Dados de anomalia de temperatura da superfície do mar mostram que a janela para a instalação de um evento de La Niña a cada dia fica menor e aquecimento das águas na faixa equatorial tornou ainda mais improvável a declaração de um evento do fenômeno no curto prazo. A tendência, portanto, é a manutenção das condições de neutralidade.
O mapa de anomalia de temperatura da superfície do mar mostra uma “língua” de águas mais frias do que a média na faixa equatorial do Oceano Pacífico, assinatura típica de eventos de La Niña, mas até o momento não foram preenchidos os requisitos para que a agência norte-americana declare um evento do fenômeno.
A anomalia média de temperatura da superfície do mar na região designada para identificar se há El Niño, neutralidade ou La Niña no Pacífico foi de -0,25ºC nas últimas quatro semanas, ou seja, em patamar neutro.
Para que um evento seja declarado, a anomalia média de temperatura da superfície do mar deve estar em ao menos -0,5ºC por várias semanas seguidas e nas últimas quatro semanas apenas uma atingiu esta marca.
Além de a média das últimas semanas da anomalia não estar em patamar de La Niña, outros indicadores ainda não permitiram a declaração do fenômeno. Isso inclui o padrão de ventos alísios na região tropical e o comportamento da chuva na Indonésia, no Pacífico Oeste.
Neutralidade vai persistir
O mais recente boletim mensal da Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera (NOAA), reforçou o entendimento da MetSul Meteorologia de que não se pode garantir a ocorrência de um evento de La Niña nos próximos meses e que, caso ocorra, tende a ser muito fraco e no limite da faixa de neutralidade, além de ser muito breve.
De acordo com a atualização mensal de novembro, para o trimestre de novembro de 2024 a janeiro de 2025 o indicativo da NOAA é de 74% de probabilidade de La Niña, 26% de neutralidade e 0% de El Niño.
Para o trimestre climatológico de verão, de dezembro a fevereiro, as probabilidades de acordo com a NOAA são de 72% de La Niña, 28% de neutralidade e 0% de El Niño. No trimestre de janeiro a março de 2025, as estimativas informadas foram de 61% de La Niña, 38% de neutralidade e 1% de El Niño. Em fevereiro a abril, 46% de La Niña, 52% de neutro e 2% de El Niño.
Já para o trimestre climatológico de outono de 2025, que compreende os meses de março a maio, as estimativas da NOAA são 33% de La Niña, 64% de neutralidade e 3% de El Niño. Para o trimestre abril a junho de 2025, os valores informados foram 26% de La Niña, 67% de neutralidade e 7% de El Niño.
Finalmente, no trimestre de maio a julho do próximo ano, 23% de La Niña, 65% de neutralidade e 12% de El Niño. No trimestre de inverno de 2025, de junho a agosto, a estimativa da NOAA é 20% de La Niña, 60% de neutralidade e 20% de El Niño.
Houve uma marcada mudança em relação ao boletim de outubro nas probabilidade para este último trimestre do ano. No mês passado, a NOAA estimava 71% de probabilidade de La Niña para o trimestre atual de outubro a dezembro e reduziu o valor agora para 57%, aumentando o de neutralidade de 29% para 43%. Contudo, manteve a estimativa acima de 70% para La Niña no trimestre de verão.
Em publicação, a NOAA destaca que “é muito tarde para a La Niña se formar”. A agência norte-americana observa que em sua série histórica de 75 anos do Pacífico, somente dois episódios de La Niña se formaram no trimestre outubro a dezembro.
Qual a previsão da MetSul
Hoje, de acordo com o último boletim da Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera (NOAA), dos Estados Unidos, publicado no começo desta semana, a anomalia de temperatura da superfície do mar no Pacífico Equatorial Central-Leste (região Niño 3.4) está em 0,0ºC. O valor está na faixa de neutralidade (-0,4ºC a +0,4ºC) depois de ter registrado -0,5ºC na semana anterior.
Na semana anterior, a anomalia era de -0,3ºC. E na semana de 23 de outubro o registro era de -0,5ºC. Logo, a região do Pacífico designada para indicar se há La Niña aqueceu 0,5ºC nas últimas quatro semanas, efeito do que se conhece em climatologia como Onda Kelvin com o avanço de águas mais quentes de Oeste para Leste.
