Uma espessa nuvem de poeira envolve a praça Kahramana, no bairro de Karrada, na capital do Iraque, Bagdá, em 16 de maio de 2022 | SABAH ARAR/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Nove tempestades de poeira atingiram o Iraque em apenas seis semanas nesta primavera do Hemisfério Norte, deixando o céu laranja e mandando milhares de pessoas os hospitais com problemas respiratórios. A mudança climática pode estar por trás destas tempestades de poeira sucessivas, disseram os cientistas que alertam que podem se tornar cada vez mais frequentes a partir de agora.

A Ásia Ocidental não é estranha a tempestades de poeira que podem desencadear problemas respiratórios. “Nos últimos anos, no entanto, sua intensidade e frequência aumentaram”, disse Ramesh Singh, professor da Chapman University. Elas são geralmente impulsionadas por fortes ventos que sopram nos desertos da região. Os ventos levantam poeira da bacia do Tigre-Eufrates da Síria e do Iraque e a transportam para o Golfo Pérsico e a Península Arábica, afirmou estudo.

O Iraque, que fica no topo do Golfo Pérsico, ajuda a canalizar os ventos, disse Priyanka Banerjee, da Faculdade INSPIRE do Centro Divecha para Mudanças Climáticas do Instituto Indiano de Ciência. A temporada de poeira este ano, porém, é mais intensa e frequente do que o habitual, comentou. Vários fatores contribuem para esta primavera de muitas tempestades de poeira, mas um em especial é o fenômeno La Niña.

A La Niña influencia a temporada de furacões, aumenta a chance de seca em algumas regiões e desencadeia intensas tempestades de poeira no Oeste da Ásia. A La Niña atual já dura dois anos e deve chegar ao terceiro ano. Quando há La Niña continuamente, o inverno é mais seco no Oriente Médio, o que acaba afetando a estação da poeira no ano seguinte. Entre dezembro de 2021 e fevereiro de 2022, a região teve pouca chuva. Com a La Nina, o solo também perde umidade. A areia seca levanta mais facilmente no ar, gerando maiores tempestades de poeira.

Os cientistas pensam que as mudanças climáticas podem ter sido também um fator importante no aumento da frequência e intensidade dessas tempestades. Mudanças de longo prazo na temperatura do ar, precipitação, velocidade do vento, umidade do solo e umidade relativa devido às mudanças climáticas podem alimentar as tempestades de poeira.

Uma queda drástica na taxa anual de chuvas devido às mudanças climáticas pode alterar a frequência de tempestades de areia e poeira, mostraram estudos. Mudanças ambientais como a seca de pântanos, degradação da terra e desertificação também são responsáveis, de acordo com um relatório. A seca é outro ingrediente potente nessas tempestades.

Outras atividades humanas também são consideradas pelos especialistas que analisaram estas sucessivas tempestades de poeira das últimas semanas. “A construção industrial de barragens enfraquece os cursos d’água em toda a região, aumentando a gravidade das secas. A diminuição da água subterrânea e a má gestão da água são contribuintes significativos, dizem. Sistemas de irrigação com uso intensivo de água usados ​​ao longo da fronteira iraniana-iraquiana também são um fator, conforme os estudiosos.

Pastores beduínos cujos animais foram proibidos de entrar na província de Najaf devido à propagação da febre hemorrágica da Crimeia-Congo, caminham ao lado de seu rebanho pastando na área de al-Henniyah, fora de Najaf, Iraque, durante uma tempestade de areia varrendo o país nesta segunda-feira | QASSEM AL-KAABI/AFP/METSUL METEOROLOGIA

O Iraque sofreu uma grande perda de terras agrícolas e rurais e as Nações Unidas descobriram que até 31% da superfície do Iraque é desértica. Hoje, 39% do Iraque sofre com desertificação e outros 54% do território estão em perigo. A drenagem de banhados preocupa. O Iraque perdeu até 90% de seus pântanos e banhados até o ano 2000, de acordo com a Wetlands International, uma organização sem fins lucrativos.

Em entrevista coletiva, Jassim al-Falahi, ministro do Meio Ambiente do Iraque, citou um relatório do Conselho Nacional de Inteligência dos Estados Unidos que prevê desafios causados ​​por clima em aquecimento, alegando que o Iraque precisa responder urgente à ameaça das mudanças climáticas pois tem influência direta na economia do país. “Isso [o impacto das mudanças climáticas] requer verdadeiro despertar, que inclua todos os aspectos do Iraque, para aumentar a flexibilidade da comunidade iraquiana em relação ao tema das mudanças climáticas”, disse Falahi, acrescentando que o país precisa diversificar suas fontes de renda.

Uma imagem aérea mostra uma vista da cidade de Nasiriyah, no Sul do Iraque, durante uma forte tempestade de areia em 5 de maio de 2022. O Iraque foi novamente coberto por uma espessa camada de ar laranja com a última de uma série de tempestades de poeira que se tornaram cada vez mais comuns. O país foi assolado por uma série de tempestades em abril, impedindo voos e deixando dezenas de pessoas hospitalizadas com problemas respiratórios. | ASAAD NIAZI/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Em 1º de maio, a mesquita do 17º Ramadã na capital iraquiana Bagdá durante uma forte tempestade de areia. Os voos foram suspensos no dia devido à baixa visibilidade nos aeroportos que servem a capital Bagdá e a cidade sagrada xiita de Najaf | AHMAD AL-RUBAYE/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Um policial iraquiano orienta o tráfego durante uma forte tempestade de poeira na capital Bagdá que reduziu muito a visibilidade, mandou milhares para hospitais com problemas respiratórios e afetou o transporte aéreo da região | AHMAD AL-RUBAYE/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Bagdá é uma das cidades mais castigadas pelas sucessivas tempestades de poeira e areias nestes meses de abril e maio | AHMAD AL-RUBAYE/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Visibilidade era limitada em Bagdá e outras cidades iraquianas durante as intensas tempestades de areia com muitos problemas para se dirigir sob a atmosfera laranja que tomou conta tanto de grandes cidades como das regiões desérticas do país | AHMAD AL-RUBAYE/AFP/METSUL METEOROLOGIA

O relatório do conselho, publicado em outubro do ano passado, listou o Iraque como um dos 11 países altamente suscetíveis à ameaça das mudanças climáticas, prevendo um impacto sério e direto na segurança e economia do país.  O ministro também abordou a insegurança hídrica do país, afirmando que há uma pressão crescente sobre as fontes de água do Iraque devido ao grande declínio nas fontes de água e pela falta de chuva, o que levou à significativa degradação da terra e desertificação.

O governo local da província iraquiana de Anbar disse que estaria administrando medidas para erradicar a desertificação estabelecendo oásis agrícolas – ou “cinturões verdes” – para combater tempestades de poeira, de acordo com o assessor de mídia do governador de Anbar, Basem al-Anbari.

O primeiro-ministro Mustafa al-Kadhimi também emitiu um comunicado no início de maio enfatizando a necessidade de ações urgentes para reduzir o impacto das mudanças do clima, expressando o apoio de seu governo a projetos e programas que enfrentem os desafios ambientais. O Ministério do Meio Ambiente do Iraque disse em abril que o número de dias de poeira no país aumentou de 243 para 272 dias por ano nas últimas duas décadas, alertando que isso pode chegar a 300 dias de poeira por ano em 2050.