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Neve na Serra de Bogong, Victoria, na Austrália, na última semana. Forte incursão de ar polar trouxe marcas históricas de frio e neve com acumulação no Sudeste australiano em pleno mês de maio. | MT. BEAUTY TRANSFERS/FACEBOOK

O outono deste ano tem sido muito frio em muitos estados da Austrália com temperaturas baixas agora em maio que não eram observadas há décadas nesta época do ano em algumas cidades australianas. Chegou a nevar e com acumulação em diferentes pontos do Sudeste da Austrália pela atuação de um ciclone extratropical perto da costa.

Em Sydney, estado de Nova Gales do Sul, conforme o serviço meteorológico WeatherZone, o resfriamento neste outono, considerando as temperaturas máximas médias entre março e maio, é o maior em doze anos e o segundo maior em 55 anos, além de ser o quinto maior resfriamento na estação em mais de 160 anos de registros.

A semana que terminou na quinta-feira, 11 de maio, teve uma temperatura média de 14,7ºC em comparação com 24,7ºC de média na semana que terminou em 12 de março. Segundo o WeatherZone, o resfriamento deste ano deveu-se em grande parte ao fim da La Nina e à atuação de algumas fortes frentes frias.

Uma destas frentes trouxe até 10 centímetros de neve para áreas tão ao Norte quanto os Planaltos Centrais de Nova Gales do Sul. Os anos anteriores com maior resfriamento no outono foram 2011 (10,4ºC em 60 dias), 1968 (10,5ºC em 60 dias), 1926 (10,7ºC em 60 dias) e 1861 (um recorde de 10,9ºC em 60 dias).

No distrito de Darling Downs, em Queensland, a temperatura na última semana caiu abaixo de zero com -5,7ºC em Oakey e -5,1ºC no aeroporto de Wellcamp. A última vez que o estado de Queensland enfrentou temperaturas tão baixas foi em julho de 2019. Foi ainda a temperatura mais baixa de Oakey em maio em registros que datam desde 1973.

A mínima de 0,1ºC de Toowoomba na manhã da última terça-feira foi a menor em maio desde 2000, enquanto a mínima de 4,4ºC do Aeroporto de Brisbane foi a mais baixa em maio em 17 anos. Em outras áreas da Austrália, a temperatura desceu a gelados -7,2ºC em Glenn Innes e a cidade de Canberra anotou -3,1ºC. Canberra teve a menor máxima em 23 anos com somente 7,8ºC.

Mais ao Norte, Sydney experimentou uma rápida queda de temperatura na noite do domingo passado, quando uma chuva fria caiu sobre a cidade. A temperatura mínima de 7,1ºC às 22h36 do último domingo foi a mais baixa de Sydney em maio desde 1999, e sua temperatura mais baixa no início do outono em 85 anos.

O frio na Austrália pode sim ser um sinal para o clima do Sul do Brasil e da América do Sul? Às vezes, sim! Isso porque a atmosfera se comporta em ondas e padrões de onda longa são os que trazem as incursões de ar frio. Assim, que se um padrão atmosférico de frio mais intenso e freqüente se estabelece na Oceania pode ter repercussão no outro lado do Pacífico na América do Sul.

Aliás, há análises observacionais de que eventos de muito frio na Austrália e Nova Zelândia costumam preceder em cerca de dez a quinze dias episódios gelados no Cone Sul da América, mas será o caso deste ano? Não, de acordo com os modelos de previsão do tempo e clima. Os mapas mostram as projeções do modelo europeu de anomalias semanais de temperatura na América do Sul para as próximas três semanas.

Assim, conforme as projeções do modelo europeu, grande parte da América do Sul deverá ter temperatura acima da média nesta segunda metade de maio e no começo de junho, sem sinal de uma onda longa com frio migrando da Oceania para as latitudes médias do Cone Sul da América.

Onde a temperatura deve ficar mais frio do que a média é no extremo Sul da América do Sul, na região chilena de Magalhães e parte da Patagônia da Argentina. Isso está em linha com o que normalmente se observa quando há sinal positivo no Pacífico (El Niño), como se projeta para as próximas semanas, e sinal positivo da Oscilação Antártica (AAO).

A chamada Oscilação Antártica (AAO) ou Modelo Anular Sul ou Meridional é uma das mais importantes variáveis que impacta as condições no Brasil e no Hemisfério Sul, tanto na chuva como na temperatura.

Do que se trata? Trata-se de um índice de variabilidade relacionado ao cinturão de vento e de baixas pressões ao redor da Antártida. A Oscilação Antártica tem duas fases. A positiva e a negativa. Na positiva, o cinturão de vento ao redor da Antártida se intensifica e se contrai em torno do Polo Sul. Já na fase negativa, o cinturão de vento enfraquece e se desloca para Norte, no sentido do Equador, obviamente sem atingir a faixa equatorial.

Com a maior ondulação da corrente de jato na fase negativa, como ocorreu em abril, cresce a chance de que ocorram eventos de frio mais intenso nas latitudes médias. Isso explica o frio que se registra neste outono na Austrália e em parte a neve muito precoce que se observou em abril no Sul do Brasil, em Santa Catarina. Desde 1999 não se tinha evento tão cedo de neve em Santa Catarina.

As fases da Oscilação Antártica influenciam ainda o posicionamento das ciclogêneses (formação de ciclones extratropicais) em todo o Hemisfério Sul. Quando na fase negativa, a que favorece mais frio no Sul do Brasil, os ciclones extratropicais tendem a ocorrer em latitudes mais baixas do que na fase positiva, logo mais distantes da Antártida e mais próximos do Brasil. Por isso, abril teve vários ciclones nas latitudes médias da América do Sul, incluindo o que causou neve em Santa Catarina.

Agora, a Oscilação está muitíssimo positiva no momento, em condição é muito desfavorável ao ingresso de ar polar nas latitudes médias da América do Sul ou mesmo à formação de ciclones. Com efeito, a tendência de curto e médio prazos é de elevação da temperatura e ar mais quente atuando no Brasil nesta segunda metade de maio. Não deixará de fazer frio à noite, mas pela atmosfera muito seca e não pela atuação de ar polar.

Como curiosidade, em 2021, o outono também teve episódios de frio intensos na Austrália. No Sul do Brasil, o principal evento extremo de frio, entretanto, só veio a ocorrer no meio do inverno. No final de julho de 2021, uma potente massa de ar polar atingiu a região com queda de neve nos três estados do Sul e até em locais de baixa altitude. Entre o Nordeste gaúcho e o Planalto Sul Catarinense, várias cidades anotaram neve com acumulações relevantes.