As mudanças climáticas influenciaram nas inundações catastróficas registradas no Paquistão nas últimas semanas, mostra estudo de atribuição que acaba de ser publicadom pela World Weather Attribution. Entre meados de junho e o fim de agosto, extensas áreas do país sofreram chuvas de monções recordes, o que levou grande parte do país ficar debaixo d´água. O Paquistão teve três vezes a precipitação normal de agosto, tornando-se o agosto mais chuvoso desde 1961.
As duas províncias do Sul, Sindh e Baluchistão, cada uma experimentou seu agosto mais chuvoso já registrado, recebendo 7 a 8 vezes seus totais mensais habituais. O rio Indo, que percorre toda a extensão do país, transbordou por milhares de quilômetros quadrados enquanto as chuvas intensas também levaram a inundações urbanas e deslizamentos de terra.
As chuvas e as inundações resultantes afetaram mais de 33 milhões de pessoas, destruíram 1,7 milhão de casas e quase 1.500 pessoas perderam a vida. Em 25 de agosto, o governo declarou uma emergência nacional. Os danos provavelmente excedem as estimativas preliminares de cerca de 30 bilhões de dólares.
Cerca de 6.700 quilômetros de estradas, 269 pontes e 1.460 unidades de saúde foram destruídas, 18.590 escolas danificadas, cerca de 750 mil animais foram mortos e ao redor de 18 mil quilômetros quadrados de terras agrícolas foram arruinados, incluindo cerca de 45% da safra de algodão, uma das principais exportações do país.
A perda de colheitas de alimentos totalizando cerca de US$ 2,3 bilhões também agrava a atual escassez de alimentos devido à guerra na Ucrânia e às ondas de calor do verão na região. Há também um risco severamente aumentado de propagação de doenças.
As águas das enchentes fornecem um terreno fértil para patógenos, e o grande número de pessoas deslocadas resulta em falta de higiene e saneamento em acomodações temporárias. Notavelmente, em Sindh e Baluchistão, houve um surto de doenças transmitidas pela água, como diarreia e cólera, bem como infecções de pele e olhos e malária (IRC, 2022). “Tudo é um grande oceano, não há um lugar seco por onde bombear a água”, afirmou a ministra Rehman, antes de citar um custo econômico “devastador”.
Para analisar se e em que medida as mudanças climáticas causadas pelo homem alteraram a probabilidade e a intensidade dessas chuvas extremas, cientistas do Paquistão, Índia, Holanda, França, Dinamarca, África do Sul, Nova Zelândia, Estados Unidos e Reino Unido usaram publicações publicadas peer-reviewed em estudo de atribuição de eventos.
O estudo teve dois focos. Primeiro, o máximo anual da precipitação média de 60 dias durante junho-setembro sobre a bacia do rio Indo e, dois, o máximo anual da precipitação média de 5 dias em junho a setembro sobre as províncias mais atingidas de Sindh e Baluchistão.
As inundações ocorreram como consequência direta das chuvas de monção extremas durante a temporada de verão, exacerbadas por picos mais curtos de chuva muito forte, particularmente em agosto, atingindo as províncias de Sindh e Baluchistão.
Os impactos devastadores também foram causados pela proximidade de assentamentos humanos, infraestrutura (casas, edifícios, pontes) e terras agrícolas para planícies de inundação, infraestrutura inadequada, capacidade limitada de redução de risco, um sistema de gestão fluvial desatualizado, vulnerabilidades subjacentes causadas por altas taxas de pobreza e fatores socioeconômicos como instabilidade política e econômica contínua.
O tempo de retorno para ambos os eventos definidos acima é de cerca de 1 em 100 anos no clima de hoje. A precipitação na bacia do Indo é, no entanto, extremamente variável de ano para ano, devido, entre outros fatores, à forte correlação com o ciclo do Pacífico (El Niño e La Niña). Assim, a quantificação exata é difícil, dizem os cientistas.
Atentando apenas para as tendências nas observações, os cientistas descobriram que a precipitação máxima de 5 dias sobre as províncias de Sindh e Baluchistão é agora cerca de 75% mais intensa do que teria sido se o clima não tivesse aquecido em 1,2ºC, enquanto em 60 dias a chuva em toda a bacia é agora cerca de 50% mais intensa, o que significa que chuvas tão fortes agora são mais prováveis de acontecer.
Existem grandes incertezas nessas estimativas devido à alta variabilidade das chuvas na região, e as mudanças observadas podem ter uma variedade de fatores, não limitando-se às mudanças climáticas. Observam ainda que o papel das mudanças climáticas induzidas pelo homem nessas mudanças observadas foi analisado pelas tendências nos modelos climáticos com e sem os aumentos induzidos pelo homem nos gases de efeito estufa.
As regiões envolvidas estão no extremo Oeste da região das monções, com grandes diferenças nas características das chuvas entre as áreas secas ocidentais e úmidas orientais. Muitos dos modelos climáticos de última geração disponíveis têm dificuldades para simular essas características de chuva.
Os que passam em teste de avaliação geralmente mostram mudança muito menor na probabilidade e intensidade de chuvas extremas do que a tendência encontrada nas observações. Essa discrepância sugere que a variabilidade de longo prazo, ou processos que a avaliação pode não captar, pode desempenhar papel importante, tornando inviável quantificar o papel geral das mudanças climáticas induzidas pelo homem.
No entanto, para os extremos de chuva de 5 dias, a maioria dos modelos e observações que foi analisada mostra que a chuva intensa se tornou mais pesada à medida que o Paquistão aqueceu. Alguns dos modelos sugerem que as mudanças climáticas poderiam ter aumentado a intensidade das chuvas em até 50% para a definição do evento de 5 dias.
Para o futuro, sob clima 2°C mais quente do que nos tempos pré-industriais, os modelos sugerem que a intensidade das chuvas aumentará significativamente ainda mais, para o evento de 5 dias, enquanto a incerteza permanece muito grande para as chuvas de monção de 60 dias. Os resultados do estudo estão alinhados com relatórios recentes do IPCC.
“Tanto as condições atuais quanto o potencial aumento adicional de picos extremos de chuvas no Paquistão à luz das mudanças climáticas causadas pelo homem, sugerem que há uma necessidade urgente de reduzir a vulnerabilidade ao clima extremo no Paquistão”, adverte o estudo.