O planeta Terra tremia há 20 anos. Um terremoto colossal, um dos maiores da história, seguido de tsunami gigante, também um dos piores da história da civilização humana, sacudiu o globo terrestre e provocou o maior desastre natural deste século com saldo de vítimas oficial que se aproximou de 230 mil pessoas.
Em 26 de dezembro de 2004, às 07:58:53, horário local (0h58 em Brasília), um grande terremoto com magnitude de 9,2–9,3 Mw ocorreu com epicentro na costa Oeste de Aceh, no Norte de Sumatra, Indonésia.
O terremoto submarino de megafalha, conhecido pela comunidade científica como o terremoto de Sumatra-Andamão, foi causado por uma ruptura ao longo da falha entre a placa da Birmânia e a placa Indiana, alcançando uma intensidade de IX na escala de Mercalli em algumas áreas.
Um tsunami massivo, com ondas de até dezenas de metros de altura, conhecido como o Tsunami do Boxing Day, devido ao feriado de Boxing Day, ou como o Tsunami Asiático, devastou comunidades ao longo das costas ao redor do Oceano Índico.
O gigantesco sismo seguido do enorme tsunami causou a morte estimada de 227.898 pessoas em 14 países, com impacto violento em Aceh (Indonésia) e severo no Sri Lanka, em Tamil Nadu (Índia) e em Khao Lak (Tailândia).
Na Indonésia, especialmente na província de Aceh, as ondas destruíram vilarejos inteiros e causaram a maior parte das mortes registradas, ao redor de 230.000 pessoas em toda a região.
Os efeitos diretos causaram grandes interrupções nas condições de vida e no comércio das províncias costeiras dos países afetados. É o desastre natural mais mortal do século XXI, um dos mais mortais da história registrada e o pior desastre de tsunami já registrado. Também é o pior desastre natural da história da Indonésia, Sri Lanka e Tailândia.
Foi o terremoto mais poderoso já registrado na Ásia, o terremoto mais forte do século XXI e, pelo menos, o terceiro mais poderoso já registrado no mundo desde o início da sismografia moderna, em 1900. Ele apresentou a mais longa ruptura de falha já observada, entre 1.200 km e 1.300 km, e a maior duração de falha já registrada, de pelo menos dez minutos.
Grandes terremotos, como o terremoto do Oceano Índico em 2004, estão associados a eventos de megafalha em zonas de subducção. Seus momentos sísmicos podem representar uma fração significativa do momento sísmico global em períodos de escala secular.
De todo o momento liberado por terremotos nos 100 anos entre 1906 e 2005, aproximadamente um oitavo foi causado pelo terremoto do Oceano Índico de 2004. O evento, juntamente com o Grande Terremoto do Alasca (1964) e o Grande Terremoto do Chile (1960), representam quase metade do momento total liberado.
A ruptura sísmica de 1.300 quilômetros deslocou o fundo do mar e provocou a formação de ondas gigantescas que varreram regiões costeiras em países da Ásia e mesmo do Leste da África, onde também houve vítimas.
O terremoto fez o planeta vibrar até 10 mm e também desencadeou terremotos remotos em locais tão distantes quanto o Alasca. Seu epicentro estava entre Simeulue e a Sumatra continental. A situação das pessoas e países afetados gerou uma resposta humanitária global, com doações que totalizaram mais de US$ 14 bilhões (equivalente a US$ 23 bilhões em valores de 2023).
A intensidade e a rapidez do tsunami foram agravadas pela ausência de um sistema de alerta eficaz no Oceano Índico. Muitas comunidades não tiveram tempo de evacuar e foram surpreendidas pelas ondas gigantes pouco tempo após o terremoto.
Os sobreviventes enfrentaram desafios imensos após o desastre. Além da perda de entes queridos, muitos ficaram desabrigados e sem acesso a recursos básicos, como água potável, alimentos e serviços médicos. A reconstrução de áreas afetadas foi dificultada pela destruição generalizada de estradas, pontes e outras infraestruturas essenciais.
