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A estiagem relevou uma tragédia ambiental em Porto Alegre. Com a chuva abaixo da média nas bacias que alimentam o lago da Capital, o nível do Guaíba baixou muito. O nível baixo acabou por revelar grande quantidade de lixo nas águas e nas margens, onde se produziu o recuo pela estiagem. As fotografias foram feitas pelo fotógrafo Fernando de Oliveira durante o fim de semana. 


O nível do Guaíba no Cais Mauá era de apenas 0,18 metros nesta segunda (11). A chuva nos últimos 15 dias na estação do Instituto Nacional de Meteorologia em Porto Alegre foi de apenas 32,8 mm, quando o normal no período seria chover mais de 50 mm. A tendência é que o restante do mês de janeiro registre um aumento da precipitação na Capital.

UFRGS identifica microplásticos nas águas do Guaíba 

Pesquisa desenvolvida na UFRGS é pioneira no estado identificou a presença de microplasticos no Guaíba, sendo predominantemente de dois polímeros: polipropileno (55%) e o polietileno (43%). Existe uma influência direta da densidade populacional da região sobre a concentração de microplásticos.

Os microplásticos presentes no Lago Guaíba são abundantes e preocupantes. Para os olhos treinados dos pesquisadores do Laboratório de Processos Ambientais e Contaminantes Emergentes (Lapace), vinculado ao Instituto de Química da UFRGS, esse material pode até parecer bonito ao microscópio, mas é um sinal de alerta de sua interferência negativa no ecossistema.

Fragmentos azul de microplásticos, imagem de estereomicroscópio | Lapace/UFRGS

Presentes no ar, na água e até no sal, os microplásticos são pequenas partículas de plásticos que poluem o meio ambiente e podem medir de 0,001 mm a 5 mm. Eles são categorizados em duas fontes: de origem primária, em que há a produção intencional pela indústria; de origem secundária, quando a produção é não intencional e provocada, geralmente, pelos processos de intemperismo no meio ambiente, como degradação pela luz solar, por exemplo. 

A primeira coleta de microplásticos no Guaíba foi realizada em agosto de 2018, em que se observaram 9.519 partículas presentes na água. Desse montante, 82% eram fragmentos; 15%, fibras; e 3%, microesferas. Quanto às cores: 31,4% do material coletado era branco-transparente; 25,5%, vermelho; 15,8%, amarelo; e 15,6%, azul. Na amostra, havia também partículas verdes (9,4%) e pretas (2,4%).

A poluição marinha por plásticos é um grave problema global. Estima-se que, anualmente, oito milhões de toneladas desses resíduos cheguem aos oceanos, afetando os ecossistemas marinhos, o clima, a qualidade de vida das pessoas e as atividades econômicas que dependem do mar, tais como a pesca e o turismo.

Lixo no Guaíba se soma ao desastre plástico nos oceanos 

O plástico despejado no Guaíba vai para a Lagoa dos Patos e parte dele acaba no Oceano Atlântico, onde as águas da lagoa desembocam. 

Estudo da Oceana mostra que o Brasil é responsável por pelo menos 325 mil toneladas desses resíduos que são levados a partir de fontes terrestres tais como lixões a céu aberto e descartes inadequados.

O relatório “Um oceano livre de plástico – desafios para reduzir a poluição marinha no Brasil” aponta que a maior parte desse lixo marinho é composta por produtos e embalagens plásticas descartáveis. Revela ainda que, em geral, esses itens não são concebidos, projetados ou colocados no mercado para serem reutilizados ou terem rotações no seu ciclo de vida – são feitos para consumo e descarte imediato, gerando grande quantidade de resíduo não biodegradável.

O Brasil produz cerca de sete milhões de toneladas de plástico por ano, quantidade que coloca o país na posição de maior produtor da América Latina. Desse montante, três milhões de toneladas são de plásticos de uso único colocados no mercado também anualmente. 

Foto: Instituto Mar Urbano/Ricardo Gomes

“Após ser descartado, o resíduo plástico percorre diversos caminhos até chegar ao oceano, onde impacta a vida de milhares de animais, desde zooplâncton a mamíferos e aves marinhas, muitas delas já ameaçadas de extinção”, afirma o diretor-geral da Oceana no Brasil, o oceanólogo Ademilson Zamboni.

Em relação aos impactos na vida marinha, o estudo da Oceana aponta:

◾️Que no Brasil, ao longo de uma pequena porção da costa (regiões Sudeste e Sul) já foram coletados e necropsiados mais de 3,7 mil animais que ingeriram resíduos plásticos;

◾️10% animais que ingeriram plástico morreram por conta disso;

◾️Desses, 85% são espécies ameaçadas de extinção.

Com 10.959 quilômetros de costa, segundo o Anuário Estatístico 2019 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o país tem o dever de trabalhar pela redução do lixo plástico. Uma prova da chegada desses poluentes na costa é o estudo que mostra que 70% dos materiais e fragmentos coletados em limpezas de praia no litoral brasileiro são de plásticos, principalmente embalagens. 

“Nada do que se propôs até aqui deu, ou dará, conta de resolver esses problema, pois nenhuma solução passa pelo ponto principal – a redução da produção e oferta de plásticos.  Precisamos de uma lei nacional para diminuir progressivamente a oferta de plásticos descartáveis, assim como ter empresas e estabelecimentos comerciais atentos à demanda de consumidores cada vez mais conscientes, oferecendo seus produtos e serviços sem esse material. Os estabelecimentos podem, por exemplo, se tornar zonas livres de plástico”, explica Zamboni.

A indústria brasileira produz anualmente cerca de 500 bilhões de itens plásticos descartáveis tais como copos, talheres, sacolas plásticas, e embalagens para as mais diversas aplicações. São 15 mil itens por segundo. Com pouca reciclagem, a maior parte acumula-se em aterros, lixões – mas uma parcela muito importante vai mesmo é para o meio ambiente. 

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