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O mundo inteiro se assombrou  quando no mês passado a temperatura no Círculo Polar Ártico atingiu um recorde de 38°C. O fato por si já era espantoso, mas foi apenas parte de um evento de calor surpreendente, prolongado e generalizado em todo o Ártico da Sibéria.

O calor extremo e incomum nessa região alarmou os cientistas em todo o mundo, levando um grupo de 14 cientistas de seis países a colaborar em um estudo para descobrir como algo poderia ocorrer fora dos limites. Ontem (15), os pesquisadores divulgaram suas descobertas em um estudo abrangente sobre atribuição climática: “Esse evento prolongado em larga escala teria sido essencialmente impossível sem as mudanças climáticas”.

Em contexto, a equipe internacional de pesquisadores descobriu que, se, hipoteticamente, você morasse nesta região antes de 1900, quando as mudanças climáticas causadas por humanos começaram a surgir, um evento de calor tão extenso, prolongado e intenso ocorreria apenas uma vez a cada 80.000 anos ou aproximadamente uma vez a cada 1.000 vidas.


O estudo determinou que a probabilidade de ocorrer um evento de calor regional desta magnitude hoje, em comparação com 1900, é 600 vezes maior. E mesmo no clima mais quente de hoje, seria esperado apenas uma vez a cada 130 anos.

“As descobertas dessa pesquisa rápida que as mudanças climáticas aumentaram as chances de aquecimento prolongado na Sibéria em pelo menos 600 vezes são realmente impressionantes”, disse Andrew Ciavarella, principal autor da pesquisa e cientista sênior de detecção e atribuição no Reino Unido.

O estudo examinou o papel da mudança climática induzida pelo homem na probabilidade e intensidade de dois eventos específicos: o calor persistente na região da Sibéria de janeiro a junho e a temperatura recorde de 38°C em Verkhoyansk, na Sibéria, em 20 de junho.

Nos primeiros seis meses deste ano, as temperaturas na maior parte da Sibéria – que possui uma área maior que o Brasil – ficaram em média ao redor de 5°C acima do normal. A imagem abaixo mostra a área de estudo (destacada na caixa retangular) e as temperaturas acima da média no sombreamento vermelho alaranjado, usando graus Celsius.

Para ilustrar a persistência incomum da temperatura muito acima do normal , o especialista em clima do Ártico Zack Labe produziu um gráfico com os desvios das temperaturas médias da Sibéria para cada mês, de janeiro a junho, deste ano. O tom mais escuro de vermelho indica temperaturas de 7°C a 8°C acima do normal.

Para investigar as anormalidades climáticas, a equipe de pesquisa examinou os registros observacionais de temperatura da superfície e recriou o clima usando dezenas de modelos de computadores climáticos. Para medir o efeito da mudança climática, os cientistas realizaram simulações em computador para comparar o clima atual com o clima atual de 1900, quando havia muito menos gases do efeito estufa e poluição.

Quanto à probabilidade de ocorrência do recorde de 38°C na cidade de Verkhoyansk, em junho, o estudo constatou que se tratava de um evento de 1 em 140 anos em nosso clima quente atual e milhares de vezes menos provável no início da Revolução Industrial.

Quanto à probabilidade de ocorrência de um evento de calor regional da magnitude deste ano, o estudo constatou que é um evento de 1 em 130 anos no clima quente de hoje com 600 vezes mais chances do que teria sido em 1900.

O estudo também descobriu que, de 1900 a 2020, o impacto humano no clima tornou o evento de temperatura alta regional aproximadamente 2°C mais quente. E estima que, no futuro, se uma onda de temperatura elevada semelhante ocorrer daqui a três décadas, em 2050, a intensidade poderá estar em torno de 5°C mais quente em comparação a 1900.

“Esses resultados mostram que estamos começando a experimentar eventos extremos que quase não teriam chance de acontecer sem a influência humana no sistema climático”, explicou a professora Sonia Seneviratne, da ETH Zurich. “Temos pouco tempo para estabilizar o aquecimento global em níveis em que as mudanças climáticas permaneceriam dentro dos limites do Acordo de Paris”.

 Os resultados do estudo foram tão dramáticos que até um dos autores de atribuição climática mais experientes, Friederike Otto, vice-diretor do Instituto de Mudanças Ambientais da Universidade de Oxford, ficou surpreso.

“É de longe a mudança mais forte em um evento individual que eu já vi em comparação com tudo o que estudei até agora”, disse ela.

Como resultado do notável calor e secura, 13.000 quilômetros quadrados da Sibéria já arderam em incêndios. Somente em junho, tais incêndios lançaram 56 megatons de dióxido de carbono na atmosfera, mais do que as emissões anuais da Suíça. Isso leva a um perigoso ciclo do chamado feedback em que o carbono extra na atmosfera aquece ainda mais o planeta, favorecendo ainda mais incêndios.

O aquecimento também está causando outro ciclo de feedback no Ártico, derretendo o gelo do mar a uma taxa espantosa. No momento, a extensão do gelo marítimo adjacente à Sibéria no Mar de Laptev não está apenas em declínio recorde, mas simplesmente despencou.

O desaparecimento do gelo marítimo resulta em menos luz solar sendo refletida do gelo de cor clara de volta ao espaço. Com isso, mais calor é absorvido pelas superfícies mais escuras e expostas da Terra. Como resultado, o Ártico está aquecendo três vezes mais rápido que a média global. Esse fenômeno é chamado de amplificação do Ártico. (Com informações de Jeff Berardeli/CBS News)

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