Uma poderosa e atipicamente extensa massa de ar polar avança pela Argentina e começa nesta quarta-feira (19) a ingressar no território brasileiro a partir do Rio Grande do Sul. Esta incursão de ar polar, a mais forte de 2020 e uma das mais intensas dos últimos anos, será responsável por trazer resfriamento em extensa área do território nacional, especialmente no Sul, no Centro-Oeste, em parte do Sudeste e até em áreas do Norte do país em latitudes muito baixas.

Hoje, o ar frio vai afetar mais o Rio Grande do Sul, mas entre esta quinta (20) e a sexta-feira (21) avançará muito rapidamente pelo interior do continente até chegar ao Norte do país.

9h de hoje

9h de amanhã

9h de sexta

9h de sábado

A queda da temperatura entre amanhã e sexta será muito acentuada, sobretudo em regiões do Centro-Oeste, do Norte e do Sudeste do Brasil que experimentam hoje intenso calor, em alguns pontos acima dos 40ºC, como é o estado do Mato Grosso. Cuiabá sairá de 40ºC a 42ºC hoje para 9ºC a 11ºC de mínimas entre sexta e sábado. Uberlândia, no Triângulo Mineira, que hoje vai ter de 32ºC a 34ºC no fim de semana observará mínimas de 10ºC a 12ºC. A cidade de São Paulo que nesta quarta-feira pode ficar perto dos 30ºC terá mínimas entre 9ºC e 12ºC na maioria dos bairros na madrugada de sábado.

O período mais frio e as mínimas

Rio Grande do Sul, Santa Catarina, o Paraná e o Sul do Mato Grosso do Sul devem experimentar o frio mais intenso desta onda polar. O período mais gelado compreenderá esta quinta, a sexta e o começo do sábado, antes de a temperatura começar uma trajetória de elevação. A MetSul projeta mínimas perto de 0ºC ou negativas na sexta e no sábado em grande parte do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, além de algumas áreas do Paraná, especialmente mais ao Oeste pelo tempo mais aberto.

Projeção de temperatura para o amanhecer de sexta do modelo canadense

Projeção de temperatura para o amanhecer de sábado do modelo canadense

Nas localidades de maior altitude do Rio Grande do Sul, nos Aparados da Serra, entre sexta e o sábado podem ser esperadas marcas mínimas tão baixas quanto -4ºC a -6ºC na região de São José dos Ausentes. Na Serra do Sudeste, marcas semelhantes podem ser observadas.

Por sua vez, a fronteira com o Uruguai pode ter mínimas de -1ºC a -3ºC na maioria dos municípios e talvez até de -3ºC a -5ºC em alguns pontos, como em baixadas de Livramento e Quaraí. Na cidade de Porto Alegre, mínimas de 2ºC a 4ºC nos bairros mais frios sexta e sábado, mas as mínimas vão ficar ao redor de 0ºC em parte da região metropolitana.

No estado de Santa Catarina, mínimas negativas entre sexta e sábado em grande número de municípios com prováveis registros de -5ºC a -7ºC em pontos do Planalto Sul Catarinense.

Tardes muito frias e máximas atipicamente baixas

A MetSul enfatiza que pela grande intensidade do ar polar não apenas as noites serão geladas. Vai fazer muito frio o dia todo e mesmo durante a tarde, mesmo nas localidades com sol, espera-se temperatura baixa sexta e sábado. Nos Aparados da Serra, em Santa Catarina e no Paraná, que terão nebulosidade e instabilidade, as máximas serão baixíssimas, principalmente na sexta. É possível que em pontos do Planalto Sul Catarinense sejam registradas máximas pouco acima de 0ºC e até negativas em algumas estações meteorológicas de maior altitude.

Em Porto Alegre e região, as máximas na quinta e na sexta serão baixas com 11ºC a 13ºC na quinta e 12ºC a 14ºC na sexta, conforme os bairros. Em Curitiba, o frio será enorme na sexta-feira e ainda com precipitação. A temperatura à tarde, segundo os mais variados dados, poderá ficar abaixo de 5ºC em diferentes pontos da capital paranaense na sexta e com precipitação.

