Um raro evento de Aquecimento Estratosférico Súbito foi detectado na estratosfera acima da região antártica nos últimos dias. Os modelos de previsão indicam que as repercussões nas camadas mais baixas da atmosfera podem se dar ainda neste mês com potenciais incursões de ar frio nas próximas semanas no Hemisfério Sul. O evento na estratosfera, entretanto, não é de grande proporção.
Um evento de Aquecimento Estratosférico Súbito (SSW na sigla em Inglês para Sudden Stratospheric Warming) ocorre quando há um aumento abrupto na temperatura do ar muito acima de qualquer uma das regiões polares da Terra, normalmente na magnitude de dezenas de graus Celsius em poucos dias. O aquecimento ocorre numa camada da atmosfera chamada de estratosfera, cerca de 30 a 40 km acima da superfície.
Embora estes eventos não afetem imediatamente os padrões climáticos próximos ao solo, eles podem infiltrar-se pela atmosfera e influenciar o clima troposférico (parte mais baixa da atmosfera) nas semanas seguintes.
Se um evento de aquecimento estratosférico alcançar a parte mais baixa da atmosfera, a troposfera, pode gerar o enfraquecimento do vórtice polar, o que permitiria que o ar polar gelado se afaste ainda mais da Antártica e avance para as latitudes médias.
Estes episódios de Aquecimento Estratosférico Súbito podem fazer com que a chamada Oscilação Antártica mude para uma fase negativa, o que no caso do Hemisfério Sul pode afetar áreas da América do Sul, Sul da África, Austrália e Nova Zelândia com incursões de ar polar de maior intensidade e aumento da chuva em algumas regiões.
Estes eventos na estratosfera são raros no Hemisfério Sul, com apenas alguns episódios documentados nas últimas décadas, mas podem ser poderosos e são conhecidos por terem um efeito em todo o globo.
São mais comuns no Hemisfério Norte com vários episódios registrados que levaram a grandes ondas de frio nas semanas seguintes na América do Norte, Europa e Ásia, alguns muito significativos com grandes tempestades de neve e marcas congelantes.
O que ocorre? No primeiro momento, há elevação repentina e enorme da temperatura na estratosfera. Na sequência, há um enfraquecimento do vórtice polar e o cinturão de ventos intensos em torno da Antártida se enfraquece.
A Oscilação Antártica, então, cai a valores negativos, a corrente de jato (vento) polar na altitude em que os aviões viam fica mais ondulada, e por fim o ar frio alcança com grande intensidade as latitudes médias, onda estão cidades como Buenos Aires, Montevidéu, Porto Alegre, Johanesburgo, Sydney e Auckland.
Os efeitos de um período longo de alta pressão perto do Polo Sul pode ter implicações até no Hemisfério Norte, uma vez que a estratosfera Norte e Sul estão conectadas através da chamada Circulação de Brewer-Dobson. Estudo que investigou um evento significativo de aquecimento estratosférico em 2019 sobre o Polo Sul identificou uma anomalia ionosférica nos Estados Unidos que se deu na sequência com impactos geomagnéticos na América do Norte e na Europa.
O que sabemos e não sabemos sobre o impacto no Brasil
O que se sabe? Um evento de Aquecimento Estratosférico Súbito está em curso sobre o Oeste da Antártida e que na teoria poderia levar nas próximas semanas a incursões de ar frio de maior intensidade no Hemisfério Sul do nosso planeta.
O que não se sabe? Quais serão as áreas do Hemisfério Sul que podem ser afetadas pelas incursões de ar gelado. Os impactos em frio podem se dar mais na Austrália e na Nova Zelândia, por exemplo, que na América do Sul com ar mais quente por aqui, e vice-versa.
Os vários modelos de clima com tendência para agosto, a propósito, indicam que o próximo mês deve ter temperatura acima da média em grande parte da América do Sul e em quase todo o Brasil, inclusive em muitas áreas da Região Sul.
Ocorre que os modelos de clima foram rodados antes da ocorrência do Aquecimento Estratosférico Súbito, ou seja, quando da inicialização da simulação ainda não ocorria a elevação acentuada da temperatura na estratosfera sobre a Antártida. Assim, quais vão ser os desdobramentos deste evento no Brasil ainda são uma incógnita, mas, levando em conta que não se trata de um grande evento de aquecimento estratosférico, o mais provável é que não sejam significativos.
O que ocorreu em evento passados Aquecimento Estratosférico Súbito
Há casos documentados de eventos de Aquecimento Estratosférico Súbito no Hemisfério Sul pelo serviço meteorológico neozelandês (NIWA) em setembro de 2002 e em setembro de 2010. No caso da Nova Zelândia, em 2002 e 2010 houve reflexos com mais chuva e muito frio. Em 2002, setembro teve episódios de frio muito intenso no país com alta frequência de geada. Em 2010, choveu muito e fez frio no Sul neozelandês.
Aqui, setembro de 2002 foi mais frio e chuvoso que a média com onda de frio intenso e neve no começo do mês. Já setembro de 2010 teve temperatura perto ou abaixo da média com chuva acima da média na maioria das regiões gaúchas.
Na segunda quinzena de agosto de 2019, ocorreu um Aquecimento Estratosférico Súbito sobre a Antártida. Não houve, entretanto, grande impacto no Brasil, conforme análise dos dados pela MetSul Meteorologia.
Dados de setembro de 2019 de Porto Alegre mostram que não houve nenhuma grande onda de frio de maior intensidade. Na primeira semana do mês foram anotados dias de temperatura baixa com mínima de 6,9ºC. No dia 23, houve a mínima do mês com 6,8ºC. Os valores, porém, não são condizentes com episódios de frio muito intenso e que fujam à normalidade.
No Hemisfério Sul, setembro de 2019 terminou com temperaturas acima da média no Centro-Sul da Austrália, muito acima da média na África do Sul e na maior parte da Argentina. A temperatura ficou abaixo da média no Sul argentino, no Uruguai e no Oeste e no Sul do Rio Grande do Sul. Bagé teve muitos dias frios para setembro na primeira semana do mês e entre 16 e 25 de setembro daquele ano.
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