O impacto ambiental do tsunami também foi significativo. Manguezais, recifes de coral e outros ecossistemas costeiros sofreram danos severos, o que afetou a biodiversidade marinha e os meios de subsistência de comunidades que dependiam da pesca. Em algumas áreas, a inundação de água salgada tornou o solo infértil, prejudicando a agricultura local por anos.
Tsunami de 2004 foi global
O tsunami que se seguiu ao terremoto teve impactos catastróficos em todo o Oceano Índico. Uma vez gerado, o tsunami se propagou em todas as direções, atingindo as costas da Indonésia e das Ilhas Andamã e Nicobar, na Índia, em 20 minutos após o terremoto, e a costa Nordeste da Somália, na África, sete horas depois.
As alturas das ondas e as distâncias de inundação variaram em toda a região, dependendo da proximidade com o epicentro do terremoto, da profundidade do oceano, da elevação da costa e de outras características do terreno, tanto acima quanto abaixo do nível do mar. Na província de Aceh, no Norte de Sumatra, Indonésia, as ondas atingiram 51 metros (167 pés) e causaram inundações que avançaram até 5 quilômetros para o interior.
Do outro lado do oceano, na Somália, as ondas variaram de 3,4 a 9,4 metros (11 a 31 pés) de altura. O tsunami também foi observado em mais de 100 estações costeiras de medição do nível da água nos oceanos Atlântico e Pacífico, tornando-se um tsunami de alcance global.
Embora tsunamis mortais já tivessem ocorrido na região do Oceano Índico (5% dos tsunamis registrados entre 1900 e 2017 ocorreram ali), o último grande tsunami havia acontecido em 1883. Por isso, na época do evento, havia pouco conhecimento público sobre tsunamis, e não existia um sistema oficial de alerta de tsunamis.
Tsunami de 2004 chegou ao Brasil
O grande tsunami atingiu praticamente todas as costas litorâneas do planeta, em todos os continentes, inclusive na América do Sul. A altura das ondas e da elevação do mar em cada ponto da Terra dependeu da distancia do sismo e da morfologia das áreas costeiras. Considerando a enorme distância e de se tratar de outro oceano, as ondas chegaram menores ao litoral brasileiro.
No Brasil, o tsunami de dezembro de 2004 não produziu vítimas ou danos materiais, contudo foi documentada visualmente a chegada das ondas de longo comprimento no Clube Naval Charitas em Niterói (RJ) que apresentou uma variação de 160 cm em 17 minutos, de acordo com dados da Marinhe e relatados em trabalho de Carlos França e Afrânio de Mesquita, do Departamento de Oceanografia da Universidade de São Paulo (USP). Além do registro fotográfico houve a constatação do tsunami de 2004 no marégrafo da Marinha do Brasil, em Arraial do Cabo (RJ), de 91 cm em 13 minutos.
Outros registros de estações costeiras, uma localizada no interior do estuário de Cananéia (SP) e outra no interior da Baía da Guanabara, no Rio de Janeiro, apresentaram oscilações atingindo 20 cm de altura. Uma medição de estação exposta ao oceano aberto, em Ubatuba (SP) apresentou oscilações com até 1,2 metro de altura. Tais oscilações com período aproximado de 45 minutos tiveram início entre 20 e 22 horas após o terremoto no Oceano Índico e foram observadas durante dois dias.
Os especialistas da USP rodaram um modelo matemático da propagação de ondas de tsunami sob três cenários. Na simulação para o litoral brasileiro, o valor máximo de amplitude de onda foi observado no litoral do estado do Rio de Janeiro, na região entre as baías da Guanabara e de Ilha Grande.
