Desde o fim de semana, muitas reportagens na imprensa noticiam uma tendência de aumentos no tornado no Brasil, mas a ciência é ainda inconclusiva sobre os impactos das mudanças climáticas neste tipo de fenômeno.

MORGAN SCHNEIDER/CIMSS/NSSL/NOAA
O Brasil não possui, como os Estados Unidos, uma climatologia confiável de longo prazo de tornados e o número de ocorrências documentadas nos últimos anos se deve a um maior interesse no tema e a uma capacidade maior de registro de imagens com a popularização das câmeras em celulares.
As tempestades convectivas severas — que incluem tornados, granizo, ventos intensos, chuva ou neve pesada e relâmpagos — são fenômenos de grande impacto e continuam a desafiar a ciência climática pela falta de registros consistentes e homogêneos, observa em seus relatórios recentes o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), da ONU.
Avaliações anteriores do IPCC, como o relatório SREX de 2012 e o AR5 de 2013, já indicavam baixa confiança nas tendências observadas de tornados e granizo, principalmente devido à qualidade desigual dos dados e à limitação dos sistemas de monitoramento.
Estudos mais recentes, reunidos no Climate Science Special Report (Kossin et al., 2017), reforçam esse quadro, mas apontam algumas mudanças no comportamento dos tornados nos Estados Unidos.
Desde os anos 2000, o número de dias com tornados nos Estados Unidos diminuiu, ao mesmo tempo em que aumentou a quantidade de tornados concentrados nos dias em que ocorrem — um sinal de maior variabilidade e potencial de episódios mais intensos, segundo o relatório, com confiança média. Já para o granizo e os ventos severos, as tendências continuam incertas.
Fora dos Estados Unidos, as pesquisas ainda são limitadas, embora alguns padrões regionais tenham sido identificados. Na Europa, o número de tornados detectados aumentou entre 1800 e 2014, embora parte dessa alta possa estar relacionada à melhora na observação, mesmo caso do Brasil.
No Sahel africano, observações por satélite indicam um aumento na frequência de tempestades extremas desde 1982, enquanto no sul da França e em partes da Europa Central e Oriental houve mais dias com trovoadas e eventos de chuva extrema. Em contrapartida, a China registrou uma redução de cerca de 50% nos dias com tempestades ou granizo entre 1961 e 2010, fenômeno associado ao enfraquecimento da monção de verão asiática.
As análises baseadas em satélite, por meio de missões como o TRMM e o GPM, têm sido essenciais para mapear a climatologia global de sistemas convectivos de mesoescala — grandes complexos de tempestades que se estendem por centenas de quilômetros e são frequentes em regiões tropicais e subtropicais. Esses estudos permitem identificar áreas e condições atmosféricas mais propícias à ocorrência de tempestades severas, embora ainda não ofereçam um retrato completo das tendências globais.
Os modelos climáticos, por sua vez, são consistentes em apontar mudanças ambientais que favorecem um aumento tanto na frequência quanto na intensidade das tempestades severas, incluindo tornados, granizo e ventos fortes. Essa projeção tem alta confiança entre os cientistas, ainda que permaneça baixa a confiança nos detalhes regionais e na magnitude exata desse aumento.
O consenso geral é que o aquecimento global deve criar condições mais favoráveis a eventos convectivos extremos, mas a falta de séries históricas longas e uniformes ainda impede uma avaliação conclusiva sobre a evolução observada desses fenômenos ao redor do planeta.
