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Um novo estudo científico analisou décadas de tempestades causadas por rios atmosféricos na Costa Oeste dos Estados Unidos e identificou o fator decisivo que transforma essas chuvas intensas em inundações devastadoras: a umidade do solo antes da chegada da tempestade.

Califórnia sofre habitualmente com inundações por rios atmosféricos vindos do Pacifico | PATRICK FALLON/AFP/METSUL

Publicado no dia 4 de junho no Journal of Hydrometeorology, o trabalho examinou milhares de eventos de rios atmosféricos registrados entre 1980 e 2023, em 122 bacias hidrográficas da região. A principal conclusão surpreende: não é o tamanho da tempestade que determina o risco de enchente, mas sim o nível de saturação do solo antes da chuva.

Segundo os pesquisadores, quando o solo já está encharcado, a capacidade de absorver água se esgota. Com isso, qualquer nova precipitação escorre diretamente para rios e córregos, aumentando de forma exponencial os volumes de água e a possibilidade de transbordamento. Em média, os picos de cheias foram de 2 a 4,5 vezes maiores quando as chuvas caíram sobre solos já molhados.

“Esse trabalho demonstra o papel fundamental que a umidade do solo exerce na moderação de eventos de inundação”, afirmou Mariana Webb, autora principal do estudo e doutoranda na Universidade de Nevada, em Reno. “Existe um limiar crítico de saturação acima do qual os volumes de escoamento crescem de forma significativa.”

A influência da umidade do solo varia de região para região. Em locais áridos, como o sul da Califórnia e o sudoeste do Oregon, a variação da umidade é maior, o que torna esses ambientes especialmente sensíveis à chegada de rios atmosféricos quando o solo já está úmido. Nessas áreas, o solo raso e rico em argila possui baixa capacidade de armazenamento de água.

Por outro lado, nas regiões mais úmidas, como Washington e as áreas interiores da Cordilheira de Sierra Nevada e das Cascatas, os solos são mais profundos e há maior presença de neve no inverno. Isso oferece uma capacidade natural de retenção da água, reduzindo o impacto imediato das chuvas. Nesses locais, o solo costuma permanecer úmido por mais tempo ou coberto por neve, o que torna a influência da umidade do solo menos crítica na previsão de enchentes.

“Queríamos identificar as bacias hidrográficas onde o monitoramento da umidade do solo realmente poderia fazer a diferença na previsão de inundações”, explicou Webb. “São justamente os locais mais secos, com maior evaporação e chuvas menos regulares, que se beneficiariam de dados mais detalhados.”

Atualmente, a umidade do solo é medida por redes como a SNOTEL, do Departamento de Agricultura dos EUA. No entanto, essas estações são menos densas do que as de medição de chuva, e o solo pode variar bastante em um mesmo território. Isso exige mais pontos de observação para fornecer um retrato fiel da situação real.

Os autores do estudo sugerem ampliar o monitoramento em tempo real da umidade do solo nas regiões de maior risco, para aprimorar os sistemas de alerta precoce, especialmente diante do aumento da frequência e intensidade dos rios atmosféricos causado pelas mudanças climáticas.

A pesquisa destaca a importância de integrar o monitoramento do solo à meteorologia, superando uma divisão tradicional entre duas disciplinas. “Muitas vezes, meteorologistas observam a água só até o momento em que ela cai do céu, e hidrólogos só passam a estudá-la depois disso”, comentou Webb. “Minha intenção foi justamente conectar essas áreas.”

Mariana Webb conduziu o estudo em colaboração com Christine Albano, ecohidróloga do Desert Research Institute (DRI), reconhecida por suas pesquisas sobre os efeitos dos rios atmosféricos nas paisagens naturais e nos sistemas hídricos.

Para Albano, os resultados representam um avanço importante: “A saturação do solo já é conhecida como fator de risco, mas este estudo quantifica o ponto crítico em que a saturação passa a gerar inundações severas”, explicou. “Combinando as previsões de chegada de rios atmosféricos com o monitoramento da umidade do solo, podemos melhorar significativamente os alertas antecipados.”

Essa abordagem integrada pode salvar vidas, proteger infraestruturas e permitir que comunidades vulneráveis se preparem com antecedência para eventos extremos. A mensagem principal do estudo é clara: o solo guarda a chave para prever e mitigar os desastres causados pelas tempestades mais intensas do Oeste americano.

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