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Um devastador tornado, cuja intensidade pela escala Fujita ainda será determinada por análise de danos, arrasou o município paranaense de Rio Bonito do Iguaçu, no Centro-Sul do estado, no final da tarde de ontem (7). Conforme o mais recente balanço da Defesa Civil, o fenômeno deixou quatro mortos e centenas de feridos.

O Corpo de Bombeiros Militar do Paraná (CBMPR) e os serviços de saúde atenderam, até o momento, 432 pessoas na região de Rio Bonito do Iguaçu. Nove tiveram ferimentos graves com algumas vítimas passando por cirurgia.

Os bombeiros seguem com operações de busca e salvamento nos locais afetados, principalmente nas estruturas mais colapsadas. A corporação também está fazendo levantamento de danos junto com autoridades locais, como postes caídos, casas afetadas e vítimas que ainda necessitem de atendimento.

Até o momento, 25 bombeiros militares estão atuando. Outros 39 estão em deslocamento para a cidade. Policiais militares, voluntários, funcionários da prefeitura e dezenas de equipes de saúde estão ajudando em todos os atendimentos.

Segundo a Defesa Civil, cerca de 80% da área urbana foi destruída, com casas destelhadas, postes e árvores arrancados e o colapso de várias construções. A cidade ficou sem energia elétrica e sem abastecimento de água. Vídeos gravados por moradores mostraram ruas cobertas por destroços, veículos capotados e estruturas metálicas retorcidas.

O tornado fez parte de uma onda de tempo severo associada a um ciclone extratropical que atuava sobre o Sul do Brasil. Uma linha de instabilidade gerada pelo ciclone avançou pelo Paraná com múltiplas células de tempestade, algumas supercélulas, com vendavais destrutivos e tornados.

Entenda o que causou o tornado em Rio Bonito do Iguaçu

A cadeia de eventos que levou ao tornado em Rio Bonito do Iguaçu passa pela atuação de um profundo centro de baixa pressão que estava cruzando a Metade Norte do Rio Grande do Sul na tarde da sexta-feira com a formação de um ciclone (ciclogênese).

Os valores de pressão em superfície estavam muito baixos com marcas ao redor de 1000 hPa ou pouco inferiores junto ao centro do ciclone, que no final da sexta encontrava-se entre a Serra Gaúcha e a Grande Porto Alegre.

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Como ocorre habitualmente em ciclones mais intensos, uma linha de instabilidade se formou a partir do começo da tarde de sexta entre o Noroeste e o Norte do Rio Grande do Sul e avançou para Santa Catarina e o Paraná nas horas seguintes.

Em Santa Catarina, no Oeste do estado, a linha de instabilidade provocou tempestades severas com suspeita de um tornado em comunidade rural do município de Dionísio Cerqueira. Do meio para o fim da tarde, o alinhamento de células de tempestade começou a ingressar pelo Sudoeste do Paraná com tempo muito severo que persistiu em outras regiões do estado durante a noite.

Uma linha de instabilidade nada mais é que faixa alongada de nuvens de tempestade que se forma na atmosfera em resposta a um forte contraste entre massas de ar — geralmente, ar quente e úmido à frente e ar mais frio e seco atrás, que pode se estender por centenas de quilômetros.

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Era o cenário observado no momento do tornado. A temperatura chegou durante a tarde de ontem a 34,5°C no Distrito de Entre Rios, em Guarapuava, a temperatura mais alta do ano na estação do Simepar e a mais alta em novembro desde o início da operação da estação em 2001. Ao mesmo tempo, uma massa de ar frio com trajetória continental avançava pelo Nordeste da Argentina, gerando um grande contraste térmica de massas de ar.

A linha de instabilidade chegou à região do tornado com nuvem que os topos atingiam até -80ºC, ou seja, eram nuvens gigantescas de tempestades que atingiam até 10 ou 15 quilômetros de altura.

As imagens de satélite mostravam até a presença do que se denomina de overshooting nas nuvens. O termo se refere a uma protuberância que se eleva acima do topo de uma nuvem do tipo Cumulonimbus, indicando corrente ascendente extremamente intensa dentro da tempestade.

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Essa cúpula — chamada de overshooting top — ultrapassa o nível de equilíbrio da troposfera, invadindo momentaneamente a estratosfera, e costuma aparecer em tons mais frios nas imagens do canal infravermelho do satélite. Sua presença é um forte indicativo de tempo severo, como granizo grande, ventos destrutivos e até tornados.

