Em meio a desastres naturais, quando as comunicações modernas entram em colapso e as comunidades ficam isoladas, o rádio volta a ser uma ferramenta essencial para salvar vidas. Em situações em que a energia elétrica e a internet falham, as emissoras locais costumam ser o único elo de informação entre a população e as autoridades. A história mostra inúmeros exemplos de como a força da radiodifusão pode fazer a diferença em momentos de crise.
Rádio Universitária San Bartolo, parte da Universidade Autônoma do Estado de Hidalgo, transmite mensagens e informações aos moradores afetados pelas chuvas recentes em comunidades próximas a San Bartolo Tutotepec, estado de Hidalgo, México, no desastre das enchentes agora da segunda semana de outubro | ALFREDO ESTRELLA/AFP/METSUL
Durante o furacão Katrina, que devastou Nova Orleans em 2005, estações como a WWL Radio permaneceram no ar mesmo com a cidade submersa. Usando geradores a diesel, jornalistas transmitiam orientações sobre abrigos, rotas seguras e pedidos de resgate. Enquanto as redes de telefonia e a internet estavam fora do ar, a WWL se transformou em um canal de sobrevivência. Muitos moradores relataram depois que só conseguiram encontrar ajuda graças às informações ouvidas pelo rádio portátil.
Algo semelhante ocorreu no Japão após o terremoto e o tsunami de 2011. Quando as ondas gigantes destruíram infraestruturas e deixaram milhões sem energia, emissoras comunitárias como a FM Ringo, na província de Iwate, retomaram transmissões em poucas horas.
Usando equipamentos simples e o apoio de voluntários, elas transmitiam mensagens de familiares desaparecidos e avisos sobre a distribuição de alimentos e água. A ação foi tão eficaz que o governo japonês criou um programa nacional de fortalecimento de rádios comunitárias em áreas propensas a desastres.
Na América Latina, o rádio também tem sido um instrumento vital. No Chile, após o terremoto de 2010, várias estações regionais foram as únicas fontes de informação durante dias, enquanto as comunicações estavam interrompidas. No México, emissoras locais como a SUMA Radio, em Hidalgo, têm desempenhado esse papel recentemente, transmitindo atualizações e orientações às comunidades isoladas por inundações e deslizamentos.
Mais recentemente, nos desastres das enchentes do Rio Grande do Sul em 2023 e 2024, o rádio local foi o principal canal de informação para a população atingida em Porto Alegre e no interior gaúcho com coberturas que duraram 24 horas por dias seguidos, com orientações, as palavras das autoridades e a reportagem nas áreas inundadas.
No Vale do Taquari, em especial, o rádio ganhou um enorme protagonismo durante as inundações catastróficas que destruíram a região no segundo semestre de 2023 e em maio de 2024. Emissoras como a Rádio Independente e A Hora, de Lajeado, foram usadas para pedidos de resgates por pessoas nos telhados de suas casas e informaram a todo o momento com medições manuais o nível do rio, quando as réguas de medição foram destruídas pela violência da correnteza.
O poder do rádio nas horas críticas
O poder do rádio reside na sua simplicidade e alcance. Ele não depende de conexões digitais, funciona com pilhas e pode chegar a locais onde nenhum outro meio alcança. Além de informar, ele dá voz às comunidades afetadas, oferece conforto psicológico e organiza redes de solidariedade.
Em tempos de desastres, o som de uma voz familiar no rádio pode significar esperança, orientação e até a diferença entre a vida e a morte. Por isso, mesmo na era da conectividade global, o rádio segue sendo um herói silencioso em meio ao caos.
Em contextos de desastre, quando as redes digitais e a infraestrutura elétrica entram em colapso, o rádio permanece como o meio de comunicação mais resiliente e acessível. Pesquisas em comunicação de risco destacam que a simplicidade tecnológica e a ampla cobertura do rádio o tornam uma ferramenta fundamental em momentos de emergência (Fraser & Restrepo-Estrada, 2008).
Estudos demonstram que, mesmo em condições precárias, emissoras locais conseguem manter transmissões de alerta, instruções de segurança e apoio psicológico a comunidades isoladas (Torani et al., International Journal of Environmental Research and Public Health, 2019). O rádio, segundo esses autores, atua como uma ponte vital entre a população afetada e as autoridades, contribuindo diretamente para salvar vidas.
O jornalismo radiofônico em crises não se limita à transmissão de alertas, mas também à reconstrução do tecido social e emocional das comunidades. Durante o tufão Haiyan, nas Filipinas, o projeto First Response Radio foi estudado por Watson et al. (Prehospital and Disaster Medicine, 2016), que destacaram como a rádio local ofereceu tanto informações práticas — como localização de abrigos e disponibilidade de água — quanto mensagens de esperança e solidariedade.
Essa combinação de função informativa e emocional é apontada por Palttala et al. (BMC Public Health, 2007) como essencial para fortalecer a resiliência social em situações de crise. Assim, o rádio não apenas comunica, mas também acolhe e reconstrói a confiança da população no meio do caos.
Para que esse papel seja plenamente exercido, é necessário preparo técnico e coordenação institucional. Pesquisas sobre comunicação de risco recomendam que as emissoras desenvolvam planos de contingência, mantenham geradores, treinem jornalistas para lidar com situações de emergência e estabeleçam canais diretos com defesas civis e órgãos de gestão de risco (Rodríguez, García & Schramm, Journal of Emergency Management, 2009).
Quando estruturado e integrado aos sistemas oficiais, o rádio se transforma em uma ferramenta estratégica de gestão de desastres — não apenas um canal alternativo, mas um componente indispensável da resposta humanitária e da reconstrução pós-evento.
A força do meio rádio agora no desastre do México
Após a devastação causada pelas chuvas intensas no México nos últimos dias, uma rádio local tenta aliviar a incerteza dos moradores na afetada serra do estado de Hidalgo, na região central do país.
Pelo menos 64 pessoas morreram e milhares ficaram desabrigadas devido ao transbordamento de rios e às inundações provocadas pelas chuvas no leste e no centro do México.
“Ainda que tudo esteja devastado (…), estamos trabalhando”, disse René Martínez, diretor da SUMA Rádio UAEH San Bartolo, emissora da Universidade Autônoma do Estado de Hidalgo em San Bartolo Tutotepec, cujos acessos por estrada continuavam bloqueados nesta segunda-feira por causa dos deslizamentos.
De seu estúdio, em um prédio no centro da cidade, a equipe sob seu comando responde às perguntas de moradores que querem saber se as estradas que levam a suas comunidades estão abertas ou quando a energia elétrica será restabelecida.
O diretor afirmou que, nos primeiros dias após as chuvas, sua equipe transmitiu usando um gerador a diesel, devido ao apagão. “Fomos o único meio de comunicação transmitindo a partir deste local”, destacou. “O rádio está vivo”.
Alguns repórteres da emissora também sofreram os efeitos das chuvas e ficaram isolados, sem poder voltar para casa por causa dos deslizamentos. Para eles, a rádio se transformou em “um refúgio”, descreve Martínez.
Duas pessoas morreram nessa localidade de 17.699 habitantes, informou à agência AFP o prefeito de San Bartolo, Ubaldo González, nesta segunda-feira. Além disso, os alimentos começam a escassear e o fornecimento de gás liquefeito de petróleo (GLP) teve de ser racionado, acrescentou o funcionário.
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