NOAA e BoM adotam critérios diferentes. Enquanto a agência climática oficial dos Estados Unidos considera como parâmetro mínimo de resfriamento para caracterizar La Niña anomalias de temperatura da superfície do mar de -0,5ºC, a “régua” australiana é mais alta e exige um resfriamento de ao menos -0,8ºC no Pacífico Equatorial Central, a chamada região Niño 3.4.

O Chefe de Serviços Climáticos Operacionais do Bureau de Meteorologia da Austrália, Dr. Andrew Watkins, disse que normalmente durante os eventos La Niña as chuvas se concentram no Pacífico tropical ocidental, levando a um período mais úmido do que o normal nas partes Leste, Norte e Central da Austrália.


O fenômeno La Niña também aumenta a chance de temperaturas mais frias do que a média durante o dia em grandes partes da Austrália e pode aumentar o número de ciclones tropicais que se formam no país, advertiu o BoM.

“O último La Niña significativo foi 2010-12. Este forte evento teve grandes impactos em toda a Austrália, incluindo os períodos de dois anos mais chuvosos da Austrália registrados, e inundações generalizadas”, afirmou Andrew Watkins.

Sobre o chamado double dip La Niña, ou seja, dois eventos seguidos, o meteorologista australiano comentou que não são incomuns com cerca de metade de todos os eventos anteriores retornando para um segundo ano. Watkins enfatizou que o evento deste ano não está previsto para ser tão forte quanto o evento de 2010-12 e pode até ser mais fraco do que no evento La Niña de 2020-21, o que a MetSul discorda por entender que este evento de agora será um pouco mais forte que o último.

O Bureau de Meteorologia da Austrália havia emitido um aviso de probabilidade de La Niña em 14 de setembro e um alerta de ocorrência do fenômeno em 12 de outubro. É provável que a La Niña persista até pelo menos o final de janeiro de 2022, mas a MetSul e a NOAA projetam que o fenômeno atue ao menos até o final do verão ou o começo do outono.

Impactos da La Niña na agricultura do Sul do Brasil

De acordo com a última análise, o trimestre atual de outubro a dezembro tem 99% de probabilidade de La Niña e 1% de neutralidade. O fenômeno foi declarado pela NOAA na metade do mês passado. Para o trimestre de novembro a fevereiro que recém começa, 97% de probabilidade de La Niña e 3% de neutralidade.

Já para o trimestre de dezembro a fevereiro, portanto o do verão climático, e de enorme importância para a agricultura o setor de turismo, a probabilidade é de 92% de atuação do fenômeno La Niña e 8% de neutralidade. Isso significa que o fenômeno terá impacto no regime de chuva no Brasil e alterará o padrão de circulação geral da atmosfera no planeta durante o verão meridional e o inverno setentrional.

A grande preocupação neste fim de ano é com a cultura do milho no setor primário do Rio Grande do Sul. Muitos produtores têm relatado já que a chuva bastante irregular das últimas semanas já começa a afetar a safra.

Uma vez que os dias ficarão cada vez mais quentes, a perda de umidade será mais acelerada no solo e a chuva tende a ficar ainda mais irregular neste fim de ano, os riscos para o milho gaúcho são bastante altos e se espera quebra de produção em diferentes locais.

O que é a La Niña

A La Niña se caracteriza pelo resfriamento das águas superficiais da faixa equatorial do Oceano Pacífico com a alteração do regime de vento na região que impacta o padrão de circulação geral da atmosfera em escala global, inclusive no Brasil. Quando há um evento de La Niña há uma tendência de a Terra esfriar ou na fase atual de apresentar aquecimento menor que haveria estivesse sob El Niño.

No caso do Rio Grande do Sul, há estudos mostrando efeitos em produtividade agrícola pelas diferentes fases do Pacífico. Estes trabalhos levam em conta décadas de dados. Quando sob neutralidade a produtividade ficou acima da média em um terço dos anos, abaixo da média em outro terço e acima no terço restante.

Sob El Niño, a tendência maior foi de aumento de produtividade e com La Niña verificou-se uma probabilidade maior de perdas na produção. Há uma propensão a se fazer uma correlação entre El Niño e mais chuva no Sul do Brasil e La Niña a um maior risco de estiagem, mas esta é uma fórmula distante de correta e existem muitas ressalvas a serem feitas do ponto de vista histórico.

Nenhum evento de La Niña é igual ao outro. Apesar de a grande maioria das estiagens no Sul do país ter ocorrido sob neutralidade ou La Niña, a maior seca do Rio Grande do Sul neste século, em 2005, se deu com o Pacífico Equatorial oficialmente numa condição de El Niño. Da mesma forma já houve muitos meses bastante chuvosos e até enchentes durante episódios de La Niña.

No caso do último verão, por exemplo, a MetSul enfatizava que o evento de La Niña poderia trazer estiagem, como ocorreu com perdas no milho no começo da estação e pode se repetir agora no final de 2021, mas a mesma previsão indicava que janeiro poderia ser mais chuvoso do que a média, o que beneficiaria o ciclo de soja.

Até porque, sob La Niña, a média dos dados das últimas décadas mostra uma maior propensão para chuva acima da média do que abaixo da média durante o mês de janeiro na maioria dos anos em parte do Rio Grande do Sul. Assim, La Niña nem sempre é certeza de estiagem no Sul do Brasil nem tampouco de chuva acima da média mais ao Norte e o Nordeste do Brasil.

O que o fenômeno faz sim é aumentar a probabilidade de ocorrência destes cenários nas diferentes regiões do país. Por isso, se instalando um evento na primavera, aumenta muito o risco de estiagem no Sul do país no próximo verão.

Por fim, da mesma forma que não se pode fazer associação linear entre La Niña e seca ou El Niño e enchentes, a intensidade do fenômeno também não é o melhor parâmetro. Os dados históricos revelam que já houve casos de estiagens mais graves em eventos de La Niña fraco que sob forte a intenso.

Isso se explica porque o Pacífico não é a única variável que influencia na chuva. Outras variáveis como a Oscilação de Madden-Julian (OMJ), a temperatura do Atlântico e a Oscilação Antártica podem atenuar ou aumentar os efeitos da La Niña

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