Há dez anos, na noite de 27 para 28 de março de 2004, um furacão atingia as costas do Rio Grande do Sul e Santa Catarina no mais impressionante e excepcional fenômeno que já se testemunhou em nossa região e que mereceu estudos no Brasil e no exterior. Depois de uma década, qual o legado do desastre ? O aniversário merece profunda reflexão nossa e das autoridades. Meteorologistas fizeram estudos e hoje há melhor compreensão do fenômeno que se dizia ser de impossível ocorrência no Atlântico Sul. Se tivermos um novo furacão, a ciência no Brasil estará mais apta a analisar e prever. Mas as boas notícias param por aí. Os recursos de monitoramento ou de previsão são quase idênticos aos de 2004. Modelos numéricos avançaram e hoje se tem uma maior variedade deles, o que é vital na previsão, mas ferramentas para monitorar são quase idênticas.
Hoje, estações automáticas em Torres (foto abaixo de divulgação do Inmet) e no Sul de Santa Catarina fornecem dados em tempo real. Inexistiam em 2004. O furacão, contudo, veio do mar, e tal como há dez anos, não há disponibilidade de informações, por exemplo, de vento no oceano por bóias. À época, muito se falou em instalar, mas em 2014 não se sabe delas. São essenciais para se prever com exatidão a intensidade de ciclone que avança para o continente. Dados de vento no mar ou por (inconfiáveis) estimativas de satélite ou por relatos de embarcações (escassos). A todo momento se comenta ainda da tecnologia de radares e que houve investimentos nesse sentido. Não no Rio Grande do Sul. Radares estão sendo instalados Brasil afora, mas não aqui. Temos os mesmos, com sérias limitações, de 2004. Ademais, apenas um dos três que cobrem nosso Estado capta o que ocorre o Litoral e está muito mais voltado a mostrar o que se dá no continente que no mar.
Quase nada mudou também na esfera pública. Se houvesse um furacão hoje, o Litoral Norte estaria tão despreparado em planejamento como em 2004. Não teria plano de evacuação e alerta à população. Seria um caos absoluto e cercado de pânico qualquer tentativa de retirar as pessoas da orla. Apesar da nossa costa ser afetada com freqüência por vento intenso por ciclones extratropicais, sequer se considerou alterar os códigos de edificação para que construções fossem mais reforçadas na região. E a Defesa Civil Estadual continua com a mesma falta de estrutura e pessoal não especializado (integrada ainda apenas por militares) de 2004. O legado do Catarina não poderia ser mais miserável. Pouco se extraiu. Uma triste lástima.