Projeção de temperatura para a tarde de sexta do modelo canadense

Na cidade de São Paulo, as tardes de sexta e sábado serão as mais frias com máximas, no geral, entre 11ºC e 13ºC com chance até de marcas inferiores em pontos mais altos da região. No Sul do estado de São Paulo, o frio será muito atípico na tarde da sexta com marcas tão baixas como 6ºC a 8ºC, muito incomuns para a região no período da tarde.

Neve

A previsão de neve é difícil e desafiadora para a Meteorologia em todo o mundo, não raro com uma enorme complexidade, e é o caso neste episódio de frio. A possibilidade de nevar nesta onda de frio é consideravelmente alta nos estados do Sul do Brasil, mas a situação sinótica que deverá levar à ocorrência do fenômeno não segue os cenários típicos que trazem neve para o Sul do país como circulação de ciclone no oceano com ar polar continental, ou neve na retaguarda de uma frente fria ou neve na parte Sul de um sistema semi-estacionário.

Desta vez, uma área de baixa pressão segregada atuará em combinação com o ar polar sobre o Sul do Brasil, especialmente sobre o Norte do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e parte do Paraná. Modelos numéricos de computador, por suas equações, parametrizações, costumam ter dificuldade em prever neve com maior precisão neste tipo de cenário não apenas aqui como em outras partes do mundo, o que explica grandes oscilações nas projeções desde o começo desta semana e enormes diferenças de indicativos entre os variados modelos analisados.

Em 2013, nas duas grandes nevadas daquele ano, de julho e agosto, as projeções dos modelos se alteraram até poucas horas antes de começar a nevar e em algumas regiões nevou mais que projetavam e em outras menos, como é comum em projeções numéricas de precipitação.

Os mapas modelos numéricos começaram a semana indicando um evento de neve mais abrangente para depois gradualmente irem reduzindo a extensão da área. As diferenças de prognóstico entre os diversos modelos, entretanto, prossegue, como se vê nos mapas abaixo dos modelos GFS/NOAA dos Estados Unidos, Icon do Serviço Meteorológico alemão, canadense e o WRF que é rodado pela MetSul.

Projeção de neve do modelo americano GFS da rodada da 0Z de hoje

Projeção de neve do modelo alemão Icon da rodada da 0Z de hoje

Projeção de neve do modelo canadense da rodada da 0Z de hoje

Projeção de neve do modelo WRF da rodada da 0Z de hoje

Veja,na sequência, a projeção de precipitação no Sul do Brasil entre quinta-feira e o sábado conforme o tipo de precipitação (chuva em verde e neve em azul) a partir de dados do GFS, o modelo operacional do serviço meteorológico norte-americano. 

As condições se tornam favoráveis para neve nesta quinta-feira, não se descartando que possa nevar em alguns pontos de maior altitude já entre a madrugada e de manhã, mas, especialmente, da tarde para a noite o cenário se torna mais propício ao fenômeno. As condições favoráveis seguiriam na sexta-feira e ainda no começo do sábado.

Na análise da MetSul, as regiões com maior probabilidade de nevar são os Campos de Cima da Serra do Rio Grande do Sul, em particular a região de São José dos Ausentes, os Planaltos Sul e Norte de Santa Catarina, o Meio-Oeste Catarinense e as áreas de maior altitude do Sul do estado do Paraná na região de Palmas a Guarapuava. Modelos, como o americano e o europeu, sugerem a possibilidade de acumulação.

Não se pode afastar que a neve alcance pontos da Serra Gaúcha e das elevações próximas ou até da Grande Florianópolis. Os modelos numéricos não indicam, mas existe uma possibilidade pequena do fenômeno ocorrer em locais do Norte e do Noroeste gaúcho, do Oeste catarinense, do Sudoeste paranaense e em áreas de maior altitude do Leste do Paraná.

