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* por BURCIN GERCEK – AFP em GAZIANTEP/TURQUIA 

É terça-feira à tarde e as escavadeiras e os cães farejadores finalmente começaram a trabalhar em meio às ruínas de um prédio em Gaziantep, no Sudeste da Turquia. “É tarde demais. Agora esperamos por nossos mortos”, diz uma mulher, suspirando, à espera de notícias de sua tia.

Gaziantep, conhecida por seus fabulosos mosaicos, foi atingida por um forte terremoto que abalou a Turquia e a Síria na última segunda-feira e já deixa mais de 11.200 mortos entre os dois países.

Ebru Firat, de 23 anos, sabe que há cada vez menos chances de encontrar sua prima com vida, que desapareceu sob os escombros de sua casa em Sehitkamil, subúrbio de Gaziantep. Como acontece com as centenas de pessoas que esperam em frente às ruínas, a dor às vezes se mistura à raiva.

“Já se passaram 36 horas desde o terremoto… tudo acontece tão devagar”, lamenta a jovem. “Eu quero ter esperança, mas…”. Cada minuto conta quando se trata de encontrar os sobreviventes, mas nas horas após a tragédia, nenhuma equipe de resgate apareceu por lá.

Os familiares dos desaparecidos, às vezes acompanhados por policiais, foram os primeiros a vasculhar os escombros com as próprias mãos. Os primeiros socorristas chegaram na área na noite de segunda-feira, mas à meia-noite pararam de trabalhar, explicam os familiares indignados. “As pessoas estavam indignadas esta manhã.

A polícia chegou e nos obrigou a ficarmos quietos”, conta Celal Deniz, de 61 anos. Seu irmão e seus sobrinhos estão sob os escombros. No frio congelante, Deniz e seus parentes tentam se aquecer em volta de uma fogueira, um pouco afastados.

“Não há nenhuma região em que os serviços de resgate não tenham conseguido chegar”, garantiu na segunda-feira o presidente do Crescente Vermelho, Kerem Kinik, na televisão.

Um homem caminha enquanto equipes de resgate e civis procuram sobreviventes sob os escombros de prédios desabados. Algumas das devastações mais pesadas ocorreram perto do epicentro do terremoto, entre Kahramanmaras e Gaziantep, uma cidade de dois milhões de habitantes onde quarteirões inteiros agora estão em ruínas sob a neve que se acumula. | ADEM ALTAN/AFP/METSUL METEOROLOGIA

Parentes lamentam as vítimas enquanto aguardam caixões em Gaziantep, dois dias depois que um forte terremoto atingiu a região | ZEIN Al RIFAI/AFP/METSUL METEOROLOGIA

“Mentira!”, grita um jovem, que pediu para não ser identificado. “Estamos abandonados”. Uma negligência que levanta questões para as quais, neste momento, não há resposta. “Eles não sabem o que o povo está vivendo. Onde estão nossos impostos arrecadados desde o terremoto de 1999?”, diz Celal Deniz, lembrando o terremoto daquele ano, que devastou áreas densamente povoadas e industrializadas do noroeste do país.

Depois do terremoto de 1999, que causou pelo menos 17.400 mortos, foi instituído um imposto especial chamado “taxa terremoto”. O dinheiro arrecadado desde 1999 – calculado em 88 bilhões de liras turcas, ou cerca de 4,6 bilhões de dólares – deveria ser investido na prevenção de catástrofes e no desenvolvimento de serviços de resgate. Mas ninguém sabe para onde foi esse dinheiro.

“Fomos ajudar lugares que, a princípio, deveriam ser assistidos pelo Crescente Vermelho, mas ninguém apareceu”, explica Ceren Soylu, membro de um grupo de voluntários criado por um pequeno partido nacionalista, o Bom Partido (Iyi ).

A cidade continua abalada por violentos tremores secundários e falta tudo aos habitantes: as lojas estão fechadas, o gás cortado – e, com ele, a calefação – e é raro encontrar gasolina. Apenas algumas padarias permanecem abertas, diante das quais se formam longas filas.

Os mais afetados são os distritos mais isolados da província, como Islahiye e Nurdagi, onde centenas de prédios e casas desabaram. “As estradas foram parcialmente destruídas, é muito difícil fornecer ajuda a essas cidades”, explica Gokhan Gungor, um cozinheiro que se ofereceu para distribuir alimentos às vítimas.

“As pessoas estão sem água e sem comida lá”, diz ele. Em Sehitkamil, em frente a um prédio reduzido a escombros, a sensação de abandono abala os sobreviventes ainda mais do que o frio. Muitos deles correram para a rua sem sequer calçar os sapatos quando foram acordados pelos tremores no meio da noite.