O deslocamento rápido e a organização linear das tempestades, como se viu, tornam as linhas de instabilidade um dos sistemas convectivos de maior risco de tempo severo. O principal perigo associado a uma linha de instabilidade são os ventos horizontais violentos, conhecidos como straight-line winds em Inglês.

Esses ventos são resultado do ar frio e denso que desce das nuvens de tempestade — o chamado downdraft — e se espalha rapidamente ao atingir o solo, produzindo rajadas destrutivas em larga escala. Em eventos intensos, as rajadas podem superar 100 km/h, derrubando árvores, postes e estruturas frágeis, muitas vezes com danos semelhantes aos de um tornado.

Além dos ventos lineares, as linhas de instabilidade ou QLCS (sistema convectivo quase-linear) também podem gerar microexplosões (downbursts), fenômenos localizados em que o ar desce de forma com violência, atingindo o solo com enorme força e se espalhando radialmente.

Em alguns casos, como se viu em Rio Bonito do Iguaçu, o cisalhamento (divergência) do vento em baixos níveis pode induzir rotação nas células embutidas dentro da linha, resultando na formação de tornados embebidos. Esses tornados tendem a ser de curta duração e difíceis de detectar por radar, mas ainda assim podem provocar destruição significativa, como se viu na cidade paranaense.

Correntes de jato em baixos níveis, uma espécie de corredor de vento a cerca de 1.500 metros de altitude que se origina na Bolívia e vem até o Sul do Brasil, transportando ar seco e quente, estão presentes na esmagadora maioria dos episódios de tornado no Sul do Brasil. Contribuem para gerar um padrão de vento divergente de vento na atmosfera (cisalhamento) que está na gênese de tornados.

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Ontem, uma corrente de jato em baixos níveis atuava com intensidade exatamente na área em que se deu o tempo mais severo, entre o Noroeste gaúcho, o Oeste catarinense e o Paraná, causando divergência de vento (cisalhamento) que torna a atmosfera muito propícia a tornados.

Sob todos estes ingredientes, explosivos para convecção profunda e tempo severo, houve a formação de supercélulas de tempestade. Os índices de instabilidade como SWEAT e Lifted Index apresentavam valores críticos para tempestades severas nas áreas mais afetadas por temporais na tarde de ontem, como o Oeste catarinense e o Centro, Sudoeste e o Sul do Paraná, favorecendo supercélulas. E Uma destas supercélulas atingiu o município de Rio Bonito do Iguaçu.

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Uma supercélula de tempestade é o tipo mais poderoso e perigoso de nuvem convectiva, caracterizada por possuir corrente ascendente rotativa conhecida como mesociclone. Essa rotação se forma devido ao forte cisalhamento do vento — variação de velocidade e direção em diferentes altitudes — que organiza a tempestade de forma duradoura e altamente estruturada.

As supercélulas são capazes de produzir fenômenos extremos, como granizo de grande diâmetro, ventos destrutivos e tornados violentos, além de chuvas intensas e raios frequentes. Elas respondem pela maior parte dos eventos de tempo severo mais graves observados no mundo.

O que é um tornado

Os tornados são fenômenos meteorológicos extremos e destrutivos caracterizados por colunas de ar em rotação intensa que se estendem da base de uma tempestade para a superfície da Terra.

Esses redemoinhos violentos são conhecidos por sua capacidade devastadora, capaz de causar grande destruição em segundos a minutos. A escala Fujita, frequentemente usada para classificar a intensidade de tornados, varia de F0 a F5, sendo F5 o mais poderoso.

Os tornados geralmente se formam em áreas onde massas de ar quente e úmido encontram massas de ar frio e seco, criando condições ideais para o desenvolvimento desses vórtices.

Tornados ocorrem em muitas partes do mundo, incluindo Austrália, Europa, África, Ásia e América do Sul. Até a Nova Zelândia relata cerca de 20 tornados por ano. Duas das maiores concentrações de tornados fora dos Estados Unidos são nas latitudes médias da América do Sul e em Bangladesh.

Cerca de 1.200 tornados atingem os Estados Unidos anualmente. Como os registros oficiais de tornados datam apenas de 1950, não se sabe o número médio real de tornados que ocorrem a cada ano. Além disso, os métodos de detecção e relato de tornados mudaram muito nas últimas décadas, o que significa que a estatística hoje considera tornados que no passado não entrariam na contabilidade. O Brasil não possui um banco de dados robusto sobre estas ocorrências no país ao longo da história e projetos de verificação e contabilidade de eventos são incipientes.

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