Isso se refletiu também na chamada região Niño 1+2, que mede a temperatura do mar na costa peruana. Nesta área do oceano, a anomalia passou a ser até positiva com +0,2ºC na última semana, assim muito distante do que poderia se esperar de uma condição instalada de La Niña.
Se a La Niña vier a ser declarada, o que consideramos cada vez mais duvidoso, a oficialização do começo do fenômeno se daria muito mais tardiamente do que o habitual, normalmente no inverno ou mais tarde no começo da primavera.
Aliás, a tendência, de acordo com o nosso entendimento na MetSul Meteorologia, é de continuidade da fase neutra do Oceano Pacífico ao menos no curto prazo. Embora a NOAA estime probabilidades de até 75% de La Niña, não estamos convencidos na MetSul Meteorologia de uma probabilidade tão alta.
A NOAA tem superestimado as probabilidades de La Niña por meses e não será surpresa alguma se na atualização deste mês de probabilidades para o Pacífico a agência de clima norte-americana reduzir as chances de La Niña e aumentar as probabilidades de fase neutra para os próximos meses.
O que enxergamos para os próximos aponta dois possíveis cenários e são dois justamente porque as condições que esperamos são muito limítrofes, numa faixa muito perto de La Niña e neutralidade, ao redor de -0,5ºC de anomalia.
No primeiro cenário, crescentemente menos provável, um evento de La Niña se instala agora no final da primavera e o começo do verão, mas seria muito fraco e breve com possibilidade ainda de aquecimento do Pacifico Leste na costa peruana que contraporia os efeitos do resfriamento no Pacífico Central.
Já no segundo cenário, que a cada dia parece mais provável, o Pacífico segue em neutralidade, mas com anomalias de temperatura do mar negativas e perto de valores de La Niña, borderline, mas sem um caracterização do fenômeno.
Mesmo se os norte-americanos da NOAA vierem a declarar um declarar um evento de La Niña, o que nos parece crescentemente improvável, muito provavelmente os australianos não o farão. Isso porque o patamar mínimo para La Niña da agência norte-americana (NOAA) é de -0,5ºC enquanto para a agência de Meteorologia da Austrália (BoM) é de -0,8ºC, o que não acreditamos será atingido numa média trimestral.
O que é o fenômeno La Niña e como impacta o Brasil
O fenômeno tem impactos relevantes no sistema climático global, sendo caracterizado por temperaturas abaixo do normal na superfície do Oceano Pacífico equatorial central e oriental. Essa condição contrasta com o El Niño, sua contraparte quente, e faz parte do fenômeno El Niño-Oscilação Sul (ENOS), que influencia os padrões climáticos em todo o mundo.
Durante um evento La Niña, as águas do oceano Pacífico equatorial central e oriental ficam mais frias do que o normal. Isso tem efeitos significativos nos padrões de vento, precipitação e temperatura ao redor do globo. A última vez em que a fase friaesteve presente foi entre 2020 e 2023 com um longo evento do fenômeno que trouxe sucessivas estiagens no Sul do Brasil e uma crise hídrica no Uruguai, Argentina e Paraguai.
No Brasil, os efeitos variam de acordo com a região. O Sul do país geralmente experimenta menos chuva enquanto o Norte e o Nordeste registram um aumento das precipitações. Cresce o risco de estiagem no Sul do Brasil e no Mato Grosso do Sul, embora mesmo com a La Niña possam ocorrer eventos de chuva excessiva a extrema com enchentes e inundações.
Além da chuva, o fenômeno também influencia as temperaturas em diferentes partes do mundo. No Sul do Brasil, o fenômeno favorece maior ingresso de massas de ar frio, não raro tardias no primeiro ano do evento e precoces no outono no segundo ano do episódio. Por outro lado, com estiagens, aumenta a probabilidade de ondas de calor e marcas extremas de temperatura alta nos meses de verão no Sul.
Em escala global, quando o fenômeno está presente há uma tendência de diminuição da temperatura planetária, o que nos tempos atuais significa menos aquecimento da Terra. O aquecimento do planeta, entretanto, foi tamanho recentemente que a temperatura média do planeta hoje em um evento de La Niña forte tende a ser mais alta que em um evento de forte El Niño décadas atrás.
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