Explica-se o resultado pelo fato desta região ser o trecho da costa brasileira mais orientado na direção Leste-Oeste. Na simulação para a região de Arraial do Cabo (RJ), a amplitude máxima registrada foi de dois metros no trecho oceânico. No ponto do marégrafo onde foi medido o evento (90 cm) foi registrada na simulação uma amplitude máxima de 111 cm.
Já uma simulação computacional feita pela Coppe-UFRJ (Coordenação dos Programas de Pós-graduação de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro) mostrou que os efeitos do tsunami que arrasou o Sudeste Asiático no fim de dezembro atingiram o Brasil com ondas de até 1,15 metro.
Segundo Paulo César Rosnan, do Programa de Engenharia Oceânica da Coppe, os efeitos puderam ser percebidos em vários pontos da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, 20 horas após sua ocorrência. “O fenômeno, que seria invisível em mar aberto no Brasil, se tornou notável em alguns locais da baía, onde há estreitamentos que amplificaram a força”, disse.
Rosnan explicou que a Marinha registrou alterações de até 30 cm na maré no medidor da Ilha Fiscal e avisos de onda alta em lugares como o Iate Clube de Niterói (RJ). De acordo com a reprodução feita pela Coppe, houve um aumento de 40 cm nas ondas na entrada da Baía de Guanabara.
Na enseada de Botafogo e de São Francisco (Niterói), as alturas do tsunami chegaram a 1,15 metro e 1 metro, respectivamente, mas nunca ao mesmo tempo. Enquanto o nível estava alto em um ponto, abaixava em outro e vice-versa. Os efeitos foram se abrandando para o Norte e se tornaram praticamente inexistentes próximo à Ilha de Paquetá e ao rio Iguaçu.
Maremoto enorme alcançou costa brasileira em 1755
Pesquisa recente, de 20200, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), analisou o tsunami que atingiu o Brasil em 1755. As ondas enormes que alcançaram nossas praias ocorreram após um violento terremoto que destruiu Lisboa, em Portugal.
O abalo teve uma magnitude de 8,7 com devastação em Portugal, parte da Espanha e Marrocos. O tsunami gerado alcançou áreas como o Reino Unido e o Caribe. As estimativas de vítimas, pela escassez de informação da época, variam de 20 mil a 100 mil mortos.
De acordo com especial produzido pela BBC Brasil, a onda gigante que se formou com o terremoto em Lisboa atravessou o Atlântico e causou estragos na costa brasileira, segundo um estudo do professor Francisco Dourado, do Centro de Pesquisas e Estudos sobre Desastres (Cepedes).
“No início da tarde de 1º de novembro de 1755, um tsunami atingiu o litoral do Nordeste. Ele penetrou terra adentro, destruiu habitações modestas e desapareceu com duas pessoas. Isso é desconhecido da maioria dos brasileiros”, disse Veloso à rede britânica.
Há ao menos quatro relatos em cartas da época falando sobre o maremoto no Brasil. Elas foram escritas pelo arcebispo da Bahia, pelos governadores de Pernambuco e da Parayba e por um militar e estão no Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa.
“As águas transcenderam os seus limites e fizeram fugir os habitantes das praias”, diz uma carta de 10 de maio de 1756, relatando o episódio acontecido em 1 de novembro do ano anterior em praias da Paraíba. Outra carta relatada por Veloso, de 4 de março de 1756, diz: “Em Lucena e Tamandaré, a enchente do terremoto entrou pela terra adentro coisa de uma légua (4 a 5 km) terra adentro e levou algumas casas de palhoça e falta um rapaz e uma mulher.”
De acordo com o estudo da Uerj, na região da praia de Lucena, na Paraíba, as ondas atingiram até 1,8 metro de altura. Já na região pernambucana de Tamandaré, as ondas alcançaram quase dois metros. As ondas inundaram até quatro quilômetros terra adentro, principalmente em locais banhados por rios e nas proximidades da Ilha de Itamaracá (PE). Em Tamandaré, a inundação foi de até 800 metros, e em Lucena, 300 metros.
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