Áreas de baixa pressão, como a que vai interagir com o ar polar para favorecer a neve, estimulam na atmosfera movimentos convectivos (ascendentes do ar) com instabilidade. Por isso, mesmo em ar muito gelado a ocorrência de convecção pode excepcionalmente trazer até trovoadas com neve, como se vê às vezes nos Estados Unidos. Uma vez que haverá uma área de baixa pressão exatamente sobre o Sul do Brasil, existe a possibilidade de convecção que possa gerar nuvens de maior desenvolvimento capazes de gerar pancadas de neve, assim como se dá com chuva em convecção com ar quente. E, ocorrendo estas pancadas, alguns pontos podem ter maior acúmulo de neve.

Esta baixa pressão fará infiltrar ar seco em quase todo o Rio Grande do Sul, o Norte argentino, o Paraguai, Sul do Mato Grosso do Sul e o Oeste de Santa Catarina e do Paraná na sexta-feira, mas em áreas do Leste catarinense e paranaense haverá umidade e com a isoterma de 0ºC em 700 hPa (nível aproximado de 3.000 metros) chegando até o Sul de São Paulo, Por isso, na sexta e no começo do sábado, pela presença do eixo da área de baixa pressão remanesce a chance de ocorrência de neve no Extremo Nordeste gaúcho, o Leste de Santa Catarina e o Leste do Paraná.

Cada evento de frio intenso e/ou neve tem sua própria história e marcas, jamais sendo iguais. Entre os exemplos da história recente, o que os modelos esboçam hoje de cenário guarda maior semelhança pelo aspecto geográfico e sinótico é com o evento de julho de 2013, o que enfatiza-se não significa que será uma repetição do ocorrido sete anos atrás. 

Precipitação invernal

A área de baixa pressão trará instabilidade com ar muito gelado, o que pode gerar outros tipos de fenômenos de precipitação invernal. Um deles é a chamada chuva congelada que pode ocorrer em um maior número de locais na quinta, mesmo em pontos fora da região indicada como a de possibilidade de neve, havendo a presença de nuvens de maior desenvolvimento vertical. E, neste caso, o fenômeno pode se dar com temperatura mais alta e em locais de menor altitude.

Um risco nas áreas de maior altitude do Sul do Brasil é que durante parte deste evento de frio se produza o que se chama de chuva congelante. Não se trata de uma precipitação sólida, e sim líquida como a chuva normal. Ela se precipita líquida e se congelada ao atingir superfícies que estão muito resfriadas. Como a temperatura atingirá valores negativos nos locais mais altos, existe o risco mesmo que pequeno deste tipo de fenômeno.

Geada

Espera-se geada entre esta quinta e o domingo em diversas áreas do Sul do Brasil. Nesta quinta, como grande parte da parte meridional do país terá nuvens e instabilidade, a chance de gear será maior no Oeste e no Sul do Rio Grande do Sul.

Na sexta, a geada já se fará presente em grande parte do Rio Grande do Sul e do Oeste de Santa Catarina e do Paraná na madrugada e ao amanhecer. Em alguns pontos, o frio muito intenso com vento pode trazer geada negra no começo da sexta. Em um grande número de locais do Sul do Brasil a geada vai começar novamente a se formar muito cedo, ainda no começo da noite, na sexta-feira, antecedendo um sábado que começará gélido e com muita geada.

Projeção de geada para sábado do modelo canadense

O sábado será o dia com geada mais ampla no Sul do Brasil. Afetará grande parte da região e só em pontos com mais nuvens e instabilidade entre parte do Nordeste gaúcho, o Leste de Santa Catarina e do Paraná pode não gear, mas mesmo com nuvens devido ao frio intenso ainda pode ter o fenômeno em algumas localidades destas regiões. A massa de ar frio rapidamente começará a enfraquecer no fim de semana, elevando-se a temperatura. No domingo, porém, ainda se espera muito frio ao amanhecer com máximas agradáveis e em diversos locais acima dos 20ºC à tarde.

Vento 

Como a massa de ar será por demais gelada, é comum que chegue com vento moderado a forte que vai trazer sensação térmica com valores muito baixos, negativos em muitas localidades. No caso do Centro-Oeste, como muitas áreas não registram chuva por meses, o vento pode gerar tempestades de areia em pontos da região.